Perto de completar um mês desde o assassinato de Antônio Vinícius Lopes Gritzbach, delator da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), a força-tarefa de segurança pública criada pelo governo paulista ainda não prendeu os executores do crime. O crime do PCC, ocorrido no Aeroporto Internacional de Guarulhos no dia 8 de novembro, se soma à lista de ações audaciosas da facção frente à sociedade e às autoridades brasileiras.
A mobilização provocada nas polícia Civil e Militar de São Paulo após o crime está longe de cair no esquecimento, como as repercussões do homicídio evidenciam: mais de 10 agentes foram afastados de suas funções e uma recompensa de R$ 50 mil foi oferecida para quem informar o paradeiro do suspeito. Até o momento, ninguém foi preso.
O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) afirma que Gritzbach foi vítima de “queima de arquivo” pela facção criminosa - em março, ele havia firmado um acordo de delação premiada para relacionar os principais líderes do PCC com estratégias para lavagem de dinheiro da facção. Mais de 20 dias após o homicídio, a investigação avançou com a identificação de dois suspeitos, incluindo o olheiro que teria apontado o delator aos suspeitos de cometerem o crime, de acordo com informações divulgadas pela Secretaria da Segurança Pública de São Paulo.
A participação de policiais no caso não está descartada, mas não há indícios claros de autoria direta no homicídio.
Secretário estadual da Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite
Um dos suspeitos é Kauê do Amaral Coelho, de 29 anos. Investigações do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) indicam que ele teve participação central no crime, com base na análise de câmeras de segurança do terminal 2 do aeroporto. Diante das dificuldades para localizá-lo, o governo de São Paulo oferece R$ 50 mil por informações sobre o paradeiro dele.
Conforme apuração da Gazeta do Povo, Coelho possui vínculos com lideranças do PCC em outros estados, e a fuga dele para fora de São Paulo é uma possibilidade. Ele está com prisão temporária decretada e tem histórico criminal: em 2022, ele foi preso por tráfico de drogas e, segundo a Secretaria da Segurança Pública paulista, envolveu-se em uma briga de trânsito com um policial, ocasião em que se identificou como membro do PCC.
“Há evidências de que se trata de um integrante do PCC, conforme ele mesmo declarou. A participação de policiais no caso não está descartada, mas não há indícios claros de autoria direta no homicídio. As corregedorias das polícias Militar e Civil estão investigando, com quebra de sigilo telefônico dos policiais envolvidos na escolta”, afirmou Guilherme Derrite, secretário estadual da Segurança Pública, no último dia 19.
Denúncias podem ser feitas de forma anônima pelo telefone 181 ou pelo sistema WebDenúncia. O denunciante recebe um protocolo para acompanhar o andamento do caso, com garantia de confidencialidade.
Ex-integrante da Rota integrava segurança de delator do PCC
Entre os policiais responsáveis pela segurança do empresário Antônio Vinicius Lopes Gritzbach estava o soldado Alef de Oliveira Moura, de 29 anos, ex-integrante das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), considerado batalhão de elite da Polícia Militar paulista. Moura não faz mais parte do efetivo da Rota - ele integra um batalhão de área.
No último dia 22, uma força-tarefa, em conjunto com a Corregedoria da PM cumpriu nove mandados de busca e apreensão, incluindo um na casa do ex-integrante da Rota, na capital paulista. Durante a operação, foram apreendidos celulares e computadores.
Segundo apuração da Gazeta do Povo, antes do assassinato de Gritzbach, Moura já respondia a um inquérito policial militar (IPM) na Corregedoria da instituição, por supostamente integrar a escolta de um suspeito de ligação com o PCC. As polícias Civil e Militar fizeram a operação para cumprir os mandados de busca e apreensão relacionados à morte de Gritzbach. A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo destacou a necessidade de manter sigilo sobre as investigações para garantir autonomia de ação.
Responsável pela morte de delator do PCC é o principal alvo da polícia paulista
Após identificar o olheiro no aeroporto, a força-tarefa da Secretaria da Segurança Pública apontou Matheus Augusto de Castro Mota como um dos executores de Gritzbach. Até o momento, Mota segue foragido.
De acordo com os investigadores, Mota teria pago R$ 5 mil a Kauê do Amaral Coelho e o instruiu a atuar como olheiro no aeroporto, aguardando o desembarque de Gritzbach. Ambos estão foragidos e tiveram a prisão temporária decretada pela Justiça. A força-tarefa conta com mais de 100 agentes de segurança, incluindo policiais civis, militares, federais e integrantes do Ministério Público mobilizados para solucionar o caso.
Suspeita de corrupção e fuga de ônibus abalam polícia de São Paulo
Os envolvidos da morte do delator do PCC, no aeroporto de Guarulhos, fugiram de ônibus para evitar serem identificados por policiais militares que patrulhavam a região do crime. Dois suspeitos, um deles ainda não identificado, saíram do local do crime em um carro preto dirigido por uma terceira pessoa, que também não foi localizada.
O trio abandonou o veículo a cerca de três quilômetros do aeroporto. O armamento usado no crime foi enterrado próximo ao carro. A polícia localizou o veículo e o fuzil utilizado pelos suspeitos.
De acordo com os investigadores, um dos suspeitos seguiu em outro carro, enquanto os outros dois embarcaram em um ônibus, pagaram a passagem e se dirigiram ao fundo do veículo, sem as máscaras utilizadas no crime. Apesar das imagens captadas no aeroporto e no ônibus, dois dos três suspeitos ainda não foram identificados pela força-tarefa.
Oito dias antes de ser assassinado, Gritzbach havia denunciado policiais civis por corrupção. A delação ocorreu em 31 de outubro, na sede da Corregedoria da Polícia Civil. O inquérito foi aberto há mais de um mês e está sob sigilo, conduzido pela Corregedoria da Polícia Civil.
Conforme apuração da Gazeta do Povo, os policiais acusados por Gritzbach de extorsão e furto incluem membros do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e do Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), dois dos principais órgãos da Polícia Civil. “Esses trechos da delação foram enviados para a Corregedoria, e o primeiro a ser ouvido foi o próprio Vinícius. Achei essa atitude extremamente correta, considerando que ele estava delatando membros de organizações criminosas acusados até de duplo homicídio contra integrantes do PCC. Poderia acontecer algo com ele, como infelizmente aconteceu”, afirmou Derrite.
Delação de Gritzbach auxilia em operação da PF contra lavagem de dinheiro
Informações repassadas por Gritzbach contribuíram para a deflagração de uma operação policial no último dia 26. A Polícia Federal (PF) mirou em um grupo suspeito de crimes financeiros que teria movimentado R$ 6 bilhões. A ação foi realizada em seis estados e no Distrito Federal. De acordo com as investigações, a organização criminosa operava um esquema de lavagem de dinheiro e evasão de divisas por meio de um sistema bancário paralelo e uso de criptomoedas.
Segundo a PF, o grupo mantinha um fluxo constante de recursos destinados à China e também oferecia serviços de lavagem de dinheiro, envio ou recebimento de valores do exterior. Entre os “clientes” identificados estão organizações criminosas ligadas ao tráfico de drogas de e armas, além de contrabandistas. Uma das empresas investigadas, 2 Go Bank, foi citada por Gritzbach.
A colaboração de Gritzbach foi considerada peça-chave para localizar suspeitos e rastrear o dinheiro envolvido no esquema, segundo apuração da Gazeta do Povo. O delator mencionou vários nomes para as autoridades, entre eles o de Cyllas Elia, policial civil do Deic, e o capitão da PM Diogo Costa Cangerana. Ambos são investigados por organização criminosa voltada à prática de crimes contra o sistema financeiro, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.
Cangerana trabalhou no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, lotado na Casa Civil e responsável pela segurança do governador, Tarcísio de Freitas (Republicanos). O policial que já foi condecorado por “serviços prestados ao estado” deixou o posto na sede do governo estadual em setembro, quando foi transferido para o 13º Batalhão da PM, na região do centro da cidade de São Paulo responsável pelo policiamento da cracolândia.
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