A tragédia que vitimou 236 pessoas na Boate Kiss, em Santa Maria (RS), tem ecoado dentro e fora das casas noturnas de Curitiba. Enquanto o poder público, liderado pelo Corpo de Bombeiros, realiza vistorias rigorosas nos estabelecimentos (ao todo cinco casas foram interditadas nos últimos dias), empresários da noite tentam convencer os frequentadores de que não há motivo para alarde mesmo que, para isso, tenham de recorrer ao improviso.
Por duas noites, a Gazeta do Povo visitou nove bares e casas noturnas da capital. Por ser uma observação sem embasamento técnico, a reportagem optou por não atrelar os problemas aos nomes dos estabelecimentos. Apesar de os locais contarem com instrumentos básicos de prevenção, como extintores e saídas de emergência, a garantia de segurança ainda é relativa.
A principal deficiência encontrada foi a falta de placas de informação que indiquem de forma clara e visível os caminhos a seguir em caso de uma evacuação imprevista. Em alguns casos, há sinalização, mas a própria saída de emergência está parcialmente obstruída ou não identificada.
Problemas que são potencializados nas casas noturnas onde o acesso é feito por escadas e portas estreitas. Apesar de fornecer um ambiente diferenciado, os chamados "porões" exigem atenção redobrada do frequentador, devido ao espaço reduzido e a presença de colunas que podem dificultar a passagem.
Em uma das casas, um revestimento de espuma foi colocado ao redor e em cima do pequeno palco usado pela banda segundo a polícia gaúcha, a fumaça gerada na queima deste tipo de material, que é altamente inflamável, foi a responsável pela maioria das mortes na Boate Kiss.
Algumas divulgam dentro do estabelecimento mapas que mostram os ambientes da casa e as saídas de emergência. A apresentação, porém, muda de um local para o outro. Enquanto um determinado bar se limitou a colar nas paredes desenhos em preto e branco, quase invisíveis na iluminação restrita da pista de dança, em outro os mapas foram deixados nos espelhos dos banheiros. Em um estabelecimento, um desenho com as saídas de emergência e ações a tomar em casos de tumulto ou incêndio são passados de forma ininterrupta em telas de tevê e até um telão. Não há como saber, porém, se isso já era um procedimento padrão ou se foi adotado após a tragédia de Santa Maria.
Outro lado
O presidente da Associação Brasileira de Bares e Casas Noturnas do Paraná, Fabio Aguayo, defende que os empresários têm interesse em se regularizar, mas são reféns do processo burocrático para a emissão definitiva dos alvarás. Segundo ele, a grande maioria das casas de Curitiba já atende aos requisitos de segurança.
Maioria das casas funciona sem alvará em Londrina
Bruna Komarchesqui, correspondente em Londrina; Erick Gimenes, da Gazeta Maringá; e Alyne Lemes, especial para a Gazeta do Povo
A situação das casas noturnas no interior do estado não é muito diferente da de Curitiba e de outras cidades do país. Em Londrina, no Norte do estado, das 31 casas noturnas registradas no município, apenas 15 contam com documentação regularizada segundo a prefeitura. A maioria funciona sem alvará definitivo.
Para conseguir o documento, os estabelecimentos precisam cumprir as normas previstas no Plano de Segurança Contra Incêndio e Pânico, que estabelece medidas genéricas de iluminação, sinalização e saídas de emergência, além da existência de dispositivos como extintores.
Segundo o corpo de Bombeiros, as casas já foram notificadas e estão dentro do prazo para fazer as adequações. Caso as alterações solicitadas nas vistorias não sejam feitas em 60 dias, o caso é encaminhado para o Ministério Público e a Secretaria Municipal de Fazenda, para cassação do alvará.
A necessidade de adequações não parece ter mudado a rotina das casas noturnas que, na quinta-feira, funcionavam em clima de aparente normalidade. A reportagem visitou cinco estabelecimentos e, em um deles, com capacidade para 230 pessoas, não foram encontrados extintores. Além disso, a saída de emergência era a mesma porta estreita da entrada, que não abre a favor do fluxo.
Outro estabelecimento com música ao vivo, apesar de contar com extintores e três saídas, pecava na sinalização. Apenas uma saída, que também serve como entrada, tem letreiro indicativo acima.
Com menos de um metro de largura, a porta dá em uma catraca giratória, que impediria a saída rápida em emergências.
Atenção
Em Ponta Grossa, a Gazeta do Povo passou por três estabelecimentos e constatou problemas em todos. O mais grave foi a falta de extintores em um bar, onde também não havia saída de emergência visível com placas indicativas.
Situação semelhante também foi encontrada pela reportagem em Maringá. A exemplo de Curitiba e Ponta Grossa, a falta de sinalização que indique a direção a tomar até as saídas é comum em casas da cidade.