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Gilmar Cordeiro, diretor da Escola Vila Macedo:  “Boa parte dos nossos alunos está ligada [indiretamente] ao sistema penitenciário” | Daniel Castellano/ Gazeta do Povo
Gilmar Cordeiro, diretor da Escola Vila Macedo: “Boa parte dos nossos alunos está ligada [indiretamente] ao sistema penitenciário”| Foto: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo

Cronologia

Acompanhe como se formou o complexo penitenciário de Piraquara:

18 de junho de 1941 - Começa a funcionar em caráter experimental a Penitenciária Agrícola do Estado, segunda unidade penal do Paraná, com 30 presos.

17 de dezembro de 1943 - É oficialmente criada a Colônia Penal Agrícola, que contava com 70 presos beneficiados pelo novo regime semiaberto.

1º de dezembro de 1954 - Inaugurada a Penitenciária Central do Estado, com capacidade para 522 celas individuais. Foi a terceira unidade penal do Paraná.

13 de maio de 1970 - É entregue a Penitenciária Feminina do Paraná, estabelecimento penal de segurança máxima, destinado à custódia de presas condenadas.

16 de abril de 2002 - Inaugurada a Penitenciária Esta­dual de Piraquara, unidade de se­­gurança máxima, com capacidade para 723 presos condenados

4 de novembro de 2003 - Cópia de um presídio americano, começa a funcionar o Centro de Observações Criminológicas e Triagem - Unidade II, para triagem de presos.

19 de junho de 2006 - Inaugurado o Centro de Detenção e Ressocialização de Piraquara, que depois passa a se chamar Peniten­ciária Estadual de Piraquara II.

Medo

Silêncio é regra entre moradores da região

Das milhares de pessoas que vivem nas imediações do complexo penitenciário de Piraquara, é difícil precisar qual é a parcela que possui familiares atrás das grades. Os relatos indicam que esse número é grande. Via de re­­­­gra, entretanto, a maioria dos moradores teme se expor.

Quem quebra o silêncio é Silmara (nome fictício), que tem um irmão na Penitenciária Central do Estado.

A relação dela com o sistema carcerário começou hácerca de 15 anos – quando o rapaz foi detido pela primeira vez – e nunca mais parou. "Ele já fugiu várias vezes, ou então é solto e apronta de novo", afirma, sem esconder a desesperança. "No Brasil, sistema carcerário não recupera ninguém, só piora."

A desilusão é tamanha que Silmara deixou de visitar o irmão há três anos. Culpa, segundo ela, do desgaste sofrido durante as visitas, nas quais os familiares são submetidos a uma série de exigências, como tirar toda a roupa e fazer flexões – a ideia é tentar evitar a entrada de drogas ou armas. "Tem de ter uma saúde de ferro. Eu já avisei que não vou mais vê-lo, é uma humilhação muito grande."

A história de Piraquara, na região metropolitana de Curitiba, confunde-se com a história do sistema penitenciário do Paraná. Os detentos representam 6% da população do município. Parentes dos presos constituíram vilas nas proximidades das unidades prisionais

A história de Piraquara, município da região metropolitana de Curi­­tiba, está diretamente ligada à história do sistema penitenciário do Paraná. O início dessa relação data da década de 1940, com a inauguração da Penitenciária Agrícola do Estado, segunda construída no Paraná. Hoje, a cidade já conta com um complexo penitenciário composto por seis unidades, que, juntas, abrigam cerca de 6 mil detentos. Um contingente que re­­presenta 6% da população do mu­­nicípio e influencia toda a comunidade que se consolidou ao redor.

É numa região afastada do centro de Piraquara que está a Vila Macedo. Formado inicialmente por funcionários do complexo penitenciário e pelas famílias dos detentos, hoje o bairro – populoso – conta com ruas asfaltadas, uni­­dade de saúde e uma escola com cerca de mil alunos. Entre os moradores, é comum encontrar relatos de quem tem familiares atrás das grades. Porém a violência alimentada pelo tráfico de drogas e o medo de se expor fazem com que poucos se disponham a falar.

O diretor da Escola Vila Macedo, Gilmar Luiz Cordeiro, é um dos que acompanham de perto a realidade de quem vive nas imediações do complexo penitenciário de Pira­quara. De acordo com ele, não são poucos os alunos que têm pais, ir­­mãos ou outros familiares encarce­­ra­­dos. "Boa parte dos nossos alunos está ligada ao sistema penitenciário. Aqui na região sempre há uma população provisória, que permanece um tempo e depois vai embora."

O prefeito de Piraquara, Gabriel Samaha, reconhece que essa parcela de moradores provisórios existe, mas diz que ela não é tão grande assim. "Muitas famílias que vieram para ficar perto dos detentos acabaram se consolidando", conta.

Não muito distante da Vila Macedo existe a Vila Militar. Concebida também para abrigar os funcionários do complexo penitenciário, a desvalorização dos imóveis fez com que o local acabasse por atrair familiares de detentos.

Foi lá que fixaram residência, por exemplo, a esposa, o filho, a mãe e dois irmãos de um dos internos da Colônia Penal Agrícola. "Como é muito longe, ficou mais fácil eles virem morar para cá. É bom para eles e para mim, que tenho o apoio da família", avalia o detento, que saiu de Foz do Iguaçu.

Além das vilas situadas nas imediações, há, ainda, famílias de detentos que se fixaram no Jardim Guarituba – bairro que iniciou como ocupação irregular e hoje é um dos mais populosos do município.

Cotidiano

Ao lado da Escola Estadual Vila Macedo, é fácil encontrar detentos da Colônia Penal Agrícola trabalhando na limpeza das ruas. A reportagem acompanhou uma tarde de atividades de seis desses internos do regime semiaberto.

O trabalho tem início às 8 h e se encerra às 17 horas, quando eles retornam à Colônia Penal. Cada dia trabalhado conta para a redução da pena. Do total do salário que recebem, 60% é destinado aos familiares e 40% é depositado em uma conta bancária, que é liberada quando eles ganham a liberdade.

"A gente tem consciência de que errou e está pagando pelo que fez. Trabalhando aqui nós podemos ver o que está acontecendo, mostrar para a comunidade que estamos arrependidos e que queremos começar uma nova vida depois de sairmos", afirma um dos detentos, que diz ter esperança de uma oportunidade de emprego no futuro. "A gente quer seguir em frente, não voltar para trás."

Ter presídios é positivo, diz prefeito Samaha

Para o prefeito de Piraquara, Gabriel Samaha, ter um complexo penitenciário no município não é nenhum demérito. Pelo contrário. A presença das unidades prisionais é vista como algo positivo: emprega a população local e permite que alguns detentos prestem serviços na comunidade. Cerca de 30 internos da Colônia Penal Agrícola trabalham em diversas áreas no município por meio de um convênio com a prefeitura.

"Piraquara sempre foi referência no sistema penitenciário. Isso ajuda a empregar muitos moradores da cidade e de outros lugares", ressalta Samaha. A ideia de que o grande volume de presos seria um gerador de criminalidade é rechaçada. "O que gera criminalidade é a falta de oportunidades", diz.

O diretor da Escola Vila Macedo, Gilmar Luiz Cordeiro, conta que a região tem sérios problemas de criminalidade, mas ele não os associa à população carcerária. "Os problemas maiores são rebeliões ou fu­­gas." Por estar na área de proteção ambiental da Bacia do Rio Iraí, o município sofre com uma série de restrições a empreendimentos industriais, o que limita seu desenvolvimento econômico.

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