O ex-barrageiro Sebastião e seus bisnetos. Ficar foi bom| Foto: Christian Rizzi/ Gazeta do Povo

Ação social

ONG incentiva hábito da leitura no bairro

A Vila C tem a única biblioteca de bairro construída pelo poder público em Foz. Inaugurada em 2007, a obra feita pelo governo estadual é administrada pela prefeitura, mas, por falta de funcionário, quase fechou em 2013.

No fim do ano passado, a Ong Guatá - Cultura em Movimento, implantou um ponto de cultura na biblioteca e garantiu o funcionamento, pelo menos no turno da tarde. Para incentivar o gosto pela leitura, a Guatá faz intervenções literárias e culturais em escolas dos bairros. Muitos moradores não sabem que ali tem biblioteca. "A ideia é trazer o pessoal de volta", diz o agente cultural da Guatá, Júlio Fornari. Modesta, a biblioteca tem 1,3 mil livros no acervo e precisa de reparos. Tem um telecentro desativado, vidros quebrados e goteiras.

Projetos

Embora tenha se desvinculado da Itaipu, a Vila C recebe até hoje aporte da hidrelétrica. Por meio do programa Energia Solidária, a binacional quitou, na Caixa Econômica Federal, débitos de 472 moradias. Também apoiou a implantação do Centro Comunitário da Vila C, onde são atendidas 500 crianças e adolescentes entre 4 e 18 anos, com atividades esportivas, artísticas e cursos de formação profissional.

Na Escola Municipal Padre Luigi, desde 2012, os alunos estudam com auxílio de netbooks. O colégio recebeu 300 computadores, em uma iniciativa da Itaipu e governo federal.

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Quarenta anos após o início das obras da Itaipu Binacional, a Vila C, bairro de Foz do Iguaçu criado para abrigar barrageiros e trabalhadores da construção civil, transformou-se e resistiu à ameaça de demolição. Hoje, uma das regiões mais populosas da cidade, a Vila reúne cerca de 10 mil moradores.

O bairro começou a ser erguido em 1975, na mesma época de outras duas vilas criadas pela Itaipu, a Vila A e a Vila B, todas na região Norte da cidade. Na Vila C, vizinha da hidrelétrica, foram construídas 2.652 moradias compartilhadas, feitas em barracões. Cada uma tinha quatro casas simples, com dois quartos, cozinha, copa, banheiro. Na cobertura, o material usado foi zinco. Como foi projetado para ser provisório, o bairro não contava, sequer, com asfalto.

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Apesar das condições precárias da Vila na época, os moradores lembram com saudosismo os primeiros anos de moradia no bairro. Ex-barrageiro, João Xavier Neto, 60 anos, conta que depois das 22 horas fazer barulho era proibido. O país vivia uma ditadura e as regras eram rígidas por todos os lados. Se algum morador quisesse ouvir música em casa, lembra João, precisava ser em volume bem baixo. "Nas casas, tudo que um falava o outro ouvia. Uma vez eu estava ouvindo uma música e um vizinho tinha tomado uns golinhos e falou. ‘Oh vizinho, ergue um pouquinho que eu quero escutar’" , conta.

A vida tranquila no bairro, em contraste com os dias atuais, também faz parte das boas lembranças. Rondas eram feitas com frequência. Na entrada da Vila, guardas e uma cancela com segurança 24 horas controlavam a saída e entrada de moradores e visitantes. "Naquele tempo, podia fazer galinheiro e criar frango. As pessoas tinham confiança umas nas outras", diz o ex-barrageiro Sebastião Gomes da Silva, 81 anos, que deixou Porecatu, no Norte do estado, para tentar a vida em Foz do Iguaçu onde formou família e até hoje mora na Vila, agora também na companhia dos bisnetos.

Por outro lado, havia controle exagerado da vida social dos moradores. O extinto Jornal Nosso Tempo, na edição de 29 de abril de 1982, publicou uma matéria que criticava os excessos. "Esta concentração de quase mil pessoas vive dominada pelo medo, coagida por uma série de regras que ‘disciplinam’ desde o relacionamento entre vizinhos até a vida sexual dos moradores."

Contraste

Entre 2000 e 2007, a Vila C figurou entre as regiões com maior número de homicídios de Foz do Iguaçu. Nos últimos anos, o panorama melhorou, mas, por um tempo, o estigma colou no bairro, apelidado de ‘Cezão". "Em uma certa época, o pessoal tinha preconceito de quem morava aqui", diz Marcos Lino Simões, 32 anos. Ele nasceu na Vila e cresceu jogando bola na rua em um período no qual a violência estava distante do dia a dia dos moradores.

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Pedagoga do centro comunitário do bairro, Maria Tereza Tibes diz que hoje os principais problemas são falta de lotérica, bancos e mercados grandes. A Vila fica cerca de 20 quilômetros do centro de Foz e o trajeto de ônibus leva pelo menos 45 minutos. Como alternativa, os moradores podem frequentar o centro comercial da Vila A, que fica a sete quilômetros de distância.

Permanência de operários é que "salvou" o lugar

A permanência de barrageiros em Foz do Iguaçu fez a Itaipu rever a decisão de demolir a Vila C, conforme o projeto inicial. Joel de Lima, assistente do diretor-geral brasileiro de Itaipu, diz que o término da obra da hidrelétrica coincidiu com um período difícil na economia brasileira, a chamada década perdida, que inibiu investimentos no setor elétrico.

Sem muitas opções de barragens para continuar trabalhando, muitos operários decidiram permanecer em Foz do Iguaçu. "O plano inicial era desmobilizar. Os trabalhadores vieram das usinas da Cesp, 3 Irmãos e Ilha Solteira e quando as obras terminavam, raramente eles permaneciam nas cidades ", diz Lima.

Parte da massa dos desempregados que ficou em Foz foi trabalhar no comércio ou e em pequenos serviços. Mas, como a economia local não tinha capacidade para absorver tamanha mão de obra – no pico da construção a hidrelétrica chegou a empregar 40 mil pessoas – boa parte dos ex-barrageiros foi trabalhar no comércio informal do Paraguai, que estava em ascensão.

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As vilas

A Usina de Itaipu construiu pelo menos 4.750 mil moradias nos três conjuntos habitacionais. Enquanto a Vila C era destinada aos trabalhadores da construção civil, a Vila A foi edificada para funcionários com cargos técnicos e administrativos e a Vila B, para o alto escalão.