As sucessivas quedas no fornecimento de energia elétrica em São Paulo, com consumidores desabastecidos por quase uma semana no fim de 2023, não causaram um impacto significativo nos índices de desempenho da Enel junto à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Segundo os dados da agência, a operadora, que ficou na 19ª posição nas 29 avaliações realizadas em 2021 e 2022, perdeu duas posições no ranking mais recente, do ano passado.
A classificação das distribuidoras leva em conta os períodos em que os consumidores ficaram sem energia elétrica durante o ano e as metas de interrupções de fornecimento toleradas pela Aneel. “O ranking é um instrumento que incentiva as concessionárias a buscarem a melhoria contínua da qualidade do serviço”, informa a agência.
Nos cálculos da Aneel, dois fatores são levados em conta para se chegar ao Desempenho Global de Continuidade (DGC). O primeiro diz respeito a quantas vezes uma unidade consumidora ficou sem energia elétrica durante o período analisado, chamado pela Aneel de FEC. O segundo mede o tempo médio em que essa unidade consumidora ficou desabastecida, DEC.
A meta global de DEC para a Enel São Paulo em 2023, definida pela Aneel, foi de 7 horas e seis minutos. Entretanto, a agência identificou que, na média, cada unidade consumidora conectada à rede da empresa ficou pouco mais de 6 horas e 46 minutos sem energia elétrica durante o ano. Ao cumprir a meta da Aneel, a Enel ficou em 7º lugar neste quesito – mesmo posto ocupado nos anos de 2022 e 2021.
Em relação à quantidade média de blecautes por ano, a Enel em São Paulo registrou pouco mais de três interrupções para cada unidade consumidora, abaixo do limite estabelecido pela Aneel, de quase cinco desligamentos em 2023. O nono lugar nesta tabela é o pior índice registrado pela empresa, que chegou a ficar entre as três melhores no FEC em 2021.
Blecautes massivos não impactaram índice de desempenho da Enel São Paulo
Mesmo com desligamentos massivos como o ocorrido no feriado de Finados em São Paulo no ano passado, não houve queda expressiva na avaliação da agência reguladora sobre a Enel São Paulo. Para o advogado especializado no setor elétrico Henrique Reis, uma explicação possível é o fato de que os índices DGC, DEC e FEC são resultado de uma média da operação da empresa durante todo o ano.
“É possível que a companhia, fora dos eventos climáticos mais extremos, consiga um índice mais estável, dentro da meta. No fim das contas, aquele período pode não comprometer o resultado. Pode ser uma situação conjuntural, que no dado consolidado não tem impacto”, avaliou.
A Enel São Paulo foi procurada pela Gazeta do Povo para comentar os índices do ranking da Aneel, mas não retornou. O espaço segue aberto para manifestação da empresa.
Copel apontou "dados distorcidos" em ranking da Aneel
No Paraná, discrepâncias entre os índices apurados e a colocação no ranking de desempenho da Aneel foram motivo de críticas da Companhia Paranaense de Energia (Copel). No ano em que foi privatizada, a empresa registrou uma queda de três posições na lista da agência reguladora. A Copel, que chegou a ficar entre as 10 melhores em 2021, ocupou a 25ª posição entre as 29 distribuidoras analisadas pela agência em 2023. Para a Copel, o ranking da Aneel está “distorcido”.
Procurada pela reportagem da Gazeta do Povo, a assessoria de imprensa da Copel avaliou, em nota, que os dados da própria Aneel contestam o ranking de desempenho das distribuidoras. Para a empresa, a agência “não elenca as distribuidoras pelo tempo médio sem energia durante o período observado, o chamado DEC”.
As metas, reforça a Copel, são diferentes para cada distribuidora. “Dessa forma, o ranking da Aneel induz a uma percepção equivocada da realidade no setor elétrico brasileiro, ao colocar à frente [da Copel] empresas que têm pior desempenho no critério mais importante para o cliente, que é o da oferta continuada de energia”, justifica a empresa paranaense.
Para Enel São Paulo, punição da agência deve ter "caráter educativo"
À reportagem, Reis lembrou que a Aneel tem sido rigorosa com a Enel São Paulo em relação ao descumprimento das metas. Somente no ano passado, a agência contabilizou quase R$ 105 milhões em compensações de continuidade para a empresa que atende o estado de São Paulo – uma espécie de indenização paga automaticamente pela distribuidora, por meio de desconto na fatura de energia elétrica, sem que haja a necessidade de que o consumidor afetado por desabastecimentos acione a companhia.
Além dessas compensações, a Enel recebeu uma multa milionária por conta do apagão ocorrido em novembro de 2023. A cifra passa dos R$ 165 milhões, e foi contestada pela empresa junto à Aneel.
Somadas, as sanções financeiras impostas à Enel São Paulo por falhas no serviço - e ainda não quitadas - chegam à casa dos R$ 300 milhões.
Sobre o apagão de novembro de 2023, a Enel apontou, em sua defesa, que o valor é desproporcional e que eventuais penalidades aplicadas pela Aneel “devem apresentar caráter educativo”. Por fim, a companhia afirmou que o evento climático ocorrido naquela data foi extremo e, portanto, impossível de ser atendido com a velocidade pretendida pela agência regulatória.
“Não se faz razoável as concessionárias de energia elétrica possuírem número de equipes para atendimento dos cenários mais críticos possíveis, até mesmo porque não só a ocorrência desses cenários é imprevisível, como o são também seus efeitos. Por essa razão, é materialmente impossível que as concessionárias estejam preparadas para situações em que não há parâmetro comparativo, dada a própria natureza desses eventos, sendo importante, inclusive, se encontrar um equilíbrio entre razoabilidade do patamar de qualidade versus custos (tarifa e modicidade tarifária)”, completou a Enel na época.
Para Aneel, distribuidora paulista não prestou serviço adequado
Em resposta, a agência nacional lembrou que a Enel tem levado quase o dobro de tempo das outras concessionárias para o atendimento de desligamentos e apagões. Naquele blecaute de novembro de 2023, o restabelecimento completo das unidades consumidoras levou quase uma semana.
“Não pode ser considerado serviço adequado deixar muitos consumidores sem fornecimento de energia elétrica por longos períodos. Sendo assim, diante da situação constatada, a Concessionária não observou as premissas de serviço adequado, especialmente no que diz respeito à continuidade e eficiência na prestação de serviços de energia”, respondeu a Aneel.
A agência lembrou que, legalmente, o valor da multa poderia ser maior, de até 2% do faturamento da empresa – nesta caso, a sanção poderia se aproximar de meio milhão de reais – e destacou que houve queda nos níveis de serviço da Enel. Em última análise, destacou a Aneel, a distribuidora precisava contratar mais equipes para fazer frente à quantidade de ocorrências emergenciais. Tal medida, necessária para manter os níveis de qualidade no atendimento, não foi cumprida.
“Como a distribuidora não aumentou seu contingente operacional, isso faz com que seja internalizado ganhos pela distribuidora, porém com degradação na prestação do serviço verificada na presente fiscalização no que tange ao restabelecimento do fornecimento de energia elétrica após interrupções do serviço”, detalhou a agência, ao negar o recurso da Enel no último dia 28.
“Essa fiscalização ocorre sob pena, inclusive, de cassação de outorga, com a declaração de caducidade da concessão a depender do comprometimento dos índices de atendimento aos consumidores”, explicou Henrique Reis.
Caducidade da concessão pode seguir três caminhos
A caducidade da concessão pode ser uma das consequências do processo disciplinar a ser aberto pela Aneel contra a Enel. O pedido expresso foi feito pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, nesta segunda-feira (1º). A empresa está sob investigação por falhas e transgressões reiteradas que afetam a qualidade dos serviços prestados e pode perder a concessão.
Neste caso mais extremo, de acordo com o advogado, há três cenários possíveis. Um deles seria a designação de uma pessoa jurídica ou mesmo de um órgão da União para seguir oferecendo o serviço. “Isto aconteceu com a Eletrobras, que seguiu temporariamente na prestação do serviço até privatizar”, disse Reis.
Outro caminho seria a realização de uma nova licitação. “Nesse caso é a designação para um ente particular, e como se trata de uma concessão é necessário relicitar essa concessão”, comentou o advogado.
A terceira possibilidade, considerada a pior delas pelo especialista, é a intervenção. Neste modelo, um interventor é designado para comandar a empresa até que as dificuldades sejam sanadas. Reis lembrou que houve duas grandes intervenções no setor, uma no início dos anos 2000 e outra em 2012.
“Houve um legado muito ruim. A Aneel identificou indícios de fraude contábil na empresa, que colocou em risco a continuidade da prestação do serviço. Os interventores precisavam de capital de giro para a empresa, mas tinham os financiamentos negados pelos bancos justamente por causa da intervenção. É algo a não ser repetido”, completou.
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