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Fernando Martins

A política além de empregados e patrões

Há algo de novo emergindo na política ocidental. Manifestações como as passeatas anticorrupção no Brasil e o movimento Ocupe Wall Street, com suas ramificações em vários países, têm motivações diversas, mas um mesmo modus operandis e objetivo. Os protestos são articulados independentemente das organizações políticas tradicionais e pretendem criticar governantes que não atendem aos anseios populares. Nesse sentido, são sintoma de uma crise de representação social. Uma crise que traz consigo riscos e oportunidades.

Na história democrática ocidental, a canalização das demandas sociais ocorria tradicionalmente pelos partidos. Eles representavam basicamente duas identidades políticas definidas pelo trabalho: o assalariado e o patrão. Assim, legendas social-democratas, trabalhistas e socialistas se opunham às siglas liberais e conservadoras.

Num mundo com mobilidade social limitada, a identificação dos cidadãos com sua classe tendia a ser forte. Como consequência, também era mais coesa a relação do eleitor com o partido que o defendia e com seu representante. É possível supor ainda que isso tornava o político mais responsável diante de seus representados.

Na alternância de poder entre as duas correntes políticas, o sistema social-liberal foi um sucesso. Legou um desenvolvimento nunca antes visto. Mas criou uma sociedade complexa, com múltiplas identidades. Hoje um operário pode juntar suas economias e tornar-se empreendedor. Ou então investir a poupança na bolsa e virar sócio de uma grande empresa. Tem-se assim a figura do trabalhador-patrão, uma identidade social que está longe de ser facilmente representada politicamente, como tantas outras dos tempos modernos.

Ao mesmo tempo em que a identidade operário-capitalista perdia força, surgiam outras na esteira da sociedade mais aberta que estava sendo construída. As pessoas passaram a se definir politicamente não apenas pelo papel no mundo do trabalho, mas também pela opção religiosa, pela preferência sexual, pela etnia e pela adesão a causas diversas, como a ambiental.

Novas peças surgiram e embaralharam o jogo político. Os partidos ainda não conseguiram aprender as regras desse intrincado xadrez e estão em crise. Representar a sociedade do século 21 tornou-se um enorme desafio. O risco de que, ao não compreenderem a complexidade contemporânea, os políticos se distanciem ainda mais dos cidadãos, percam legitimidade e ponham a democracia em xeque. Mas há a oportunidade de aprofundar o processo de democratização, por meio da abertura de novos canais de participação e de representação social.

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