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Flávio Dino em março de 2023
O nome de Flávio Dino para ocupar uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) deve passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado nesta quarta-feira (13)| Foto: EFE/ Isaac Fontana

A indicação de Flávio Dino para o Supremo Tribunal Federal (STF) foi aprovada pelo Plenário do Senado em 13 de dezembro de 2023, em votação secreta, e nesta quinta-feira (22) ele assume a cadeira deixada pela ex-ministra Rosa Weber. Já na época de sua indicação, no ano passado, especialistas alertavam que sua chegada ao STF poderia representar um risco à livre manifestação de pensamento no Brasil. “Não só à livre manifestação, mas à democracia em si”, alertou a advogada e ex-deputada estadual por São Paulo, Janaína Paschoal.

Em 2023, à frente do Ministério da Justiça, Dino processou influenciadores e parlamentares da oposição por questionamentos, falou diversas vezes da sua intenção de regular o uso da internet para conter discursos considerados por ele “antidemocráticos” e bloqueia figuras públicas nas redes sociais para que não tenham acesso a informações sobre ele. “Eu mesma, sequer o seguia e fui bloqueada”, afirma Janaina, que descobriu o fato em março de 2023.

Dino também defende punições severas para quem organizar ou financiar o que o governo chama de “movimentos contra a democracia” e já apresentou ao presidente Lula um projeto com penas que variam de seis a 20 anos de prisão para organizadores e financiadores dessas manifestações. “Deveria se chamar 'pacote da ditadura da esquerda e do Judiciário'”, criticou o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ).

Além disso, o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública já se apresentou abertamente como comunista, em referência a uma ideologia que matou de fome, espancamentos ou por trabalho excessivo milhões de pessoas, e ficou conhecida no mundo pela censura às liberdades de expressão, de imprensa e religiosa.

“Tanto que todos os exemplos históricos de nações comunistas são de ditaduras, nas quais o indivíduo sequer pode contestar o regime sob o qual vive”, pontua o jurista Fabricio Rebelo, ao citar ainda que Flávio Dino já foi enfático ao dizer que “a liberdade de expressão como valor absoluto acabou no Brasil".

Confira a lista com 10 motivos que tornam Flávio Dino um risco ao livre pensamento no país.

1. Flavio Dino defende regulação da internet para conter “discursos de ódio e antidemocráticos”

Em janeiro de 2023, o então ministro entregou ao presidente Lula o chamado “Pacote da Democracia”, que propôs punições para o que for considerado um crime contra o Estado Democrático de Direito e incluiu a regulação das redes sociais e da internet, criminalizando conteúdos considerados como “antidemocráticos”.

Ele também afirmou durante o Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), em julho, que é preciso regulamentar as redes sociais porque as plataformas são usadas para divulgação de “ideias da direita e do poder econômico”.

Segundo especialistas, as propostas apoiadas por Dino podem ser usadas para silenciar vozes contrárias ao governo, indo na contramão das regulações implementadas em democracias.

2. Dino é um dos principais apoiadores da Lei de Combate às “Fake News”, que limita a liberdade de expressão nas redes sociais 

Flávio Dino defendeu o chamado PL das Fake News, também apelidado como PL da Censura. O texto, que acabou não sendo votado e depois foi fatiado, recebeu críticas pelo seu poder de provocar autocensura nas redes e não ter sido debatido amplamente com a sociedade.

Em agosto, durante audiência realizada pela Comissão de Comunicação e Direito Digital do Senado, Flavio Dino elogiou o projeto de lei, pedindo celeridade na sua votação.

3. Como ministro, cerceou a opinião do Google a respeito da Lei das Fake News

Em maio de 2023, o Ministério da Justiça liderado por Flávio Dino anunciou medida cautelar contra o Google, depois que a empresa de tecnologia divulgou um texto criticando o PL das Fake News.

O conteúdo havia sido publicado no blog oficial da empresa e explicava que a aprovação do projeto poderia prejudicar a liberdade de expressão, favorecer produtores de notícias falsas e colocar em risco a distribuição de conteúdo gratuito pela internet.

O governo — por meio do Ministério da Justiça e da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) — determinou multa no valor de R$ 1 milhão por hora em caso de descumprimento da medida cautelar por parte do Google. Logo após a notificação, o texto foi retirado do ar.

4. Em reunião com representantes das Big Techs, Flávio Dino ameaçou empresas que não mudassem seus “termos de uso”

O jornal Metrópoles divulgou vídeo de uma reunião realizada em abril entre Flávio Dino e representantes do Twitter, Meta, TikTok, Kwai, WhatsApp, Google e YouTube em que o ministro impôs mudanças nas regras de monitoramento de conteúdo. “Se os senhores não mudarem os termos de uso, os senhores vão ser obrigados”, afirmou Dino.

“Na gramática do Ministério da Justiça e da Polícia Federal, que eu comando, não existe a expressão ‘termos de uso’”, continuou. Então, “quem se opuser a essa ideia de colaboração, está se expondo para que adotemos as providências”, afirmou, citando ainda que as Big Techs poderiam ser investigadas pela Polícia Federal e se tornar “réus”.

“Seria constrangedor para nós ter que recorrer a mecanismos coercitivos”, pontuou. Na época, a reunião tratava de postagens de usuários das redes sociais em referência a ataques em escolas.

5. Flávio Dino falou que “o tempo de liberdade de expressão acabou no Brasil, foi sepultado”.  

Na mesma reunião com representantes das maiores redes sociais do país, o então ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, afirmou que acabou “o tempo da autorregulação no Brasil, da ausência de regulação e da liberdade de expressão como valor absoluto”. Segundo ele, esses termos foram “sepultados”. O ministro disse ainda que a liberdade de expressão, na verdade, seria uma “falcatrua”.

Diante dessas afirmações, o jurista Fabricio Rebelo garante que dificilmente se encontrará nome que traga mais risco à liberdade de expressão do que o do atual ministro da Justiça e que “os tempos vindouros tendem a ser mais sombrios se essa postura for transferida para sua atuação judicial”.

6. Disse que o “processo eleitoral de 2022 foi a referência”

No vídeo da reunião entre Flávio Dino e representantes das Big Techs, o ministro da justiça ainda citou o processo eleitoral de 2022 no Brasil como “referência” para tratamento às informações no Brasil. “É o que faremos com os senhores, tenham clareza disso”, pontuou o ministro.

No período citado por ele, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) passou a criminalizar conteúdos considerados pelos ministros da Corte como “desinformação”, principalmente em relação ao pleito eleitoral, e tanto cidadãos como autoridades políticas tiveram suas contas das redes sociais derrubadas.

Além disso, jornalistas como Guilherme Fiuza, Paulo Figueiredo e Rodrigo Constantino também foram alvos das ações por ordem do ministro Alexandre de Moraes após críticas ao processo eleitoral. Os advogados ainda tiveram dificuldade para acessar os autos e ter amplo direito à defesa, já que os documentos estavam sob sigilo.

Até reportagens e postagens publicadas por veículos de comunicação foram retiradas do ar, como ocorreu com a Gazeta do Povo ao noticiar o apoio dado por Lula ao presidente Daniel Ortega, que governa a Nicarágua desde 2007 e persegue opositores.

7. Dino processou Monark por ser chamado de “gordola”

O ex-ministro da justiça processou o influenciador Bruno Monteiro Aiub, conhecido como Monark, por calúnia, difamação e crime contra a honra após ofensas por sua condição de obesidade durante uma live realizada em maio deste ano pela plataforma Rumble.

Na época, Monark teria se referido a Dino com palavras como “gordola”, e o ministro se manifestou pelo Twitter a respeito do caso. “Quanto aos criminosos que ofendem a minha honra, confio no Poder Judiciário, a quem entrego tais casos”, escreveu em suas redes.

Depois da postagem, Flávio Dino encaminhou uma queixa-crime contra o influenciador, que foi validada pela Justiça Federal de São Paulo em setembro. Monark chamou o caso de “perseguição política”.

8. Dino bloqueia jornalistas e parlamentares de oposição nas redes sociais

“Flávio Dino não gosta de ser questionado ou contrariado, um comportamento que não é condizente com uma autoridade pública, especialmente na Corte mais elevada da Justiça Nacional”, afirma a advogada e ex-deputada estadual por São Paulo, Janaína Paschoal, que foi uma das figuras públicas bloqueadas por Dino nas redes.

Para o deputado federal Marcel van Hattem (Novo-RS), a atitude de bloquear opositores em plataformas como Twitter contraria o princípio da transparência das autoridades públicas. “Ao negar à oposição a possibilidade de saber o que ele diz no seu Twitter [agora X], demonstra que tem aversão à atuação da oposição e, como ministro do STF, isso, sem dúvida, tende a se acentuar”, afirma o parlamentar.

9. Flávio Dino processou o ex-deputado Deltan Dallagnol por questionamentos

O ex-ministro da Justiça também já processou parlamentares como o ex-deputado federal Deltan Dallagnol por questionamentos. “Fui processado por Dino no STF, que pediu ao ministro Alexandre de Moraes que me incluísse no inquérito das fake news depois de eu ter questionado como Dino entrou no Complexo da Maré sem fazer um acordo com o crime organizado”, afirma Dallagnol, pontuando também que o ministro da Justiça e Segurança Pública é “ativo para iniciar investigações contra adversários políticos”.

10. Dino afirma ser “comunista, graças a Deus”, referindo-se a uma ideologia contrária à liberdade de expressão

Durante programa gravado pelo canal independente de jornalismo MyNews, em 2019, quando Flávio Dino ainda era governador do Maranhão, ele afirmou ser “comunista, graças a Deus”. Durante a entrevista, disse que há bilhões de comunistas na China e citou uma frase do ditador chinês Xi Junping.

No entanto, ao ser questionado sobre países comunistas como a China, uma ditadura sem Judiciário independente, Flávio Dino afirmou não saber como é o regime chinês. “Realmente não conheço”, respondeu, ao pontuar que o Judiciário no Brasil não é independente e que ele defendia “a não partidarização do Judiciário, como aconteceu no Brasil”.

Durante a entrevista, Dino afirmou ainda que o estado comunista tem papel de “regulação” e que o nome comunismo é “bonito” e “poético”, afirmando que “comunismo é comunhão”. No entanto, a história mostra que essa ideologia matou milhões de pessoas — mais que o Holocausto — em regimes como o soviético de Stalin e o chinês de Mao Tsé-Tung, além de censurar as liberdades de imprensa, de expressão e a liberdade religiosa.

“É extremamente problemático que um indicado ao STF, responsável por proteger direitos fundamentais dos cidadãos — como a vida, a liberdade, a propriedade privada e a liberdade de expressão e de imprensa — se diga um orgulhoso comunista”, alerta o ex-deputado Deltan Dallagnol. “Uma ideologia que simplesmente não aceita a livre manifestação do pensamento”, completa o jurista Fabricio Rebelo.

Atualização

Esta reportagem foi publicada em dezembro de 2023, quando os senadores ainda estavam decidindo sobre a indicação de Dino ao STF. Em fevereiro, a matéria foi atualizada para incluir as informações da posse. O conteúdo das entrevistas e citações permanece o mesmo, sendo apenas atualizadas menções a datas e cargos.

Atualizado em 22/02/2024 às 08:49
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