Ponta Grossa – O asfalto está cobrindo parte do velho Caminho do Cerne, mas vai terminar quase 50 quilômetros antes da pequena mercearia de Romoaldo Bruschetta, de 69 anos, no Herval do Xaxim, uma das comunidades que surgiram nos últimos 56 anos no trecho entre Campo Magro e Piraí do Sul. A pavimentação, ainda que não chegue até a sua comunidade, é um alento para o velho italiano, que um dia espera ver em frente ao seu comércio o "tapete preto", cobrindo o pó e a inércia que tomam cota da comunidade desde a década de 70, quando o Cerne deixou de ser o principal corredor econômico do estado.

CARREGANDO :)

A pavimentação do Cerne começou em fevereiro deste ano, depois de inúmeras promessas ouvidas por Bruschetta e cerca de 15 mil pessoas que vivem no percurso de 130 quilômetros. Numa parceria entre o governo do estado e o 10.º Batalhão de Engenharia e Construção de Lajes (SC), do Exército Brasileiro, a obra deve ser concluída no primeiro semestre de 2007. A primeira fase abrangerá os 16 primeiros quilômetros da estrada, que começa em Campo Magro, e terá um custo de R$ 8,7 milhões. Os 114 quilômetros restantes, depois de Bateias, na região de Campo Largo, dependerão da aprovação do orçamento de 2007. Segundo o diretor do Departamento de Estradas e Rodagens (DER), Rogério Tizzot, estão previstos R$ 30 milhões para a continuidade das obras.

Passado

Publicidade

O Cerne teve o seu auge na década de 50, quando foi a principal ligação entre a capital e o Norte do estado, que começava a despontar como região produtora de café. A abertura da estrada foi a principal obra do governo do estado, na década de 30. Com 480 quilômetros, ela partia de Curitiba, passava por Campo Magro e, em Piraí do Sul, fazia uma bifurcação com um ramal seguindo para Jaguariaíva e outro para Londrina. Hoje, ela se estende até Porto Capim, na divisa com São Paulo. Por 20 anos, foi o principal corredor agrícola paranaense. Foi quando os povoados ao longo da rodovia sentiram o gosto do progresso, mas acabaram isolados com a inauguração da BR-376, na década de 70. Desde então, a esperança da volta aos bons tempos ficou nas várias promessas de pavimentação do Cerne.

O asfalto ainda será sonho para Zilda Zen de Souza, de 73 anos, moradora do Abapã, distrito de Castro, e órfã do progresso que um dia a estrada levou. A comunidade não foi contemplada na primeira etapa da obra. A antiga fachada, as mesas vazias e o velho balcão de atendimento do restaurante dela denunciam a estagnação que tomou conta do lugar. Há 50 anos Zilda mantém o estabelecimento, o mesmo tempo que ouve histórias da pavimentação. "Já esperei o que chega, o suficiente para não acreditar em mais nada", diz.

Esperança

A opinião dela é a mesma de 2003, quando a reportagem da Gazeta do Povo percorreu os 130 quilômetros de poeira do Cerne, entre Piraí do Sul e Campo Magro. Na época, a pavimentação da estrada era uma promessa do governador recém-eleito Roberto Requião. Romoaldo Bruschetta e sua esposa Antonieta diziam-se esperançosos com o futuro. O sonho do casal era um dia ver o asfalto passar em frente à mercearia. Três anos depois, muita coisa mudou no Abapã. A comunidade ganhou dois médicos, dois dentistas e uma ambulância. A madeira passou a ser a base da economia local - no lugar do calcário -; Zilda ficou viúva e Bruschetta também. Mas a poeira que vem da estrada de chão ainda permanece lá. Assim como a esperança de dias melhores.