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Operação de resgate dos restos do avião: caixas-pretas, fundamentais para a investigação, nunca foram encontradas | Reuters
Operação de resgate dos restos do avião: caixas-pretas, fundamentais para a investigação, nunca foram encontradas| Foto: Reuters

Em 3 de dezembro de 2009, ao registrar os direitos autorais sobre uma nova tecnologia de segurança em um escritório de patentes dos Estados Unidos, a construtora francesa Airbus escreveu que falhas naquele sistema "poderiam ter consequências catastróficas". O mecanismo criado era um sistema capaz de detectar e evitar erros de aferição da velocidade de suas aeronaves.

A falha cujo potencial "catastrófico" a Airbus reconhece é a mesma verificada nas mensagens automáticas enviadas pelo A330 de prefixo F-GZCP da Air France que, há 365 dias, fazia o voo 447 (Rio-Paris), até desaparecer no Oceano Atlântico A queda que matou 228 passageiros e tripulantes completa nesta segunda-feira um ano. Nesse período, mais suspeitas do que certezas restaram do desastre, que a revista alemã Der Spiegel classificou como "um dos mais misteriosos da história da aviação". Após o fracasso das buscas, a Air France e, sobretudo, o Escritório de Investigação e Análises para a Aviação Civil (BEA), órgão do governo francês responsável pela investigação, entraram no centro das críticas de experts independentes, de pilotos e das famílias de vítimas.

Anteriormente acima de qualquer suspeita, o BEA agora é francamente contestado na França, em especial por desautorizar toda análise que não a própria sobre a tragédia, por liberar a conta-gotas informações à opinião pública e, sobretudo, por negar o papel que a comprovada falha da sondas pitot, os sensores responsáveis pe­­la aferição de velocidade, teriam tido no acidente.

Transcorrido um ano, pouco se pode afirmar sobre o que levou o Airbus a desabar de 11 mil metros de altitude. A aeronave não se destruiu em pleno ar nem se chocou verticalmente no oceano, mas em posição horizontal, com o bico apontado para cima em ângulo de 5 graus, como se, em um último esforço para evitar o impacto, tentasse uma amerissagem. Não houve despressurização – como provam as máscaras de oxigênio, intactas – nem alerta de emergência, pois as aeromoças estavam em seus assentos e os coletes salva-vidas, intocados.

Outra certeza: a 4 minutos da queda, os sensores de velocidade falharam, causando o desligamento em cadeia dos sistemas de navegação. Essa falha, que a Airbus admitiu em documentos internos, teria sido, para experts independentes da França, determinante. "As mensagens automáticas indicam 24 falhas que exigiriam da tripulação a adoção de 13 procedimentos de emergência num intervalo curtíssimo", explicou o ex-comandante de A330 Henri Marnet-Cornus, um dos autores de duas investigações paralelas sobre o acidente, cujos relatórios já totalizam 600 páginas.

As constatações de Marnet-Cornus e de Gérard Arnoux, também comandante de Airbus e presidente do sindicato União Francesa de Pilotos de Linha, são a mais forte contestação contra o BEA. Para eles, como para dezenas de pilotos comerciais da própria Air France, não há dúvidas: o congelamento dos pitots está na origem de uma sequência de falhas eletrônicas que forçaram o capitão da aeronave, Marc Dubois, ou o co-piloto, Pierre-Cédric Bonin, a tomar decisões de urgência, potencialmente erradas. "Mas há um lobby extremo do BEA e da Airbus para que não saibamos jamais o que aconteceu", previne Marnet-Cornus.

Financiado pelo Estado francês, acionista da Airbus e da Air France, o BEA sabe estar no centro das suspeitas. Desde o acidente no Atlântico, um diretor, Paul-Louis Arslanian, outrora fiador da credibilidade do escritório, acabou aposentado.

Caixas-pretas

O caso se tornou um problema dentro do governo francês. Trezentos e trinta dias já haviam passado quando o Ministério da Defesa anunciou que a Marinha havia localizado o sinal das caixas-pretas do voo 447. Com menos de uma semana de procura, porém, o diretor Jean-Paul Troadec informou à imprensa o abandono das buscas – que via anteriormente com otimismo –, com base no argumento de que "a probabilidade de encontrar os destroços é relativamente baixa".

Peritos das Forças Armadas, conforme o jornal Le Figaro, estão insatisfeitos com o menosprezo demonstrado pelo escritório em relação à informação colhida em alto-mar. E o episódio serviu para reforçar as teses conspiratórias de quem desconfia do trabalho dos investigadores, em especial porque não localizá-las significa, se­­gundo os próprios peritos do escritório, não descobrir jamais as causas do acidente.

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