Desde terça-feira (1º) em Curitiba, o estudante de Direito paulista Felipe Lintz, 21 anos, garante que em nenhum momento o Movimento Brasil Livre (MBL), do qual é coordenador nacional, agiu com violência nas manifestações contrárias às ocupações das escolas. “Se alguém do MBL agredir um estudante das ocupações, a primeira atitude que teremos é fazer o boletim de ocorrência e entregar esse cara para a polícia. Não tem história”, enfatiza.
Em entrevista à Gazeta do Povo, o coordenador do MBL defende a PEC 241, que cria um teto para gastos da União, bem como a MP 746, que pretende flexibilizar o currículo escolar e adotar o ensino em período integral. Mas aponta erros na gestão do presidente Michel Temer nas duas situações. “A gente precisa de uma estrutura melhor para aplicar a mudança do ensino médio. E a MP não debate a questão da estrutura”, ressalta.
Como está a ação do MBL na tentativa de desocupar as escolas?
Estamos acompanhando as reintegrações de posse, pedindo orientação de advogados, pressionando o Ministério Público e conversando com a Polícia Militar para garantir nossa segurança nas manifestações. A gente tem feito a cobertura ao vivo das reintegrações de posse. Estamos chamando os manifestantes para a porta dos colégios e mostrando que os pais e alunos têm que se manifestar contra as ocupações, mostrar sua indignação. Esse é o ponto mais importante do trabalho que estamos desenvolvendo aqui.
Qual a orientação do MBL para quem vai se manifestar contra as ocupações?
A orientação é nunca reagir, porque a agressão deslegitima o nosso movimento. Nenhum pai, nenhum aluno nosso agrediu ninguém. O máximo que ocorreu foram discussões mais acaloradas. Mas nenhuma agressão física. A gente tem observado agressão do outro lado. Há alguns pais do nosso movimento que chegam com o ânimo mais exaltado, mas nunca para agredir. Gritam mais forte, mostram sua indignação. E nesses casos isolados a gente sempre controla. Sempre que tem alguém mais exaltado eu sou o primeiro a chegar e a tentar acalmar. A violência não faz parte do MBL.
Você acha válido o uso de força policial nas desocupações?
Não. O importante é a polícia acompanhar para manter a ordem. A polícia não tem que retirar ninguém no braço, porque isso não adianta. Descer o pau nos caras não é correto. O MBL não apoia isso. Apoia que a polícia esteja junto para garantir a ordem na reintegração de posse.
Se alguém do MBL se exceder nas manifestações, qual o procedimento das lideranças?
Se alguém do MBL agredir um estudante das ocupações, a primeira atitude que teremos é fazer o boletim de ocorrência e entregar esse cara para a polícia. Não tem história. A gente não pode tolerar isso. Mas até agora não aconteceu nenhum caso de alguém chegar às vias de fato.
Por que não há um diálogo entre vocês e os líderes das ocupações?
Eu já propus o debate, mas eles não querem. Muitas vezes há pessoas mais moderadas dentro desses movimentos. Mas, para alguns, quando você diz que vai convidar o MBL para um debate, não tem diálogo. A gente está disposto ao diálogo. Vou nas ocupações e falo “vamos debater”, mas imediatamente começam a me xingar. Aí fica uma coisa boba, em que não se evolui.
Se tivesse havido diálogo, você acredita que a situação teria chegado a esse nível em que está?
Acredito que através do diálogo as coisas podem se resolver de forma mais eficaz. Mas eu não acredito que eles queiram o diálogo. Eu já estou cansado de entrar em contato com eles e pedir o debate. Passo meu número e ninguém retorna.
Por que o MBL é favorável à PEC do Teto ?
O governo precisa estabelecer um limite após 13 anos de gastos descontrolados, é necessário fazer um controle. Colocando um teto e fazendo investimento em áreas com mais prioridades e economizando em outras, o governo sinaliza para o mercado que está sendo responsável e consegue amenizar o impacto das agências de risco que rebaixaram o Brasil e, consequentemente, dificultam os empréstimos. É difícil conseguir crédito para investir em infraestrutura e até mesmo para educação e saúde se a administração do país é irresponsável.
É um mal necessário?
É um remédio amargo, mas necessário. A PEC precisa de algumas mudanças, precisa ser aperfeiçoada, mas de maneira geral é bem-vinda. O país precisa mostrar aos credores que sabe pagar dívida. Fomos gastando, gastando, na base do populismo, querendo gerar crédito no mercado, mas sem planejamento. E a hora de pagar essa conta é agora. A gente precisa desse remédio amargo para que no futuro a situação não fique ainda mais calamitosa. Mas a PEC sozinha não vai resolver. A gente precisa da reforma tributária, da reforma previdenciária. A PEC é um paliativo. Não adianta passar a PEC e essas reformas ficarem de lado.
Qual sua opinião sobre o argumento de que a PEC poderia limitar os investimentos em saúde e educação?
Existe o piso constitucional de investimento em saúde e educação e isso não vai ser alterado, porque seria inconstitucional. Quando impuserem um limite de gastos de acordo com a inflação do ano anterior, a gente vai começar a ver com responsabilidade os investimentos que precisam ser feitos. Não vai mais ser feito de forma desordenada. É preciso ter controle sobre isso.
E por que vocês defendem as mudanças no ensino?
A MP vai trazer mais flexibilidade ao aluno. Tira a obrigatoriedade de algumas disciplinas, mas não as exclui. Além disso, insere o período integral. Claro, é necessário uma estrutura melhor. A gente sabe que não tem estrutura para isso, que vai precisar de mais contratação de professores e remuneração melhor desses docentes. A MP não debate essa questão da estrutura. Mas o caminho desse debate não é invadindo escolas.
Se o governo aprovar a MP e não investir em estrutura, o ensino pode ficar ainda pior?
Eu acredito que sim. Não adianta implementar o período integral e não ter professor capacitado para poder fazer uma atividade diferenciada com os estudantes, como uma aula de música.
E o MBL está cobrando o governo para implantar essa estrutura para que as mudanças da MP possam realmente ser executadas?
Vou ser sincero, quanto ao debate com o governo Temer, com o ministro [da Educação] Mendonça Filho, não é uma pauta do MBL. Não posso falar que estamos discutindo [com o governo], porque não estamos. É uma pauta que defendemos, mas não estamos incisivamente discutindo [com o governo]. A gente quer estimular o debate entre as pessoas. A gente não está pegando a bandeira e defendendo, articulando, ligando para deputados, como a gente fez no impeachment.
Não valeria pressionar o governo para que faça a mudança no ensino de forma certa, com a estrutura necessária?
Sim. Mas quanto a isso não posso falar, porque não tenho conhecimento de conversas do MBL com o Mendonça Filho. Nós queremos estimular o debate. Mas admito que a gente precisa ter um debate maior em relação à MP com o governo.
Vocês estão orientando os estudantes que se sentirem prejudicados pelas ocupações a entrar na Justiça?
Estamos orientando os estudantes a buscar seus direitos. Por causa do calendário das universidades, os alunos das escolas ocupadas, que vão prestar o Enem depois, em dezembro, podem sair prejudicados. O estudante que prestar o Enem nos dias 3 e 4 de dezembro não vai ter tempo de se matricular aqui na Federal do Paraná, por exemplo. Não vai dar tempo de fazer a matrícula, porque a nota do Enem sai 31 de janeiro, mas a matrícula é de 20 a 25 de janeiro. Aí o cara já não entra. Ou seja, o aluno pode ficar sem a chance de entrar na faculdade do sonho dele porque vai ter a nota [do Enem] mais tarde. E aí vai ter que escolher outra universidade. Por isso é completamente legítimo buscar seu direito.
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