Beneficiado
Sem receber por aula, PM acionará juizado
Um oficial da Polícia Militar (PM) do Paraná, que preferiu não se identificar, será um dos possíveis beneficiados com o fim do prazo estipulado pela Lei 12.153/2009 aos tribunais estaduais. Atualmente, a resolução 10/2010 do TJ-PR impossibilita que ele cobre no juizado especial da Fazenda Pública o que o estado lhe deve. Ele dá aula em curso de alunos da PM, mas há um ano não recebe por isso. "Se eu entrar na vara comum da Fazenda Pública, nem meus bisnetos vão receber", diz, referindo-se à lentidão da Justiça comum.
O policial crítica a demora para o TJ-PR se adequar à legislação federal que amplia as possibilidades da população processar o Estado nos juizados especiais de Fazenda Pública. Para ele, o tribunal não precisaria de cinco anos para isso. "Quero deixar claro que, se houve motivo de adequação do tribunal naquela época, para que fosse tomada essa providência que prejudicou e limitou severamente o direito de ação do povo, esse motivo já deveria ter sido solucionado há algum tempo".
Análise
O vice-presidente da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR), Cássio Telles, acredita que o fim do prazo de cinco anos ampliará o acesso da população ao Judiciário. "Causas antes não propostas agora serão ingressadas na Justiça. A demanda vai aumentar", diz Telles. Segundo ele, os juizados especiais são de fundamental importância para o acesso da população à Justiça por permitirem processos mais simples e rápidos. Para Telles, a estrutura atual não conseguirá atender a nova demanda e será preciso criar juizados exclusivos para a Fazenda Pública.
2.504 ações é total existente no juizados especiais de Fazenda Pública no Paraná hoje. Em Curitiba, há 597. O dado é de 9 de abril deste ano. Goiânia, cidade onde a adequadas da área já foi feita e a quantidade de habitantes é semelhante a de Curitiba, recebeu 9.654 ações em 2013.
O que diz a lei
Pela 12.153/2009, que começará a valer plenamente a partir de junho de 2015, será de responsabilidade dos juizados especiais de Fazenda Pública o andamento de ações contra estados e municípios no valor de até 60 salários mínimos, exceto nos casos de:
Ações de mandado de segurança, de desapropriação, de divisão e demarcação, populares, por improbidade administrativa, execuções fiscais e as demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos;
Causas sobre bens imóveis dos estados, Distrito Federal, territórios e municípios, autarquias e fundações públicas a eles vinculadas;
E causas que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou sanções disciplinares aplicadas a militares.
A partir de 2015, os paranaenses que se sentirem lesados poderão acionar estado e municípios na Justiça de forma mais rápida e com uma variedade maior de assuntos nos juizados especiais da Fazenda Pública. Em dezembro deste ano termina o prazo de cinco anos dado aos tribunais de justiça estaduais pela Lei Federal 12.153/2009 que criou esses juizados para que eles se reestruturassem a ponto de receber a nova demanda de forma adequada.
Atualmente, a população pode ingressar nos juizados especiais da Fazenda Pública nas causas de valor até 40 salários mínimos em apenas quatro assuntos: multas de trânsito, transferências de veículos, impostos (ICMS e IPTU), e pedidos de medicamentos e tratamentos de saúde. Com as novas regras, serão aceitas causas no valor de até 60 salários mínimos e uma gama maior de matérias.
A decisão de limitar os temas dos juizados especiais nesse período de adaptação foi do próprio Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), oficializada na resolução 10/2010. A Lei Federal 12.153/2009 deixou a cargo dos tribunais restringirem as competências dos juizados enquanto pudessem se adequar à nova realidade. Em Goiás e Sergipe, os tribunais seguiram outro caminho e atendem a população plenamente nessa área desde 2009.
O fim do prazo colocará à prova o planejamento do TJ-PR para atender uma possível demanda reprimida. Muitas pessoas têm deixado de ingressar com ações nas varas da Fazenda Pública porque não têm a mesma rapidez dos juizados especiais. Com a nova possibilidade, a tendência é de que novas ações surjam elevando as demandas para os juízes e as ações indenizatórias contra estado e municípios.
Nesse cenário, o Comitê de Gestão Estratégica do TJ-PR, centralizado na 2.ª vice-presidência, tem trabalhado desde 2009 para tentar definir que caminho tomará até o fim deste ano. Em entrevista à Gazeta do Povo, o juiz auxiliar Helder Taguchi explicou que o tribunal deve finalizar um estudo em junho que determinará se serão criados juizados especiais da Fazenda Pública com estrutura nova ou se um juizado já existente terá sua competência transferida. Segundo o magistrado, ainda é difícil saber se haverá uma onda de ações reprimidas.
A vantagem da criação de uma estrutura nova será a celeridade dos processos. Já a outra opção poderá sobrecarregar juízes. Segundo Taguchi, por lei, o prazo termina mesmo em junho de 2015, pois é direito do tribunal ter ainda mais seis meses de fôlego.
Em Curitiba, demanda reprimida pode chegar a 90%
As causas contra estado e municípios não chegam a representar 1% da demanda atual dos juizados especiais no Paraná. Por isso, o número pode reforçar a tendência de demanda reprimida, assim como levanta a desconfiança do TJ-PR também para a inexistência dela. Com a dificuldade em saber se haverá ainda mais demanda, o TJ-PR tem tentado estabelecer parâmetros para tomar a decisão mais acertada. Para isso, tem comparado Curitiba com outras cidades.
Em 2013, o total de ações em juizados especiais da Fazenda Pública representou apenas 10% do que foi ingressado nos juizados de Goiânia, que tem competência plena na área desde 2009. Com base nessa comparação, há chances de que aumente em 90% a demanda em Curitiba.
Como casos da Fazenda Pública possibilitam a tutela antecipada, aumenta em mais um o número de recursos possíveis durante o processo, no caso o agravo de instrumento. Por isso, o Comitê de Gestão Estratégica do TJ-PR já sugeriu a criação de mais oito vagas de juízes para as turmas recursais.
Debate nacional
A demanda reprimida dos juizados especiais de Fazenda Pública será um dos focos do debate do Fórum Nacional dos Juizados Especiais (Fonaje), que ocorrerá entre 21 e 23 de maio em Foz do Iguaçu. "Essa questão é de interesse de todo o Brasil, que tenta imaginar qual vai ser essa demanda", afirma o juiz auxiliar da 2.ª vice-presidência do TJ-PR, Helder Taguchi.
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