Pura malandragem
Entenda como as multas de trânsito eram canceladas ilegalmente:
1 O agente de trânsito provocava uma rasura em multas corretas, impedindo o registro no sistema. Um número "3" podia se transformar em "8", por exemplo. Datas dos autos também apareciam anotadas incorretamente.
2 De forma misteriosa, várias multas foram canceladas apenas com o carimbo de invalidação, sem aval e assinatura do agente de trânsito que aplicou o auto e sem descrição do motivo real.
3 Autos eram "segurados" por agentes ou funcionários internos da CMTU e perdiam a validade após vencido o prazo legal para inserção no sistema.
Reação
Presidente da CMTU vai requisitar auditoria externa
O presidente da CMTU, Octávio Cesário Neto, vai requisitar a contratação de uma auditoria particular ao prefeito José Ribeiro para investigar todas as multas ilegalmente canceladas a partir de fraudes provocadas. Hoje, anuncia as medidas contra os envolvidos, que podem ser demitidos da CMTU, serem suspensos, advertidos ou terem de enfrentar nova sindicância.
"Pelo volume de casos levantados vou ao prefeito pedir a contratação de uma empresa. Não temos como fazer o levantamento com o nosso pessoal." O presidente da companhia considerou que a sindicância descobriu fraudes por amostragem e que as revelações representam "apenas um extrato do que existe nos demais casos de cancelamento irregular". (MF)
Outro lado
Rogério Duque, funcionário da CMTU acusado de pressionar para cancelar indevidamente uma multa aplicada à esposa flagrada em excesso de velocidade, não quis se pronunciar sobre o pedido de demissão: "Não gosto de falar sobre isso e é um assunto interno que me incomoda. Não tenho nada a contribuir sobre isso", disse. Maria do Socorro, ex-coordenadora dos agentes, alegou que não foi informada sobre a sindicância e desligou o telefone. Maurício Teixeira dos Anjos, coordenador do Cidade Limpa, não retornou as ligações da reportagem.
A sindicância interna aberta em fevereiro para apurar o cancelamento irregular de multas na Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização (CMTU) de Londrina revelou que 23% das 15 mil infrações de trânsito canceladas por agentes municipais nos últimos cinco anos foram anuladas de forma ilegal. Ao todo, são 3,5 mil multas extintas com indícios de fraude nesse período, como rasuras e erros provocados que levaram ao cancelamento inevitável. Nas investigações, que apuraram as irregularidades, foram selecionados aleatoriamente 250 autos e comprovadas irregularidades em 148.
A investigação final recomenda ainda a demissão sumária do atual diretor de trânsito da CMTU, Wilson de Jesus, de uma funcionária do setor de processamento de autos, de uma advogada da procuradoria jurídica e pelo menos de três funcionários de carreira ligados à direção da companhia Maurício Teixeira (coordenador de fiscalização do Cidade Limpa), Rogério Duque de Oliveira (lotado no setor administrativo) e Maria do Socorro (ex-coordenadora dos agentes). O grupo faz parte do rol de quase 50 funcionários, ex-funcionários e cargos comissionados suspeitos de envolvimento em cancelamentos ilegais de multas de trânsito.
Razões
A sindicância concluiu que Wilson de Jesus deve ser demitido por quatro motivos: beneficiar-se de uma multa cancelada sem motivos expressos após ter o próprio veículo autuado em 2008, quando era diretor de transportes da CMTU; por conhecer notícias sobre cancelamento de multas de forma ilegal desde maio de 2011 sem que abrisse qualquer investigação após informado por circular interna escrita por Maria do Socorro (então coordenadora dos agentes); por produzir documento com dado supostamente falso informando que na Avenida Santos Dumont não havia marcas de proibição de estacionamento quando o servidor Maurício Teixeira teve veículo multado (cujo auto foi anulado também sem motivos) e, por fim, após validar cancelamentos de multas reconhecidamente fraudados, sem checagem de preenchimentos, erros e problemas causados pelos agentes.
Wilson de Jesus teria incorrido "em falta grave, passível de destituição da função de diretor, além de demissão por justa causa". A sindicância apontou a facilidade com que autos válidos desapareciam, eram rasurados e cancelados. Segundo a conclusão, o diretor de trânsito é o responsável pela organização, coordenação e supervisão do sistema de emissão e processamento de multas e que cabia a ele, assim como a ex-diretores, controlar e acompanhar os autos cancelados.
Diretor afirma que mandou investigar
O diretor de trânsito da CMTU, Wilson de Jesus, afirmou ontem que não se sente responsável pelos cancelamentos irregulares de multas do seu período (desde março de 2010) e afirmou esperar ser lembrado "por trazer à tona" e determinar a abertura de investigação sobre o caso. Ele reputou o descontrole no setor de trânsito, caracterizado pela sindicância, a uma "fragilidade permanente nos controles" de multas e cancelamentos, que ocorre desde anos anteriores. "Isso acabou. Com a multa eletrônica, os problemas foram totalmente eliminados", garante. "Fui o primeiro a se importar com isso e achamos uma solução. É fato."
Apesar de afirmar ter determinado ainda em 2011 a investigação de suspeitas de multas canceladas indevidamente, Wilson de Jesus não soube detalhar o resultado da suposta apuração que atesta ter sido aberta logo após as primeiras denúncias comunicadas a ele. A ex-coordenadora dos agentes, Maria do Socorro, pediu providências sobre multas canceladas de forma misteriosa, após os agentes reclamarem que as aplicaram legitimamente, mas apareciam com carimbo de cancelamento.
Defesa
Com base em depoimentos ao Ministério Público, a sindicância concluiu que o diretor, uma advogada da procuradoria e o ex-presidente da CMTU, André Nadai, não realizaram as investigações, embora tenham decidido pela sindicância ser aberta. "Mandei investigar mas não chequei o resultado. O objetivo nunca foi esconder nada", alegou.
Wilson de Jesus assegurou ter sido multado em 2008, quando diretor de transportes e sustenta que a multa foi paga já a sindicância aponta a existência do cancelamento do auto, sem motivos, por um agente. Negou também ter produzido informação falsa para ajudar na defesa de outro funcionário implicado no caso.
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