Nove entre dez brasileiros temem ser vítimas de homicídio e assalto à mão armada ou ter a casa arrombada. A sensação de insegurança foi medida pelo Sistema de Indicadores de Percepção Social sobre Segurança Pública, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O estudo revela ainda que a polícia não aspira muita confiança na população.
"O dado é ruim para a sociedade brasileira porque afeta a qualidade de vida. Com medo, a população vive mal, estressada, ansiosa, mudando sua rotina de comportamento", analisa o ex-secretário de Segurança de Minas Gerais e coordenador do Centro de Pesquisa em Segurança Pública da PUC-MG, Luís Flavio Sapori. "Esse sentimento fundamenta as posturas de autoproteção dos indivíduos", diz.
Para a doutora em Psicologia Social e professora do mestrado em Psicologia da Universidade Tuiuti Denise de Camargo, os dados são tão alarmantes que a situação pode ser considerada quase uma patologia social. "Uma sociedade em que nove entre dez têm medo pode se dizer que é um medo muito acentuado. Quando chega a esse nível, já está interferindo na rotina das pessoas", analisa. Para ela, o temor das pessoas se deve aos casos conhecidos que ocorrem, desde os noticiados pela mídia até os observados no dia a dia. "Mesmo quem não sofreu dessa violência, do transtorno pós-traumático, acaba sendo afetado, porque está a todo momento acompanhando esse tipo de caso", diz.
Segundo o levantamento, na Região Sul, 70% da população tem medo de homicídios. No Nordeste, por outro lado, os números são mais elevados, com 86% afirmando ter muito medo de morrer por armas de fogo ou brancas. Na sequência, estão o Norte (79%), Sudeste (79%) e Centro-Oeste (75%).
Desconfiança
O resultado do levantamento, em parte, tem a ver com a falta de confiança da população nas Polícias Civil e Militar e nas Guardas Municipais, além da ineficiência dos serviços ofertados à comunidade, como atendimento de emergências, registro de queixas, abordagens policiais e rapidez na investigação de crimes.
Na avaliação de Sapori, é preciso "modernizar a polícia e rever os trabalhos de formação e de capacitação, além de combater a corrupção".
O ex-secretário de Minas diz ainda que a política de segurança municipal, estadual e federal precisa diminuir não só os índices de homicídios e assaltos à mão armada, mas de furtos e roubos no cotidiano. "Essa é a forma concreta de diminuir o sentimento de medo. É preciso haver ação planejada entre os governos e fazer com que as pessoas confiem nas polícias", afirma.
Para o ex-comandante da Polícia Militar de São Paulo Rui César Melo, o poder público precisa impor sua presença e não permitir a disseminação da impunidade. "A sensação de segurança vem a partir do momento em que a polícia faz melhor o seu trabalho, com mais presença, mais ostensividade", diz.
Para ele, a divulgação mais frequente de erros e de casos de corrupção em vez dos acertos, por parte da imprensa e outros meios, distorce a visão da população sobre a corporação. "Dentro do número de operações diárias, é um porcentual mínimo que não dá certo. Mas é isso que se lê, assiste e se ouve. Quantas vezes se vê falar bem da polícia? É muito raro", afirma.
Por esse motivo, as ocupações da polícia e do Exército em territórios até então dominados por traficantes no Rio de Janeiro, nas últimas semanas, tendem a apresentar resultados positivos na avaliação que a população faz da segurança pública.
O objetivo dos indicadores é verificar como a população avalia os serviços de utilidade pública e sugerir caminhos para algumas das demandas específicas percebidas com a pesquisa. Em se tratando de segurança pública, para transformar o panorama apresentado, segundo o estudo, o estado terá de trabalhar com eficiência e qualidade.
A reportagem procurou a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), vinculada ao Ministério da Justiça, e a Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) para comentar o assunto, mas nenhuma das instituições se manifestou.
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