Dez horas da manhã, imediações da Rodoferroviária de Curitiba. Nesse horário, o movimento já é intenso. Algumas pessoas estão a caminho do trabalho, outras indo viajar, outras ainda chegando a Curitiba. No vai-e-vem frenético, no entanto, destacam-se alguns cidadãos, que apesar do barulho, conseguem dormir profundamente. São cerca de 20 pessoas que fizeram do local a sua "casa" ou "chácara" como eles costumam brincar, e dos colegas de rua, a sua "família".
"Achei que não existisse moradores de rua aqui", surpreende-se o turista Joshua Mohamed Idrisidal, oficial marítimo, de 29 anos. Os personagens em questão, no entanto, nem se incomodam com o comentário e continuam o cochilo. O teto deles é as estrelas, ou dependendo do horário, o Sol. A cama é a grama.
Numa manhã de quinta-feira, o grupo é abordado pela equipe da Gazeta do Povo. A única a acordar e que concorda falar é Tereza (nome fictício), que mora na rua com o filho pequeno.
Tereza é a matriarca do grupo, a quem todos chamam de "tia". Ela é a responsável por colocar ordem "na casa", acordar todos, fazer a divisão da comida e manter a disciplina. É ela também quem organiza como vai ser a entrevista.
Logo de início um dos rapazes pergunta: "Você é casada, moça?". "Tia" Tereza intervém imediatamente: "respeite a moça, não tem que ficar fazendo este tipo de perguta não, não admito falta de educação". O garoto abaixa a cabeça e volta a fumar o seu cigarrro. A entrevista continua. Nos minutos seguintes, aquelas pessoas compartilham com uma desconhecida um pouco da sua história.
Cotidiano
Para ter o que comer , a "família" de Tereza trabalha durante o dia fazendo artesanato com latinhas de alumínio e guardando carros. Há três anos começaram a viver juntos e se ajudar. "Assim é melhor, um defende o outro", diz um rapaz que acompanha a comunidade há um ano.
O nome fictício e o anonimato, requisitos para prosseguir com a entrevista, são explicados por alguns por motivo de segurança. "A Guarda Municipal cobre nós de porrada", diz um deles. De acordo os mendigos, eles já foram, inúmeras vezes, vítimas de agressões físicas da Guarda Municipal.
A violência, a drogadição e o alcoolismo fazem parte da história de vida dessas pessoas. E do mesmo modo que vêm esses problemas, vão embora os sonhos e a dignidade. "A única proteção que temos é Deus mesmo", comenta Tereza. "Não penso no futuro, tenho que me preocupar como que vou sobreviver hoje", diz outro. "Nós não temos para onde correr", complementa um terceiro.
Segundo eles, a Fundação de Ação Social de Curitiba, que deveria ser responsável por abrigá-los, sempre vira as costas. "Sempre que vamos lá, eles dizem que nunca tem vaga", conta Tereza. "Sem contar que somos sempre humilhados lá", completa outro. "Se tivéssemos um lugar para dormir, você acha que estaríamos aqui?", questiona Tereza. "Eu só quero um emprego e um pouco de respeito", continua.
Neste pequeno universo de moradores de rua pesquisado, constata-se que a maioria é proveniente de outras cidades, principalmente de municípios do interior do Paraná e de São Paulo. Eles vêm para Curitiba acreditando na possibilidade de melhorar de vida e conseguir um emprego. O sonho é desfeito, às vezes, no primeiro dia na capital.
Jeferson, de 25 anos, veio de Campo Mourão há dois meses. Ele iria morar e trabalhar em Curitiba. Mas, logo que chegou, a moto que usava no serviço de motoboy foi roubada. "Não tive mais como trabalhar e pagar o aluguel de uma casa para morar", conta.
A própria "tia" Tereza tem uma história semelhante. Ela veio de Tatuí, interior de São Paulo, há um ano e quatro meses. Tentou trabalhar como empregada doméstica, mas não obteve sucesso. "Nos primeiros dias, consegui um serviço, mas não podia ficar na casa da patroa com o meu filho, tínhamos que dormir na rua", conta. "Depois disso, não consegui arrumar emprego nunca mais, porque depois que você dorme na rua, ninguém te respeita mais", comenta.
Soraya Thronicke quer regulamentação do cigarro eletrônico; Girão e Malta criticam
Relator defende reforma do Código Civil em temas de família e propriedade
Dia das Mães foi criado em homenagem a mulher que lutou contra a mortalidade infantil; conheça a origem
Rotina de mães que permanecem em casa com seus filhos é igualmente desafiadora
Deixe sua opinião