Crianças do Hospital Pequeno Príncipe: números crescentes desafiam a oncologia pediátrica| Foto: Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo

Câncer mata?

Casos em crianças só "perdem" para a violência urbana

O câncer é a segunda causa de óbitos de crianças e adolescentes (7%), perdendo somente para óbitos por causas externas, como as vítimas da violência urbana. "O câncer se configura como a doença que mais mata", ressalta a chefe da Seção de Oncologia Pediátrica do Instituto Nacional do Câncer, o Inca, Sima Ferman.

A médica explica que o câncer infantojuvenil é potencialmente curável, mas é necessário que o diagnóstico seja feito de forma precoce e o tratamento realizado em centros especializados na atenção à criança. "Muitos pacientes ainda chegam para tratamento com doença avançada. É importante que as crianças com suspeita de câncer tenham um encaminhamento o mais rápido possível", afirma.

Sima destaca que cada tipo de câncer necessita de um plano de tratamento, de acordo com as características da doença. O tempo de atendimento, em geral, é de seis meses a dois anos, mas varia conforme o tipo de tumor. "Ao término do tratamento previsto, o paciente permanece em controle clínico. Se ficar em controle por um período superior a cinco anos, sem retorno da doença, é considerado ‘curado’, pois o risco de voltar é igual ao da população geral em adquirir um novo câncer", explica.

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As dificuldades em superar um câncer vão além da própria doença. Não bastasse enfrentar filas para exames do Sistema Único de Saúde, crianças diagnosticadas precisam de sorte para achar médicos especializados. No Paraná, segundo o Conselho Regional de Medicina, só 22 cancerologistas pediátricos estão na ativa. Desses, 72% atuam na capital.

INFOGRÁFICO: Veja o índice de casos de câncer infanto-juvenil no Brasil

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A situação é semelhante à realidade nacional. A Sociedade Brasileira de Oncologia Infantil (Sobope) possui apenas 294 médicos cadastrados para atender uma média de 12 mil novos casos da doença por ano. Ou seja, cada médico teria que atender anualmente 40 novas crianças, sem contar os pacientes que já em tratamento. Nem a lei e nem a Sobope orientam o número de pacientes que podem ser atendidos por um único médico. "Uma das dificuldades é a falta de profissionais. Por isso não se estipula um número de pacientes por médico. Lidamos com vida de crianças e temos que atender a todos", destaca Teresa Fonseca, vice-presidente do Sobope.

No Paraná, o Instituto Nacional de Câncer (Inca) registrou ano passado 453 crianças com a doença. Este ano, o número pode chegar a 600. Em todo o país, serão 11.840 casos novos de câncer infantojuvenil. O Inca esclarece que partes dessas pessoas entram em óbito sem nem ter a doença diagnosticada.

A médica Flora Wanatabe, chefe do Setor de Oncologia Infantil do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba, afirma que o baixo número de profissionais e a maioria atuando na capital aumentam as dificuldades. "Muitas crianças vêm a Curitiba em busca de atendimento", conta. No interior do estado, só seis oncologistas pediátricos estão em atuação.

Somente no Pequeno Príncipe, 130 novos casos de câncer em crianças são tratados ao ano. "É muita gente para poucos profissionais. Acredito que se cada médico atendesse 15 seria o ideal, mas não é o que acontece."

Atenção

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Para Flora Wanatabe, grande parte dos casos teria condição de ser resolvida caso o médico da atenção básica tomasse iniciativa. "O profissional deve tomar a frente e lutar para que a criança receba o tratamento de forma rápida. Não adianta se limitar a encaminhar pela burocracia do SUS", observa.

Para a médica Teresa, vice-presidente do Sobope, a demora para a realização dos exames é outro grande entrave. "Em uma criança o tumor desenvolve mais rápido. A criança não pode ficar na fila. Em um mês, o tumor se dissemina pelo corpo."

Grupos de solidariedade apoiam doentes vindos de fora

Algumas entidades promovem diferentes ações com as crianças e familiares, dando suporte às famílias que vêm de outras regiões, em busca de tratamento contra o câncer em Curitiba.

Uma dessas instituições, a Associação Paranaense de Apoio à Criança com Neoplasia (Apacn) atua há mais de 30 anos e tem seu trabalho reconhecido. Localizada no bairro Capão da Imbuia, a entidade atendeu no ano passado 1.728 pessoas.

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Segundo o presidente da Apacn, Antonio Carlos dos Santos Lima, as crianças e acompanhantes chegam à entidade encaminhadas pelo serviço social do hospital onde farão o tratamento. As crianças e familiares recebem ajuda psicológica e podem dormir na casa de apoio. "Já atendemos pacientes oriundos de todo o Brasil e do Uruguai, Paraguai e Bolívia. Na nossa unidade do ambulatório atendemos também pacientes de Curitiba e Região Metropolitana", explica Lima, ao tratar da rede de solidariedade formada em torno dos pacientes.

A entidade também é geradora de dados: a Apacn desenvolve um ranking de reclamações pacientes. Os resultados indicam que as principais queixas são a demora no atendimento e a lentidão para obter o retorno do resultado dos exames, problemas também apontados pelos especialistas ouvidos pela reportagem.

Outra instituição da capital que ajuda crianças diagnosticadas com câncer é a Associação Mantenedora de Apoio à Criança de Risco e com Câncer (AMA), que também atende a infância em estado de risco social. Segundo a coordenadora Ângela Alves da Silva, atualmente cerca de 100 pessoas são atendidas pela entidade. O local funcionada das 7 às 18 horas. "Damos suporte escolar, psicológico e também ajudamos com doações de roupas e brinquedos", conta.

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