Cirurgia não é milagrosa e muda aspectos importantes da vida pessoal
Longe de ser uma solução milagrosa para o problema da obesidade, a cirurgia bariátrica envolve riscos e muitas transformações. Há uma semana, no dia 15 de março, o técnico da equipe de natação do Clube Curitibano, Marcos Chaiben, 51 anos, morreu após ter sofrido uma hemorragia interna. Dois dias antes, ele havia feito uma cirurgia de redução de estômago.
A cirurgia bariátrica, usada para redução de estômago, tem regras rígidas. Mas, no Brasil, segundo país do mundo com maior número de operações deste gênero, há médicos e pacientes burlando restrições impostas pelo Conselho Federal de Medicina e pelo Ministério da Saúde. As normas servem para definir a real necessidade e a importância da cirurgia bariátrica.
O "atalho" para conseguir a cirurgia mais rapidamente seria procurado para beneficiar dois tipos de pacientes: aqueles que tecnicamente não apresentam obesidade mórbida; e aqueles que sofrem com a doença, mas não apresentam condições físicas ou psicológicas para realizar a gastroplastia.
Não foi fácil "convencer" os planos de saúde a cobrirem as despesas da cirurgia bariátrica. Há pouco mais de cinco anos, as operadoras de saúde brasileiras a consideravam um procedimento estético e não tratavam a obesidade como uma doença. Era preciso entrar na Justiça para provar que a cirurgia era a única alternativa para salvar a vida de pacientes com obesidade mórbida.
Em 2005, a publicação da resolução 1.766 do Conselho Federal de Medicina, que estabelece normas seguras para o tratamento cirúrgico da obesidade mórbida, serviu para orientar médicos, planos de saúde e também o Sistema Único de Saúde (SUS) sobre a real necessidade da gastroplastia, considerada o último recurso para o tratamento da doença.
De acordo com a Resolução, a cirurgia é recomendada para pacientes que possuam o índice de massa corporal (IMC) igual ou superior a 40 ou para aqueles com IMC igual ou superior a 35, mas que apresentem comorbidades que ameacem a vida. Entram nesse caso a diabete, a apneia do sono, a hipertensão arterial, a dislipidemia, doença coronariana, osteoartrites e outras.
O protocolo do CFM também determina que o paciente apresente obesidade estável há pelos menos cinco anos e que ele tenha tentado, por no mínimo dois anos, outras opções de tratamento clínico, antes de optar pelo procedimento cirúrgico.
Os planos de saúde exigem ainda que seja realizada uma perícia do estado clínico do paciente por uma equipe multidisciplinar formada por cardiologista, endocrinologista, psicólogo e nutricionista, além do cirurgião e do anestesista, todos filiados ao convênio.
Caminho curto
O advogado Olavo Pereira de Almeida, que atende o plano de saúde Paraná Clínicas, explica que é comum casos de pacientes que realizam a perícia com profissionais não credenciados pelo plano para não precisar seguir as regras estabelecidas pelo protocolo.
"Infelizmente, existem médicos que compactuam com o paciente que, por sua vez, acredita que a gastroplastia é o caminho mais fácil para a perda de peso. Como a avaliação não é aceita pela operadora de saúde, o paciente então entra na Justiça para obrigá-la a custear o procedimento, mesmo que não tenha sido comprovada a sua necessidade."
Apesar das irregularidades, quase sempre o juiz aceita os argumentos do paciente e autoriza a cirurgia. "Como ele não é um especialista da área de saúde, é comum o juiz ser induzido ao erro. Ele acredita na palavra do médico, que alega que o paciente corre risco de vida se não realizar a cirurgia. O juiz, obviamente, não quer ser responsável por nenhuma tragédia."
Mas, como explica o médico Alcides José Branco Filho, gastro-cirurgião dos hospitais Vita Batel e Santa Casa, a cirurgia bariátrica não é um procedimento emergencial, pelo contrário. "Se o paciente não estiver com a saúde estável, não deve realizar a cirurgia. É um procedimento que deve ser bem pensado, planejado. Existem vários procedimentos pré-cirúrgicos que devem ser cumpridos antes de tomar qualquer decisão, para garantir que o resultado final seja seguro e eficiente."
O juiz, entretanto, não sabendo disto, determina que a cirurgia seja realizada o quanto antes. "Geralmente, o prazo estabelecido é de 48 horas, o que não nos dá tempo de contestar a decisão", completa Almeida.
Existem casos de candidatos à cirurgia que engordam para atingir o IMC determinado e que foram à perícia com sacos de pesinhos presos na cintura para enganar a balança, como relata a autora Maria Fernanda Merling em seu livro Uma Decisão de Peso, dedicado a obesos que estão pensando em fazer a cirurgia.
Segundo Maria Fernanda, que realizou a gastroplastia há cerca de três anos, fatores psicológicos são extremamente relevantes na hora da perícia. "A cirurgia transforma a vida da pessoa. Muitos não conseguem lidar com tantas mudanças, perdem a identidade e chegam a sofrer de depressão", conta. Por isso o protocolo também estabelece que pessoas que abusam do álcool, usam drogas ilícitas ou sofrem de quadros psicóticos ou demenciais graves ou moderados não devem realizá-la.
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