A execução do empresário Antônio Vinicius Lopes Gritzbach, morto pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) com tiros de fuzil na saída do Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP), no último dia 8, será investigada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público de São Paulo (MP-SP), apesar da criação da força-tarefa da Secretaria da Segurança Pública do estado.
As diferentes frentes de investigação criminal no caso, que inicialmente estaria sob responsabilidade da Polícia Civil de São Paulo, estão em curso pelas suspeitas de corrupção policial levantadas durante depoimentos do empresário assassinado. Gritzbach se tornou réu colaborador do MP-SP após acordo de delação premiada contra o crime organizado.
O empresário foi preso pela acusação de ser o mandante do duplo homicídio de Anselmo Bechelli Santa Fausta, 38 anos, o “Cara Preta”, traficante internacional e integrante da cúpula do PCC, e do motorista dele Antônio Corona Neto, 33, mais conhecido como “Sem Sangue”, em 27 de dezembro de 2021, no Tatuapé, zona leste da capital. Gritzbach foi beneficiado pela utilização de tornozeleira eletrônica e deixou a prisão para responder o processo em liberdade.
Oito dias antes de ser morto, ele delatou policiais civis por extorsão e furto, sendo que dois deles foram citados na denúncia de Gritzbach na Corregedoria da Polícia Civil. Um delegado e um chefe dos investigadores de uma das principais delegacias de São Paulo teriam recebido R$ 500 mil em dinheiro cada um, totalizando R$ 1 milhão. No entanto, conforme o delator, o pedido para o arquivamento do inquérito era muito mais alto: R$ 40 milhões.
A defesa do empresário afirma que quando Gritzbach foi preso na própria residência em 2022, foram furtadas uma bolsa com R$ 20 mil em espécie e uma maleta com 20 relógios luxuosos. Após a denúncia na Corregedoria e fotos dos policiais utilizando os relógios idênticos, a maleta foi devolvida e as fotos apagadas das redes sociais. Antes da morte do empresário, a defesa afirmou que ainda faltavam a devolução de sete relógios avaliados em mais de R$ 500 mil.
Por meio do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), o MP-SP investiga de maneira independente a morte do empresário em Garulhos, sob a ordem de sigilo absoluto para evitar vazamentos de informações.
Já a Polícia Federal, sob a prerrogativa do crime ter ocorrido em um aeroporto internacional de jurisprudência da União, também abriu uma investigação e passou a integrar a força-tarefa dos órgãos de segurança pública do estado de São Paulo. Confome a apuração da Gazeta do Povo, membros da Polícia Civil questionaram o envolvimento da PF nas investigações, mas foram obrigados a aceitar por ordem da pasta.
Policiais civis delatados por Gritzbach são afastados
Os policiais civis citados na delação de Antônio Vinícius Gritzbach foram afastados das funções operacionais. A transferência foi confirmada pela Secretaria de Estado da Segurança Pública de São Paulo (SSP) nesta quarta-feira (13) com encaminhamento dos agentes para funções administrativas.
A Corregedoria da Polícia Civil solicitou ao Poder Judiciário o compartilhamento das informações apuradas durante as investigações da execução em Guarulhos. Os dados estão sob sigilo e poderão ser utilizados nos procedimentos internos abertos contra os policiais. “Para a instauração posterior da sindicância ou de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) precisamos de fundadas suspeitas e justa causa mais apurada”, explica o delegado-geral de Polícia Civil, Artur Dian.
Segundo apuração da Gazeta do Povo, entre os acusados de extorsão e furto por Gritzbach estão integrantes do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e do Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), os dois principais departamentos da Polícia Civil.
“Tribunal do Crime” teria pago R$ 10 milhões a policiais
Gritzbach é apontado como principal suspeito pela morte do traficante "Cara Preta" e do motorista dele. Ele possuía uma dívida de cerca de R$ 200 milhões com o integrante da cúpula do PCC, o que teria motivado o sequestro do empresário para "julgamento" no Tribunal do Crime, que pode determinar a morte de quem quebrar as regras da facção.
Segundo os investigadores ouvidos pela reportagem, um dos integrantes da “sintonia” que lidera o PCC, Rafael Maeda Pires, mais conhecido como "Japa", defendeu a liberação de Gritzbach após 10 horas de sequestro com objetivo de receber parte dos valores da dívida do empresário com "Cara Preta".
Antes de ser assassinado, o réu colaborar revelou que os responsáveis pelo Tribunal do Crime teriam pago R$ 10 milhões em propina a policiais para não serem presos pelo envolvimento no sequestro do empresário. Na versão de Gritzbach, dois policiais do Deic receberam a quantia e dividiram o valor. Logo depois, "Japa" foi encontrado morto dentro de um veículo em uma garagem no Tatuapé, bairro onde Gritzbach comercializava os imóveis para o PCC.
Coronel critica demora da Secretaria da Segurança para afastar policiais delatados
O coronel da reserva e ex-secretário nacional da segurança pública, José Vicente, criticou a demora da SSP na tomada de decisão após a denúncia na Corregedoria contra os policiais militares que prestavam o serviço de segurança particular ao colaborador do MP-SP.
“Pode ter acontecido uma falha grave por parte do sistema de inteligência da SSP. Esse envolvimento de PMs com o suspeito, o delator, já era de conhecimento a cerca de 30 dias. O afastamento dos policiais devia ter sido feito há muito mais tempo do que agir agora, depois que aconteceu essa ação tão grave”, contestou Vicente.
De acordo com a SSP, os policias que foram afastados já eram investigados há mais de um mês pela Corregedoria da corporação por trabalharem como seguranças particulares de Gritzbach. Embora muitos policiais militares trabalhem em seus horários de folga - o chamado “bico” - a atuação é considera ilegal caso não se tenha autorização do comandante do Batalhão.
O coronel defendeu o trabalho em conjunto das policias na integração das forças de segurança, por meio da força-tarefa. “A Polícia Federal tem informações importantes dos aeroportos do Brasil porque são áreas de interesse da União. E a Polícia Civil tem muito mais condições para fazer investigação sobre o homicídio do que a PF. O DHPP tem uma expertise de milhares de investigações”, argumenta o ex-secretário.
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