Agradecimento
Gratidão pela ajuda e pimenteira para espantar o mau olhado
"Eu não sabia que tinha tantos amigos. Alguns eu conhecia só de vista, quando estacionavam o carro aí na frente. Cantei Viva a Rosa" quando voltei. Teve quem chorou ao me ver", diz a tímida Araci Minaif, com a mão na terra e olhos nos olhos, os seus, muito azuis. Ela conta detalhes da recepção que lhe deram ao ser liberada do Asilo São Vicente, ao qual agradece, com todos os sinais de lucidez destacados por seus amigos. O momento que vive é bem particular. Araci admite que precisa se tratar. Depois da última devassa da prefeitura para limpar o terreno, sobrou pouco dos móveis, roupas e dos bichos que colecionava e cuidava. Ela chegou a ter 50 galinhas e uma dezena de gatos. Hoje, sua granja se resune a uma meia dúzia de animais.
Ela conta que tudo aconteceu de repente, ao se ver sem dinheiro para comer e para tratar dos animais. "O pessoal dizia: passa lá em casa que tem. Eu ia, pegava, ia juntando..." Há poucos anos, conseguiu receber aposentadoria, mas chegou a perder a casa para parentes. Contou com a ajuda de outra voluntária, a advogada Rogéria Dotti, para valer seus direitos. "Já me ofereceram muito dinheiro pelo terreno, mas não quero sair da minha casa", avisa. Por vias das dúvidas, os amigos já plantaram uma pimenteira nos canteiros da sacada.
Há dez dias, o Alto da XV, em Curitiba, viveu uma espécie de "ano-novo" fora de hora. De longe dava para ouvir o barulho dos foguetes, e nem havia Atletiba. Ficou difícil passar de carro na esquina das ruas Fernando de Barros com Dias da Rocha, na altura do número 586, onde 50 pessoas deram de ombros para o frio e o sereno e decidiram comemorar até tarde da noite ao lado da vizinha Araci Minaif, 74 anos. Ela acaba de voltar para casa, depois de dois meses de internamento compulsório no Asilo São Vicente, no Juvevê.
Incomum? Tudo é incomum na história da mulher que há quase uma década se tornou uma espécie de celebridade involuntária num dos bairros mais tradicionais e caros da cidade. Nascida e criada no mesmo endereço, Araci é uma solitária urbana, figura cada vez mais comum nos grandes centros. Em curto espaço de tempo perdeu os pais o marceneiro Alfredo e a dona de casa Julieta ; o único irmão, Acir; e o emprego de doméstica, depois de 30 anos a serviço da mesma família.
Provavelmente em resposta a tantas ausências, a moradora começou a juntar lixo orgânico e reciclável na sua casa de madeira exemplar típico da Curitiba que ainda tinha quintais. Ela vendia ovos, galinhas e latinhas de alumínio, mas também guardava material em excesso e sem serventia. O cenário era assustador e havia riscos à integridade física da moradora. Araci é guardadora compulsiva ou acumuladora.
Numa das quatro tentativas da prefeitura de controlá-la, em 2009, funcionários municipais retiraram 20 toneladas de material da residência parte deles, diga-se, ali jogados por moradores da região. Havia incomodados, como era de se esperar. Mas, em paralelo, Araci sem perceber formou uma rede de amizade com cerca de 20 vizinhos. Eles falam com afeto da mulher que sempre sabe das notícias, da previsão do tempo e que, à sua maneira, cuida da rua. Foram eles que se rebelaram contra a decisão do Ministério Público (MP) Estadual de interná-la no São Vicente, depois do processo de interdição movido por um primo.
"Araci tem esse problema, mas é absolutamente lúcida e capaz de viver na casa onde nasceu se for medicada e atendida em domicílio pelo poder público", defende a empresária Lilian Seleme, uma das moradoras próximas que formou o grupo "Amigos da Araci", ao lado do marido, Élcio Modro. Durante os dois meses de reclusão da amiga, os afiliados e simpatizantes bateram ponto no MP e no asilo, não deixando de encorajar a idosa.
"Nós cuidamos"
Poucos dias antes da liberação de volta para casa, mas não do processo de interdição, cinco deles se comprometeram formalmente com a promotora Terezinha Resende Carula, da Promotoria do Idoso do Ministério Público, a cuidar de Araci. Não foi difícil: o grupo já tinha firmado o compromisso verbal com as autoridades.
As ações a favor de Araci são visíveis. Há banners agradecendo as empresas que já doam material para a reforma da casa. Erguida na década de 1940, a construção está avariada. Tijolo, areia e pedra chegaram para a construção de um novo muro, evitando que passantes joguem detritos no quintal. Tudo foi limpo, os quartos reequipados e um banheiro construído. Duas cuidadoras voluntárias dormem na residêcia da idosa e a ajudam a se organizar, inclusive na rotina dos novos medicamentos. No dia em que recebeu a Gazeta, fazia a bainha de uma saia. "Vou vesti-la para ir ao médico."
Serviço:
Para doar telhas, tijolos e demais materiais de construção, escrever para elcio@madroeselemepapeis.com.br ou martinshugo59@hotmail.com.
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