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Entrevista

“A meta agora é levar o país a crescer 5% ao ano”

Brasília – Sucessora do ex-todo-poderoso ministro José Dirceu no Gabinete Civil, Dilma Rousseff tornou-se a gerente do governo Lula no auge da crise de 2005. Diferentemente do antecessor, evita ostentar seu poder, embora os ministros a temam. Evita mostrar intimidade com o presidente, embora ele a ouça e respeite muito. Por sua mesa, passam os mais variados temas: de crise nos aeroportos ao projeto de biodiesel. Mineira por nascimento, gaúcha por adoção, Dilma combina como poucos o perfil técnico com a alma política. Nesta entrevista concedida à Agência O Globo na terça-feira, véspera da pausa para o feriado, ela descreve a agenda para o país no segundo mandato do presidente Lula.

Reeleito o presidente, qual será a agenda do segundo mandato?Dilma Rousseff – A questão básica é o desenvolvimento econômico. A meta agora é levar o país a crescer a uma taxa sustentável de 5% ao ano. As conquistas do primeiro mandato, inflação baixa, robustez fiscal e redução da fragilidade externa, dão margem de manobra para almejar crescer a 5%.

O governo está rachado sobre a receita do crescimento?A unidade do governo foi demonstrada na campanha. Nossa proposta foi baseada num tripé: desenvolvimento, distribuição de renda e educação de qualidade. Estamos trabalhando nesta direção. Elevamos o crédito consignado, temos exportações em torno de US$ 135 bilhões e o saldo da balança comercial chegando a US$ 46 bilhões. Isso confere blindagem diante de flutuações do mercado internacional. O grande desafio do próximo mandato é, preservando os fundamentos macroeconômicos, mantendo a responsabilidade, ser mais eficiente e efetivo no gasto. Vamos apostar na melhoria da gestão e da qualidade do gasto público. Vamos retirar entraves ao investimento em infra-estrutura, sem o que não haverá crescimento. Os marcos regulatórios estão aprovados ou encaminhados.

Os empresários falam em modernizar relações trabalhistas, tema excluído da campanha. Está na agenda?Vamos tratar disso, mas o foco é na desoneração das folhas de salário, com vistas à geração de emprego. O governo não vai trabalhar com mudanças nos direitos trabalhistas. Interessa criar um círculo virtuoso, em que o crescimento do PIB facilite transformações na legislação. É mais fácil fazer ajuste com o PIB crescendo.

O governo está decidido a fixar meta de crescimento, tal como a da inflação?O presidente deseja grande mobilização do país pelo crescimento. O desenvolvimento não é uma questão pura e simplesmente macroeconômica. Envolve toda a sociedade, empresários, trabalhadores, agentes políticos, União, estados e municípios. Desenvolvimento é uma questão política. Quando falamos em meta de 5% é porque achamos que o país tem condições de crescer neste ritmo. Fizemos direitinho o dever de casa.

A meta é consenso no governo?Caminha para ser consensual na sociedade. É uma postura global pelo desenvolvimento do país, co-mo houve contra a inflação. A inflação foi vencida, não aceitaremos a volta dela. Temos margem pa-ra crescer. Taxa de juros caindo sistematicamente, todas as variáveis convergindo para uma situação positiva. Precisamos afirmar todos os dias que agora nossa preocupação é com o crescimento.

Esta meta de crescimento não pode resultar em descontrole da inflação?Não acho que tenhamos essa "escolha de Sofia". Não vamos cair nessa armadilha. Só há crescimento sustentável com controle da inflação. Para nós, é possível almejar meta de crescimento com inflação controlada.

Será preciso uma nova reforma da Previdência?O governo vai tratar do aperfeiçoamento da gestão. Isso está na nossa pauta. Qualquer outra proposta será considerada a posteriori, evitando mexer em direitos adquiridos.

Há críticas aos gastos sociais...Políticas sociais são compromisso pétreo. Vamos manter o Bolsa-Família buscando portas de saída, com capacitação e formação de mão-de-obra. Manter o programa de agricultura familiar, o Luz Para Todos, o de construção de cisternas. Têm importância política porque milhões de brasileiros viraram cidadãos e consumidores. Com isso estaremos criando mercado interno de massas.

O governo terá o mesmo tamanho?É preciso ter cuidado com essa crítica. Vivi uma experiência emblemática no Ministério de Minas e Energia. Em determinado momento tratou-se de reduzir o tamanho do Estado no Brasil. Aquele ministério foi desmantelado, perdeu a capacidade de formulação. Veio o racionamento. No setor elétrico, ignorar crise é desconhecer o setor. Sabe por que aconteceu aquilo? Quando lá cheguei, encontrei falta de engenheiro e excesso de motoristas. Esse negócio de enxugar governo já levou o país a desastres.

Energia é condição para crescer. Não há risco de nova crise?Não. O planejamento criou mecanismos para o caso de aceleração do crescimento. Nos últimos anos, a contratação de energia tem sido maior que a necessidade. O país hoje tem um colchão. O problema é o futuro. No setor elétrico, como no de estradas, investimentos têm que ter continuidade e planejamento. O caso do gás é emblemático. Temos que acelerar a produção para ter gás suficiente em 2008. Explorar logo reservas descobertas no Espírito Santo e em Santos. O governo vai licitar as hidroelétricas de Madeira e Belo Monte e avaliar todas as fontes de energia. Nos próximos dez anos, teremos grande segmento da economia movimentado por etanol e o biodiesel, além do HBio da Petrobrás.

Espera menos tensão no ambiente político?A temperatura política subiu com a disputa eleitoral, mas tende a baixar bastante. O presidente, legitimado por mais de 60% dos eleitores, está chamando ao entendimento em torno de uma agenda do Estado e da nação, não do governo.

E o PT, como evitar crises e novos embaraços éticos para o governo?Sofremos e aprendemos. O presidente tem compromisso indelével com o combate à corrupção. Isso exige instituições e procedimentos fortes. Temos a Comissão de Ética da Presidência da República, a Controladoria Geral da União, que fiscaliza não só a administração direta, mas transferências para estados e municípios. Por isso descobriu os sanguessugas e repassou à PF e ao Ministério Público, instituições imprescindíveis. É preciso sinalizar que a impunidade acabou.

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