Levantamento alerta ainda para a persistência do trabalho infantil no país: fator seria “causa significativa” do abandono escolar de crianças e jovens| Foto: Albari Rosa/ Gazeta do Povo

638 mil jovens de 5 a 14 anos trabalham

O relatório divulgado ontem pelo Unicef alerta para a persistência do trabalho infantil entre as crianças, o que prejudica o direito dessa população à educação. De acordo com o levantamento, 638 mil pessoas entre 5 e 14 anos estão nessa situação, apesar de a legislação brasileira proibir o trabalho para menores de 16 anos. O grupo representa 1,3% da população nessa faixa etária, mas para o Unicef ele não pode ser desconsiderado porque o trabalho infantil é uma "causa significativa" do abandono escolar.

O levantamento do Unicef inclui tanto crianças e jovens que desenvolvem atividades econômicas, quanto aqueles que se ocupam de serviços domésticos com duração superior a 28 horas semanais.

A coordenadora do Pro­grama de Educação do Unicef no Brasil, Maria de Salete Silva, diz que o momento econômico que o país vive tem feito crescer o número de meninos e meninas responsáveis pelas tarefas do lar. "Quando temos uma situação de oferta de emprego grande, isso pode acarretar aumento do trabalho infantil doméstico para as meninas, que substituem a mãe que foi para o mercado de trabalho", explica.

Do total de crianças de 5 a 14 anos que trabalham, 93% estudam. O relatório mostra o trabalho infantil como uma grande barreira tanto para as crianças que estão fora do sistema de ensino, quanto para aquelas que frequentam a escola. Mesmo quem está regularmente matriculado terá o desempenho escolar prejudicado pelas outras tarefas que desempenha.

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"O trabalho agora é localizar essas famílias e entender o que leva aquela criança a trabalhar e o que pode ser feito para convencer a família de que aquele trabalho não é adequado."

Maria de Salete Silva, coordenadora do Programa de Educação do Unicef no Brasil.

O Brasil tem cerca de 3,7 milhões de crianças e adolescentes entre 4 e 17 anos fora da escola, de acordo com o relatório Todas as Crianças na Escola em 2015 – Iniciativa Global pelas Crianças Fora da Escola, divulgado ontem pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). A maior defasagem é na pré-escola e no ensino médio. Entre as crianças de 4 e 5 anos (idade pré-escolar), o número chega a 1,4 milhão. O levantamento mostrou ainda que nessa faixa etária a maioria dos não matriculados nos sistemas de ensino é negra – 56% do total. As informações são da Agência Brasil.

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A renda também é um fator que influencia o acesso à educação. Enquanto 32% das crianças de famílias com renda familiar per capita de até um quarto do salário mínimo (R$ 155,50, em valores atuais) estão fora da escola, apenas 6,9% daquelas oriundas de famílias com renda superior a 2 salários mínimos por pessoa estão na mesma situação.

Os números indicam que a frequência ainda insuficiente de crianças de 4 e 5 anos está relacionada, muitas vezes, à falta de vagas na rede pública. Por isso, no grupo com renda um pouco maior, o porcentual de crianças fora da escola é menor, já que nesse caso a família acaba optando por pagar uma escola particular.

Para Maria de Salete Silva, coordenadora do Programa de Educação do Unicef no Brasil, outro grande desafio está "na outra ponta" da educação básica. O relatório diz que 1.539.811 adolescentes entre 15 e 17 anos estão fora da escola. Nesse caso, os problemas de frequência não estão relacionados à falta de vagas, mas ao desinteresse da população nessa faixa etária pelo ensino médio.

Para Salete, os investimentos do governo no setor precisam aumentar. "Nós temos problemas sérios de gestão, mas só com os recursos que temos hoje não conseguimos fazer tudo o que é necessário: incluir todos na escola, ter qualidade, professor bem-remunerado e capacitado, escola com boa infraestrutura", disse.

Avanços

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Segundo o secretário de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC), César Callegari, o estudo do Unicef traz uma fotografia importante dos desafios que o Brasil tem pela frente. Ele ressaltou, no entanto, que o país conquistou avanços significativos.

"Se olharmos não apenas a fotografia, mas o filme dos últimos anos, veremos que o Brasil conseguiu incluir mais de 5 milhões de crianças e jovens que estavam fora da escola. Tínhamos 8,7 milhões, entre 4 e 17 anos, nessa situação em 1997 e agora são 3,7 milhões", disse. Ele citou a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Edu­cação Básica (Fundeb) como um dos mecanismos para esse avanço, ao viabilizar "recursos firmes e mensais" para que cada município e estado garanta as matrículas escolares.