Raquel, com a filha Valentina: avanços após a creche são facilmente percebidos.| Foto: Walter Alves/Gazeta do Povo

Uma nova atitude após a escolinha

A professora Raquel Terezinha Zanon Belniaki, 36 anos, só tem elogios para a creche em que a filha Valentina, de 3 anos (foto), está matriculada. Residente em Araucária, na Região Metropolitana de Curitiba, Valentina frequenta desde os 2 anos de idade o Centro Municipal de Educação Infantil Jardim do Conhecimento. Segundo Raquel, desde o ingresso da filha na creche, os avanços no comportamento da menina são facilmente percebidos. "Ela conta histórias com começo, meio e fim, a memória melhorou e nossas conversas ficaram mais ricas em conteúdo", conta. Valentina fica meio período na creche todos os dias, enquanto Raquel trabalha numa escola municipal da cidade.

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Filho em casa exige rotina organizada -Silvia Francieli de Assis Martins, 30 anos, optou por não matricular o filho Artur, de 1 ano e 4 meses (foto), em uma escola de educação infantil. Ela e o marido fizeram uma programação financeira que lhe permitisse não trabalhar fora durante os primeiros anos de vida do menino. Silvia presta consultoria na área de segurança do trabalho, e exerce suas atividades profissionais de dentro da própria casa.

Somente 30,8% das crianças brasileiras de zero a 4 anos frequentam creches ou pré-escola. Em Curitiba, o número de meninos e meninas nessa faixa etária é de cerca de 222 mil, mas 65,3% deles estão fora da sala de aula. Os números são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), publicada em setembro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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O atraso na área fica evidente quando o Brasil é comparado com nações desenvolvidas. Entre os países membros da Organização para a Cooperação e o Desen­vol­vimento Econômico (OCDE), em sua maioria europeus, a porcentagem de crianças com 4 anos na pré-escola é de 81%. Considerando apenas essa idade, o índice brasileiro não passa de 55%, segundo a própria OCDE.

Nas últimas décadas, pesquisas dedicadas à primeira infância constataram que é nessa fase da vida que o ser humano tem o maior potencial de aprendizagem. As consequências do desenvolvimento infantil são percebidas até a idade adulta. Crianças que não recebem os estímulos necessários para a compreensão de linguagens, desenvolvimento motor e sociabilidade, entre outras habilidades, acabam tendo dificuldades em acompanhar os colegas quando chegam ao ensino fundamental.

Embora especialistas reconheçam que é possível oferecer os estímulos necessários a crianças de até 3 anos em casa, o ambiente ideal para um desenvolvimento saudável exige uma série de fatores não muito comuns à maioria dos lares, como um adulto devidamente instruído para oferecer experiências construtivas, espaço amplo, atividades ao ar livre, contato com outras crianças e grupos sociais livres de violência.

A preocupação tardia do país com a instrução na primeira infância é uma das causas para a dificuldade do poder público em suprir a demanda na área. Segundo a professora do curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) Neide Capeletti, até a década de 80 a educação infantil era vista como uma atividade vinculada à assistência social e não propriamente à educação. "A maioria das creches era mantida por instituições de caridade e as poucas escolas infantis privadas eram voltadas às famílias mais ricas", diz.

Ela explica que somente após a Constituição de 1988 é que se passou a entender a educação infantil como responsabilidade do Estado. Ainda assim, as redes de creches municipais só se popularizaram depois da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996.

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Para o pesquisador Fran­cisco Veloso, do Instituto Brasileiro de Economia, vinculado à Fundação Getulio Vargas, a lenta evolução do atendimento público no setor se deve também à ineficiência do poder municipal. "Muitos municípios não têm a menor condição financeira ou de gestão para administrar a educação infantil, por isso muitas creches são feitas via convênios com empresas", diz.

Universalização

Para o país cumprir a meta estabelecida pelo Plano Nacional de Educação (matricular todas as crianças de 4 e 5 anos na rede pré-escolar, seja pública ou privada, até 2016), o governo federal têm previstos investimentos no setor para auxiliar os municípios. Em agosto foi anunciada a intenção de se construir 6 mil novas escolas de educação infantil até 2014. Dessas, cerca de 3 mil já estariam com os projetos aprovados.

Investimento no futuro

Estímulos nos primeiros anos de vida fazem toda a diferença

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A forma como a educação infantil passou a ser vista pelo poder público se deve muito à pesquisa do professor norte-americano James Heckman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2000. Segundo ele, é a partir dos 3 anos de idade que começam a surgir as características pessoais decisivas para um bom desempenho na vida social, possibilitando, inclusive, ascensão econômica. "Baseado em projetos desenvolvidos nos Estados Unidos, Heckman constatou que cada dólar investido na educação da primeira infância deu um retorno de nove dólares para a sociedade", explica o doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) João Malheiro.

Eduardo Queiroz, diretor-presidente da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, especializada em pesquisas sobre a primeira infância, também atribui a Heckman parte da relevância que o tema ganhou. O grau de detalhamento dessas pesquisas chega a mostrar que crianças devidamente estimuladas na primeira infância têm menos chances de abandonar a escola quando chegam ao ensino médio, e tendem a ter salários 36% maiores do que aqueles que não receberam suficiente atenção até os 4 anos.

Para a psicopedagoga e professora da PUCPR Maria Sílvia Bacila Winkler, a educação infantil é o melhor investimento que os pais podem fazer entre todos os ciclos da educação. "Esses seis primeiros anos de vida são a base de todas as outras aprendizagens", afirma.