A foto de Roberto Nitschke mais divulgada atualmente em nada lembra seus trabalhos anteriores como modelo. As roupas de grife foram substituídas por uma blusa de moletom verde-oliva, calça de pijama xadrez e tênis brancos sobre meias vermelhas. Sentado em uma cadeira de rodas, com os cabelos despenteados caindo sobre o rosto, faz um pesado sinal de positivo para o fotógrafo e tenta esboçar um sorriso.
O visual abatido deste catarinense de 31 anos, morador de Curitiba desde bebê, é um contraste pleno com as projeções de força e autossuficiência que ele ajudou a vender durante 15 anos de carreira, mas se tornou a logomarca da última campanha estrelada por ele, esta em benefício próprio. "Levanta Roberto", uma mobilização organizada por amigos por meio da internet, busca arrecadar fundos para que o jovem possa ser submetido a uma cirurgia experimental de implante de células-tronco na medula óssea e, com sorte, recuperar os movimentos perdidos há um ano e meio após um acidente de automóvel.
A meta é arrecadar R$ 65 mil, valor necessário para que Roberto possa custear o tratamento no Panamá, onde o procedimento é realizado. A campanha, que está entrando na terceira semana, foi pensada e organizada pelo amigo Daniel Monteiro, 31 anos, publicitário que gerencia os perfis de internet da cantora Claudia Leitte.
Daniel e Roberto se conheceram na adolescência, quando trabalhavam em um acampamento religioso na Lapa, Região Metropolitana de Curitiba. Nos anos seguintes, à medida que cultivavam a amizade e iniciavam suas carreiras na capital, passaram a se encontrar também profissionalmente: um nas passarelas, outro na divulgação de eventos de moda.
Mais tarde, porém, esse mesmo desenvolvimento profissional foi responsável por separá-los. Roberto foi morar no exterior e fixou residência na cidade de San Diego (EUA). Daniel abriu uma empresa de publicidade e saiu de Curitiba, acumulando diversas experiências até se estabelecer em Salvador, assessorando a estrela do axé music. "Mesmo passando muito tempo afastados, quando a gente se encontra percebe que a amizade continua forte", conta Daniel à Gazeta do Povo, por telefone, de Salvador.
Acidente
Em setembro de 2010, quando ocorreu o acidente nos EUA, Daniel foi um dos primeiros a saber da notícia no Brasil. Os detalhes da batida se perderam no coma de um mês, mas os laços de fraternidade se restabeleceram vencendo os 9 mil quilômetros que separam a Bahia da costa oeste norte-americana.
Pelos meses seguintes, enquanto Roberto se tornava um autodidata em lesões na medula espinhal e lia sobre as recentes pesquisas com células-tronco, Daniel tentava bolar uma maneira de auxiliar nos esforços para a recuperação do amigo, que então se resumia a sessões de fisioterapia. Após algumas tentativas de arrecadar dinheiro por meio de feijoadas e churrascos, logo percebeu que o meio em que já atua profissionalmente era onde havia a maior possibilidade de sucesso.
A conta de Claudia Leitte no Twitter tem 4,7 milhões de seguidores, uma das maiores entre personalidades brasileiras. A da campanha "Levanta Roberto" acumula 60 participantes, além de ter sido "curtida" por 144 pessoas no Facebook. A divulgação ainda incipiente rendeu R$ 15 mil até a última sexta-feira. Mas os organizadores estão esperançosos. "Resolvi aplicar minha experiência na causa. Sem o movimento das pernas, ele não consegue trabalhar. Mas se eu conseguir ajudar meu amigo a sair da cadeira de rodas, será o case da minha vida."
Passagem bíblica inspirou o slogan da campanha
A primeira ideia de Daniel era que a campanha se chamasse "Força, Roberto". Com experiência em publicidade virtual, ele lembrou que em alguns formulários da internet é necessário retirar os acentos. O "Forca, Roberto" resultante daria um sentido inverso ao desejado.
O slogan por fim escolhido é inspirado na Bíblia. O verbo no imperativo o mesmo usado por Jesus Cristo para curar um paralítico, em passagem descrita em três livros do Novo Testamento remete à crença em um milagre. A motivação dos dois amigos, que são evangélicos, revela um sincretismo entre a certeza galgada na fé religiosa e a expectativa em relação ao desenvolvimento científico. Somadas e enrodilhadas, as duas âncoras formaram um corpo teórico singular que os investe de esperança em relação à cura.
"Creio que Deus pode me curar com apenas um toque, e me colocar em pé agora", aponta Roberto, por telefone, de San Diego, na Califórnia (EUA). "Mas se Ele fizesse isso iria afetar apenas a mim e à minha família. Mas, com tudo o que está acontecendo, cada pessoa que estender a mão e me ajudar também vai receber algo. Existe um propósito divino nisso". O modelo conta que, apesar de estar em uma profissão associada ao dinheiro rápido, esta não é a realidade para a maioria dos profissionais. Daniel complementa: "Todo o conhecimento, sobrenatural ou o dos médicos, é dado por Deus. Ambas são formas de Ele curar alguém", diz.
Espera
Roberto avalia que a sua cura é, sobretudo, uma corrida contra o tempo. Das conversas com médicos e leitura de notícias sobre a pesquisa com células-tronco, ele avalia que os resultados já obtidos apontam invariavelmente para a reversão do quadro de paralisia. "É um tratamento que sempre vai ser aprimorado e eu posso tentar quantas vezes for possível", estipula.
Ele entende que os desafios a serem vencidos pela medicina são vários o que demanda uma batalha que pode se estender por décadas. Roberto atualmente procura algum tipo de trabalho, que garanta uma renda "para pagar as contas". O sonho de voltar a desfilar foi colocado na prateleira de baixo, mas ainda está lá.