Confira os materiais que podem ser utilizados em cada parte do corpo humano| Foto:

Expectativa

Biomateriais vão dar lugar à engenharia

Em alguns anos ou, no máximo, décadas, a meta é que os biomateriais não sejam mais usados para substituição de tecidos. Uma tendência que se fortalece é a da engenharia de tecidos, com cultivo de células – seja células-tronco, células da própria pessoa ou de outras –, para desenvolvimento e implante de tecidos, órgãos e até membros.

"Imagine que a pessoa perdeu um pé. Com o desenvolvimento da engenharia de tecidos, vai ser possível que ela vá a uma clínica e escolha um pé para um implante ou poderemos escanear o outro pé, desenvolver uma estrutura de pele, músculos, ossos e tendões, semear células retiradas do paciente, desenvolver esses tecidos e fazer a cirurgia para implantar um pé igual ao que ela tinha", explica o presidente da Slabo, Luís Alberto dos Santos.

Neste caso, os biomateriais seriam utilizados somente como um arcabouço onde as células se desenvolveriam até serem implantadas no organismo. "Em inglês, é o que chamamos de scaffolding, aquela estrutura temporária de madeira que se usa em construções até que a estrutura final esteja pronta e ela possa ser retirada. Com ela, o tecido do implante se desenvolveria, o biomaterial seria absorvido pelo organismo e a pessoa teria de volta o tecido ou órgão comprometido."

Segundo Santos, há pesquisas com testes em animais para criar órgãos de maneira experimental, como bexiga, pulmão, rim e coração, além de estudos para o uso de impressoras capazes de produzir células e biomateriais. "É um trabalho minucioso, que ainda deve demandar tempo para gerar resultados, mas as expectativas para o futuro são as melhores possíveis."

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Materiais como cerâmicas, nylon, aço inoxidável e titânio são usados para substituir tecidos danificados e melhorar a qualidade de vida dos pacientes. E os especialistas garantem: em poucos anos, será possível até produzir órgãos com biomateriais

Aço inoxidável, titânio, cromo, cobalto, nylon, acrílico, cerâmicas, polietileno, silicone e PVC. Esta pode até parecer uma lista do que é necessário para fazer algum experimento, mas, acredite: esses e outros materiais são usados hoje no corpo humano para substituir tecidos, cartilagens, ossos danificados, realizar implantes dentários, re-estabelecer funções orgânicas e até melhorar a autoestima e a qualidade de vida dos pacientes. E esse avanço não deve parar por aí. Segundo especialistas, em um futuro próximo, a expectativa é de que as pesquisas abram caminho para a produção de órgãos.

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De acordo com o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e presidente da Sociedade Latino Americana de Biomateriais, Engenharia de Tecidos e Orgãos Artificiais (Slabo), Luís Alberto dos Santos, os chamados biomateriais, produtos sintéticos compatíveis para utilização no corpo humano, são usados principalmente nas áreas de ortopedia, odontologia e em realização de implantes.

Em comum, todos têm duas características: a durabilidade e a resistência. "Os fluidos corpóreos podem ser comparados com a água do mar, por sua capacidade de danificar materiais. Por isso, cada produto usado dentro do organismo precisa ter grande capacidade de aguentar corrosão", explica a professora do departamento de En­­genharia Mecânica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Cecília Zavaglia.

Embora alguns dos materiais sejam os mesmos usados na indústria, para a nobre destinação na medicina eles precisam passar por rígidos controles de qualidade e até mudanças em sua composição. "São materiais bem similares aos usados no dia a dia e na indústria, mas são produzidos com normas próprias quanto à composição química e em ambientes que seguem o grau médico, com cuidados redobrados de higiene e limpeza", esclarece Santos.

Com isso, o silicone de cirurgias de implante tem uma composição diferente do usado na indústria, assim como o aço inoxidável de próteses não é o mesmo do usado em panelas, carros e navios. "E é fácil notar o tamanho do problema quando há troca. Foi o que aconteceu com as próteses de silicone PIP, na França. O gel médico foi trocado pelo industrial, que é mais barato, mas tem qualidade inferior, o que causou rupturas", diz. No Brasil, o controle dos produtos é feito pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Danos

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Além das normas de higiene e segurança, os pesquisadores se preocupam em verificar se o material não causa danos ao organismo. "Eu não posso desenvolver um produto para substituir um osso do pé e ele gerar dor no joelho, alergia ou até um câncer. Tudo tem que funcionar sem danos, da mesma forma como acontece com os ossos e tecidos do corpo", explica a professora Cecília.

Mas ela garante que, como são amplamente testados antes da fase de implantação no corpo, são raros os casos de reações do organismo ao material. "São anos ou até décadas de testes, então o produto final, quando aprovado para uso, é seguro."

Materiais também contribuem com a regeneração

Os biomateriais não são usados apenas para substituir tecidos, mas, em alguns casos, para ajudar na regeneração. Em uma neurocirurgia, por exemplo, é preciso fazer uma abertura no crânio e até tirar pedaços de osso inteiros para chegar ao cérebro. Para fechar essa abertura, são usadas peças absorvíveis de hidroxiapatita. "Como o tecido ósseo identifica esse material como osso também, cresce em cima dele e se regenera. Em algum tempo, a hidroxiapatita é totalmente absorvida e o paciente volta a ter seu osso normalmente", explica o presidente da Slabo, Luís Alberto dos Santos.

Hoje, um processo semelhante é feito em casos de implantes dentários. Segundo o professor do Laboratório de Biomateriais do Instituto Militar de Engenharia (IME) Carlos Nelson Elias, quando há perda de um dente devido a desgaste, o organismo começa a absorver o osso e, para resolver esse problema, é usado um biomaterial que induz as células a se diferenciarem. "Após 8 a 10 meses da colocação do biomaterial, há formação de osso com qualidade adequada para permitir o implante e para suportar as cargas mastigatórias."

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