Depois de sofrer críticas, o vereador Rubinho Nunes (União) se reuniu na última segunda-feira (1), na Câmara Municipal de São Paulo, com organizações não governamentais (ONGs) que trabalham com doação de alimentos para pessoas em situação de rua para se desculpar e esclarecer as motivações do PL 445/23.
De autoria de Nunes, o projeto estabelece exigências para a doação de alimentos, incluindo uma multa de até R$ 17 mil em caso de descumprimento das determinações. Depois de aprovado em primeira votação, na última quinta-feira (27), o PL 445/23 foi criticado por analistas de política urbana e órgãos do terceiro setor.
“A multa foi um erro grotesco da minha parte. Eu não fiz a conta na hora, me trouxeram o projeto e eu dei o ok. Achei que era pouco mais de R$ 1 mil, fui ver e era de R$ 17 mil, uma multa absurda”, disse Nunes à Gazeta do Povo.
Questionado sobre como o projeto foi elaborado, o vereador afirmou que foi feito pela equipe dele em parceria com pessoas que trabalham com acolhimento e que relataram o problema da doação de alimentos desorganizada, de maneira que as mesmas pessoas recebem as mesmas doações. “Eu sei que teve falhas no projeto e reconheço isso, tanto que retirei de tramitação. Mas o objetivo era levar as pessoas para o acolhimento e tirá-las da rua, o que acabou falhando”, complementou.
Sobre a reunião com as ONGs, que foi intermediada pelo deputado estadual Rafael Saraiva (União), o vereador afirmou que evidenciou a “insatisfação com o trabalho prestado pela Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social ao longo dos últimos anos e como ela prejudica a assistência em São Paulo”.
Segundo Nunes, ele procurou a secretaria municipal por diversas vezes e por meio de requerimento. Em resposta à reportagem, a pasta afirmou que “não encontrou registros de contato do vereador Rubinho Nunes com a pasta, sejam por e-mails, ligações ou ofícios”.
Em nota, o órgão afirmou que "a distribuição de refeições a pessoas em situação de rua pela pasta ocorre através dos Centros de Acolhida, geridos em parceria com Organizações da Sociedade Civil (OSCs)”, e que “nos serviços de acolhimento e convivência, são fornecidas, em média, 111.214 refeições por dia”. Afirmou também que “a única ação de distribuição de alimentos diretamente nas ruas da cidade acontece através das equipes do Serviço Especializado de Abordagem Social, na região da cracolândia”.
Secretária reconhece problema e aponta dificuldades nas doações de alimentos em São Paulo
Em entrevista à Gazeta do Povo, a secretária municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, Soninha Francine (Cidadania), criticou o projeto do vereador principalmente do ponto de vista da burocratização que seria criada com a proposta.
“Precisamos ter alguma forma de cooperação com as ONGs para termos uma segurança sobre a doação de alimentos para as pessoas, até para não sobrar comida. É desolador ver esse monte de embalagem no chão no centro da cidade, não podemos conviver com isso e achar que está tudo bem, mas burocratizar e ameaçar com multas não resolve nada”, diz ela.
Entre as dificuldades de se realizar o trabalho em parceria com as ONGs, a secretária aponta para os ruídos de comunicação. “Essa tensão cria um clima ruim. Se você chegar a campo como alguém da prefeitura e perguntar o que as pessoas estão fazendo, a chance de ser repelido é muito grande”, diz ela. Rubinho Nunes é autor do requerimento da CPI das ONGs, que se tornou CPI do abuso sexual, e que não obteve a quantidade mínima de assinaturas de parlamentares necessária para que a proposta avançasse na Casa.
A secretária do município acrescenta que os custos para se manter os equipamentos públicos são grandes e devem ser planejados a longo prazo. A pasta chefiada por Soninha entrega cerca de 16 mil refeições por dia em diversos pontos da cidade de São Paulo. Cada refeição tem um custo de R$ 10, o que totaliza R$ 160 mil por dia.
De acordo com o prefeitura de São Paulo, “neste ano a gestão superou a marca de 7 milhões de refeições servidas à população” e os programas da pasta são financiados pelo Fundo de Abastecimento Alimentar de São Paulo, que tem previsão de R$ 351 milhões do orçamento da cidade em 2024.
No ano passado, a secretaria criou o programa Estação Cidadania, um espaço para pessoas em situação de rua com oferta de 1 mil refeições por dia, além de refeitório, local para tomar banho, lavanderia, motorização de carroças, orientação para acesso à cidadania e atividades culturais como aula de música e cinema.
O local é gerido por uma instituição que vence o edital e fica responsável pelo programa ao longo de três anos – atualmente é o Instituto Claret. Questionada se de alguma forma a criação do equipamento incomodou outras instituições e voluntários que atuam no centro, Soninha negou e afirmou que os trabalhos se complementam.
De acordo com ela, a prefeitura oferece assistência e alimentação durante o dia, na hora do almoço e do jantar, às 18h, mas enfrenta dificuldades para atender entre 22h e meia-noite, quando mais ocorrem doações por voluntários. “Não conseguimos atender muito bem tarde da noite, pois isso gera um rande impacto de recursos humanos. É muito melhor trabalhar em cooperação com a sociedade, assim as pessoas também saem do seu conforto para fazer uma doação e ajudar o próximo”, afirmou Soninha.
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