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Análise

A corrupção corre solta, não apenas no Congresso Nacional

Curitiba – Se todo mundo rouba, por que eu não? Vide o mensalão, as absolvições na Câmara do Congresso. E não só a corrupção na esfera pública, mas também nas empresas privadas. Quem não ouviu falar da empresa que sonega ou dá propina para conseguir benefícios?

Pesquisa feita pela Transparência Brasil, entidade sem fins lucrativos, em parceria à Kroll Consultoria, em 2003, mostra que 70% das empresas consultadas admitem perder até 3% do seu faturamento com subornos. Para 25% das empresas esse prejuízo fica entre 5% e 10% (veja quadro). Existe solução para a roubalheira ou, para quem é honesto, o melhor mesmo é deixar de lado essa ‘mania’ e correr atrás do tempo perdido?

O argumento mais usado em favor da honestidade – não o melhor – é que, cedo ou tarde, as irregularidades acabam em prejuízo. Como no caso de uma empresa em Curitiba, mantenedora de um caixa 2 em um banco do exterior no valor de R$ 500 mil. Com a troca do diretor financeiro, o conselho da corporação acabou sendo enganado pelo novo funcionário, que embolsou o dinheiro. Os empresários "lesados" nem puderam abrir um processo, pois não tinham como explicar a origem do dinheiro.

"As empresas não têm apenas caixa 2, mas 34, 35, 40. O mais incrível é que os empresários, como os políticos, querem cada vez mais parecer honestos, preocupados com seus funcionários, com o meio ambiente, com a responsabilidade social. Dão belos discursos, mas isso não se verifica na realidade. Se preocupam mais com a reputação do que com a sua consciência", lamenta o consultor de empresas e professor da UniFAE, Kassem El Sayed.

Outro campo vasto de corrupção é, sem dúvida, o sistema brasileiro de licitações. Não se pode afirmar que 100% delas contenham irregularidades, mas é difícil encontrar empresários convencidos da licitude da maioria delas. "É fácil corromper alguém, ‘molhar a mão’, dar dinheiro para conseguir benesses. Para alguns isso até já está incluído no preço do produto", diz Sayed.

Embaixo dos panos

O roubo nunca é descarado. "Não se vê um funcionário sacando um cheque de R$ 100 mil todo dia", brinca um consultor de empresas em Curitiba, com muitas histórias, mas que não quis se identificar. "As coisas são bem feitas, como no esquema de Marcos Valério, com a ajuda de redes formadas com várias empresas", explica.

No nível de primeiro escalão não é incomum encontrar, por exemplo, a contratação de colaboradores terceirizados e, em conluio com a fornecedora de recursos humanos, fazer a empresa pagar por 500, ao invés dos 100 empregados que efetivamente trabalharam. Isso acontece também na área de serviços, quando muitas vezes se paga duas, três, quatro vezes mais o preço justo. A diferença vai para o bolso de quem orquestrou o desvio.

Nos outros patamares também não é raro ver gente ultrapassar o sinal vermelho da ética. Um funcionário de uma empresa em Curitiba conseguiu um bloco de notas fiscais de um certo restaurante em São Paulo. Quando precisava de um trocado na volta de suas viagens, apresentava uma nota preenchida, afirmando ter participado de almoços de negócios que nunca aconteceram.

Essa prática, aliás, é bem comum. Um consultor pergunta: "Quem nunca ouviu do taxista a pergunta, depois de falar que precisava de um comprovante para justificar à empresa, ‘quanto quer que eu anote na nota’, com a proposta de um valor muito maior a ser ressarcido pelo gasto no trajeto?"

Controles

Para o diretor-executivo da Transparência Brasil, Cláudio Abramo, o melhor combate à corrupção está em acabar com a causa: a falta de fiscalização. "É preciso mudar as condições pelas quais se opera no Estado e nas empresas privadas, aumentar os controles. Criar mecanismos para que, simplesmente, não se possa fazer", afirma.

Abramo lembra que o mensalão existiu no Congresso porque os partidos políticos têm em suas mãos a possibilidade de lotear entre si cargos de estatais e de outros pontos estratégicos do governo. "É preciso mudar a lei. Um outro problema é a falta de obrigatoriedade de execução do orçamento, inclusive dos totais previstos para saúde e educação. No fim, os volumes nunca são aplicados corretamente nessas áreas e o dinheiro desviado acaba se transformando em moeda de troca entre parlamentares", diz.

Na visão de Kassem a solução definitiva contra a corrupção, a longo prazo, está na educação, na consciência de que quem é corrupto não prejudica apenas os outros, mas também a si mesmo. "Está muito presente o pensamento do ‘quanto eu ganho’ ao invés de pensar em quem está envolvido. A ética tem um custo, mas vale a pena e as pessoas precisam apreender isso", insiste.

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