Se dependesse exclusivamente dos curitibanos, o Brasil teria um novo referendo sobre o comércio de armas de fogo. Segundo levantamento do Instituto Paraná Pesquisas, feito com exclusividade para a Gazeta do Povo, 67% dos entrevistados são favoráveis a um novo debate para discutir o desarmamento no país e 68% acham que a comercialização deve ser proibida. A opinião é completamente oposta ao resultado da consulta popular feita em 2005, quando 73% dos votantes no estado foram contrários ao desarmamento. A mudança de posicionamento, segundo especialistas, sofre influência da chacina ocorrida em Realengo, no Rio de Janeiro, no último dia 7.
O assunto foi colocado novamente em pauta em Brasília após a morte de 12 estudantes da Escola Tasso da Silveira. O presidente do Senado, José Sarney, defendeu abertamente a revogação do atual Estatuto do Desarmamento e o lançamento de um novo referendo no país.
Oito em cada dez curitibanos entrevistados pelo Paraná Pesquisas afirmam que o número de homicídios no Brasil está diretamente relacionado à quantidade de armas legais e ilegais em circulação. Além disso, 69% acham que somente as autoridades policiais devem ter direito de portar uma arma e, para apenas 25%, o cidadão está mais seguro com este tipo de objeto.
O resultado mostra que a questão do desarmamento no Brasil é uma discussão conflituosa. Isso porque envolve, de um lado, uma poderosa indústria bélica existente no país e, por outro, a falsa ideia de que a questão da segurança pública será resolvida apenas com a restrição do comércio de armas. Segundo alguns especialistas, a iniciativa de Sarney tenta dar uma resposta equivocada à opinião pública sobre a tragédia do Rio.
Para o sociólogo e professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná Lindomar Wessler Boneti, era possível antecipar uma mudança no comportamento da população em relação ao desarmamento. Nas discussões sobre o referendo em 2005 houve uma partidarização do debate. Com o passar dos anos e o recente abalo pela tragédia de Realengo, a tendência é a reprovação ao uso indiscriminado de armas de fogo. "Talvez agora haja um debate mais maduro." O sociólogo acredita que essa mudança poderá ser observada também em outras capitais do país.
O coordenador da ONG Viva Rio, Tião Santos, argumenta que em 2005 muitas informações falsas circularam como um possível golpe do governo e confundiram os votantes. "As pessoas diziam que não gostavam de armas e não queriam tê-las, apesar disso não queriam perder o direito de adquirir se quisessem."
Arsenal
A Viva Rio, uma das principais defensoras do desarmamento no Brasil, calcula que existam no país 17 milhões de armas, quase uma a cada dez habitantes. Dessas, 2,1 milhões estão com a polícia, 5,4 milhões são legais e 9,5 milhões são usadas sem porte e podem estar relacionadas à criminalidade. Os dados colocam o Brasil como o sexto do mundo em números absolutos e resultam na morte de 34 mil pessoas por ano.
Desde 2003, quando o Estatuto do Desarmamento entrou em vigor, o país conseguiu recolher voluntariamente 500 mil armas, mas cerca de 700 mil novas unidades entraram no mercado interno. Outra questão levantada por especialistas é a concentração de um arsenal em poder da Justiça. Hoje há 752 mil armas em 27 Tribunais de Justiça do Brasil, sem a proteção suficiente.
Apesar dos dados brasileiros, não há uma relação concreta entre fim do comércio de armas e segurança pública. Japão e Grã-Bretanha proibiram a venda e têm índices baixíssimos de homicídios. Estados Unidos e Suíça, no entanto, têm um alto porcentual de armas nas mãos de civis e também taxas baixas de homicídios.
Uma das vitórias atuais, segundo Tião Santos, é a possibilidade de se entregar armamentos sem identificação ao governo federal. Antes era preciso apresentar o CPF para receber a indenização, que hoje é feita por meio de cheque ao portador.
Mesmo com a possibilidade de um novo referendo em pauta, ele diz que a Viva Rio não concorda com a proposta. "Somos democráticos e sabemos que o referendo mostrou a vontade da sociedade, por isso seria prematura uma nova consulta. Apesar disso, lutamos pelo desarmamento", diz Santos.
Interatividade
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