O nascimento do filho foi a motivação para André Luís Rech da Rocha parar de fumar| Foto: Tadeu Villani/Ag. RBS

Sem Tabaco

O programa implantado em Goiânia em 2004 segue o método preconizado pelo Ministério da Saúde e Instituto Nacional do Câncer, ganhou força em 2009 e é considerado modelo no país. Saiba as razões.

• O diferencial do programa nacional está no emprego da terapia cognitivo-comportamental. São palestras e trocas de experiência, que auxiliam a tratar a dependência psicológica. Em Goiânia, a média era de 18 pacientes por reunião.

• Também são empregados medicamentos antidepressivos, além de terapia de reposição de nicotina com adesivos, goma de mascar e pastilhas, que atacam a dependência química.

• Os remédios, quando necessários, auxiliam a controlar os sintomas da abstinência, como ansiedade, irritabilidade, sonolência, apetite aumentado para doces e desejo intenso de fumar. Eles são usados por três meses. Dos, 299 que deixaram de fumar, 87,3% fizeram uso de apoio medicamentoso.

• Até o terceiro mês do programa, as reuniões para a terapia são semanais. Daí, até o sexto mês, passam a ser quinzenais. Depois, caso o paciente deseje, pode participar de reuniões mensais até completar um ano para evitar a recaída.

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Procure ajuda

O que motiva um paciente a parar de fumar é a consciência da necessidade de largar o vício, dos riscos e das consequências do tabagismo. Para quem chegou nesse estágio e pretende buscar ajuda, uma dica é procurar o Disque parar de fumar, pelo Disque-Saúde, das 7 às 22 horas, de domingo a domingo. O interessado em se livrar do cigarro pode tirar dúvidas pelo 0800 61 1997.

O cheiro de cigarro impregnado na roupa do filho era o que faltava para André Luís Rech da Rocha, 25 anos, romper com o vício. O funcionário público brigou com o tabaco por três anos. Há 10 meses, nasceu Leonardo, e a culpa por fumar aumentou. Com a ajuda do serviço público de saúde, conseguiu abandonar a nicotina, deixou o sedentarismo, perdeu 12 quilos e poupa quase R$ 400 mensais sem a compra dos maços.

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Viradas de vida como essa vêm sendo conquistadas, ainda que timidamente, pelo Programa de Cessação de Tabagismo do Sistema Único de Saúde (SUS). Para testar a sua efetividade, uma pesquisa recente mostrou que são necessários R$ 1.433 para ajudar alguém a parar de fumar, enquanto que o tratamento mínimo para um câncer, como o de pulmão, teria um custo para os cofres públicos de R$ 29 mil.

O estudo ocorreu de 2011 a 2013 e foi realizado pelo Instituto de Avaliação de Tecnologia em Saúde (Iats), com sede no Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Para se chegar aos valores, foi dissecado o programa aplicado em Goiânia, um dos primeiros a ser implantado no país e considerado modelo. Segundo os pesquisadores, os dados podem ser replicados para o restante do Brasil, já que seguem um modelo estabelecido pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca) para todos os estados.

Dos 803 pacientes atendidos pelo SUS na capital goiana em 2010, o índice de sucesso foi de 37,2% após seis meses de acompanhamento dos integrantes. Levantamentos internacionais demonstram que a taxa média de abandono do vício varia entre 13,3% e 19,7%.

Terapia

Rocha encontrou o auxílio em Porto Alegre. Frequentou o grupo por um ano e desistiu por três vezes. Usou o adesivo de nicotina em todas as oportunidades em que retornou. Em primeiro lugar, foi a vontade de mudar que o ajudou, mas a terapia em grupo o manteve motivado. "Se eu continuasse naquele ritmo, fumando duas carteiras por dia, não conseguiria ver meu filho se formar. Hoje, caminho três vezes na semana e jogo futebol todos os finais de semana", contou Rocha, que está no terceiro mês de abstinência.

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Andréa Mendes, especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, que fez da pesquisa sua dissertação de mestrado na Universidade Federal de Goiás (UFG), explica que o diferencial brasileiro está na terapia cognitivo-comportamental em grupo por período prolongado. "Só o medicamento não resolve. Essa configuração de ter a terapia como obrigatória pode ser um diferencial para conseguirmos taxas mais elevadas, além do tempo mais prolongado de acompanhamento dos pacientes", explicou .

Parar de fumar exige mais que só expor riscos

O programa para largar o vício do cigarro, recomendado pelo Ministério da Saúde, já foi implantado em todos os estados. Só no Rio Grande do Sul, onde está o maior número de fumantes do país, são 326 serviços públicos desse tipo. Segundo a pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), os gaúchos que fumam representavam 18% em 2012, contra a média brasileira de 12%.

A cardiologista Carisi Anne Polanczyk, coordenadora-adjunta do Instituto de Avaliação de Tecnologia em Saúde (Iats), do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, conta que a chance de um médico convencer um paciente a deixar de fumar só expondo os riscos é de 3% a 6%. Por outro lado, programas como esses, que envolvem terapia, têm se mostrado efetivos. Ela afirma que, apesar de Porto Alegre ter o mais alto índice do país – 16,5% da população é fumante –, o atendimento ainda é muito restrito. "Deveríamos ser mais agressivos nas nossas estratégias para tentar reduzir esse número. Não podemos seguir o resto do país. Já que temos os piores resultados, temos de fazer mais coisas", argumenta.

Mesmo em Goiânia, sede do projeto, são atendidos só 2,2% daqueles que estariam motivados a parar de fumar. Fabiana Reis Ninov, bióloga e coordenadora do Programa Municipal de Controle do Tabagismo, afirma que todos os postos de saúde de Porto Alegre são obrigados a ter o serviço, mas devido à falta na remessa de antidepressivos e adesivos de nicotina do Ministério da Saúde, desde o ano passado, a metade das unidades teve de suspender o atendimento. Ela estima que, de todos os que desejam parar de fumar, só 3% conseguem efetivamente. "É uma droga legalizada e silenciosa, mais devastadora e que mata muito mais do que todas as outras. Quem usa não faz ideia de que é um drogado. A nicotina ativa neurotransmissores cerebrais que nunca mais são desativados."

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