Nenhuma organização pró-vida do mundo é tão popular na internet quando a Live Action, fundada em 2003 na Califórnia. Liderada por mulheres, e com um conteúdo voltado para os jovens, o grupo alcança milhões de pessoas com seus vídeos e artigos sobre a realidade da indústria do aborto nos Estados Unidos. Em entrevista concedida à Gazeta do Povo, a Diretora de Parcerias Estratégicas da organização, Joanna Hyatt, falou sobre o prognóstico de mais uma juíza pró-vida na Suprema Corte dos Estados Unidos, a possibilidade de se reverter a decisão sobre o aborto legal no país e apresentou sugestões para que a causa do aborto não prospere no Brasil. A primeira recomendação: não baixar a guarda.
Os números mostram queda na quantidade de abortos nos Estados Unidos nos últimos anos. Na sua avaliação, o quanto disso tem a ver com o movimento pró-vida?
Eu diria que muito dessa redução no número de abortos é consequência do movimento pró-vida, que está se tornando melhor em comunicar às pessoas a humanidade da criança e em explicar como o aborto prejudica as mulheres e a sociedade. Cada dia vemos mais pessoas escolhendo a vida, porque elas percebem que é realmente um ser humano que é morto em cada aborto.
Estados como o Alabama aprovaram recentemente legislações para aumentar as restrições sobre o aborto. Por outro lado, outros estados, como Nova York, deram passos na direção contrária. É possível avaliar qual é a tendência geral nos Estados Unidos no que diz respeito às legislações sobre o aborto?
De fato, parece que estamos indo em duas direções bem opostas, em termos de legislação estadual. Mas eu diria que, em geral, o que eu vejo é uma tendência na direção da proteção da vida. Há uma pesquisa publicada, em 2019, segundo a qual três em cada quatro americanos são a favor de limitar o aborto ao primeiro trimestre de gestação, e dentre esses mais de seis em cada dez se identificam como “pró-escolha” (termo usado para definir os defensores do aborto legalizado). Estamos vendo uma mudança, de forma geral, na direção da proteção da vida, reduzindo o período da gestação em que os abortos podem ser feitos, colocando mais restrições conforme as pessoas percebem que se trata de uma vida humana. Estados como Nova York, Virgínia e Vermont estão em descompasso com o público americano e com seus próprios eleitores.
Ainda assim, pesquisas têm demonstrado que o número de pessoas que se dizem “pró-escolha” é ligeiramente maior do que as que se dizem “pró-vida” nos Estados Unidos. Esses termos são de fato precisos?
Muitas vezes, quando as pessoas dizem que são pró-escolha, nós descobrimos que elas são contra o aborto, exceto nos casos de estupro, incesto ou risco de vida para a mãe. Bem, isso também poderia ser definido como “pró-vida com exceções”. Temos que olhar o que as pessoas querem dizer com essas respostas, porque nós não temos um consenso sobre o que pró-vida ou pró-escolha significa quando usamos esses termos. Indo mais a fundo, nós vemos que as pessoas estão mais do lado da vida do que do lado do aborto até os nove meses, sem restrição, pago pelo governo. Esta não é uma posição que a maioria das pessoas apoia.
O Partido Democrata tem se tornado cada vez mais pró-aborto, impondo restrições à ala pró-vida, que sempre foi minoritária, mas tradicionalmente tinha alguma representatividade. Cada vez mais, as pessoas presumem que a causa pró-vida se alinha automaticamente com o Partido Republicano. O quanto isso prejudica o movimento contra o aborto?
Como movimento, o que nós perdemos é a habilidade de fazer disso uma luta bipartidária, de achar esse denominador comum nos partidos. Mas acho que é pior para os democratas, que tentam expulsar qualquer um que seja pró-vida, do que é para a causa pró-vida em si. A Live Action especificamente não se alinha com um partido ou outro. Eu diria que os democratas estão tratando isso como uma questão partidária em vez de tratar da proteção da vida humana. É uma má escolha da parte deles, porque não representa as pessoas do partido. A elite do partido está forçando essa exigência de que os membros têm de ser a favor do aborto. E vemos grupos como os “Democratas Pró-vida” dizendo: “E nós? Onde nós ficamos nesta conversa?” Porque eles acreditam na proteção da vida humana, mas não se veem como republicanos. E quanto mais os democratas fazem isso, mais eles estão forçando essa polarização. Vai ser bem interessante ver o que acontece nos próximos anos, nas eleições, conforme os partidos escolhem suas posições nesse tema.
É adequado descrever o debate sobre o aborto como sendo um debate entre ciência e religião?
A ciência tem ajudado muito a causa pró-vida. A grande ironia é dizer que é esta uma questão de ciência versus religião, quando na verdade a ciência e a religião apoiam a causa pró-vida. A ciência nos deu uma janela para o útero. Ela nos deu, por meio dos ultrassons, a habilidade de ver o que exatamente está acontecendo, entender o desenvolvimento da criança e perceber o quão formada essa criança é já em uma etapa muito inicial da gestação. Aqueles que defendem o aborto estão negando a realidade da ciência. O nascituro é um indivíduo único, que está carregando seu próprio DNA, e é um ser humano que merece ser protegido. A ciência está prejudicando aqueles que querem defender o aborto porque cada vez mais há uma geração crescendo com acesso a imagens de ultrassom, vendo os órgãos, os detalhes, e percebendo que uma criança tem um desenvolvimento milagroso desde os estágios iniciais. Conforme a ciência continua a avançar, ela vai continuar fortalecendo o movimento pró-vida.
Qual foi o tamanho do impacto da decisão conhecida como Roe X Wade, em 1973, quando a Suprema Corte dos Estados Unidos reconheceu o direito ao aborto em todos os estados americanos?
A decisão de Roe x Wade, de alguma maneira, galvanizou a causa pró-vida, porque de repente percebemos: “Nós achávamos que era claro para todo mundo que isto é errado, mas a Suprema Corte, de forma injusta, decidiu que isso é um direito no país inteiro”. E, então, nós vimos mais abortos acontecendo. E isto é comum, porque quando você legaliza algo você está dizendo às pessoas que esse é um comportamento aceitável. Ao legalizar o aborto em todo o país, a Suprema Corte retirou os direitos dos estados de protegerem os bebês. Mas isso também incentivou as pessoas a dizer: “Nós agora temos que lutar por isso, porque nós percebemos que nós tínhamos perdido algo que parecia ser tão óbvio”. E é óbvio: aquela é uma criança, um ser humano distinto. O fato de que esse assunto não morreu, apesar de terem se passado 47 anos desde a decisão da Suprema Corte, mostra o quão robusto é o movimento, e também mostra o quão justa é essa demanda. Se não estivéssemos falando de seres humanos, nós não continuaríamos a lutar, mas se trata de seres humanos. E eu aplaudo as pessoas que trabalharam no movimento pró-vida por anos para que nós não perdêssemos isso de vista, apesar do que diziam as leis. Quem sabe, nós podemos estar bem perto de ver isso ser revertido.
O que você achou da nomeação da juíza Amy Coney Barrett para a Suprema Corte?
Eu não ponho minha confiança em juízes. Nenhum de nós põe, porque já vimos chegar à Suprema Corte juízes que achávamos que iriam interpretar a Constituição corretamente e entender que não existe o direito ao aborto, e ainda assim eles protegeram a jurisprudência do caso Roe x Wade. Mas eu acho que nós nunca estivemos tão perto de ver Roe x Wade revertido. A Amy Coney Barrett parece ser uma originalista, o que significa que ela olha para a Constituição e vê o que a Constituição de fato diz, em vez de mudá-la e adaptá-la constantemente. Nesse sentido, nós a enxergamos, sim, como uma grande escolha. Esperamos ver não só Roe x Wade revertido, mas ver a Suprema Corte dizer que vai desfazê-lo porque foi uma má decisão jurídica, tomada sobre fundamentos frágeis, e que a Corte também vai dar um passo a mais e dizer que vai proteger a criança porque ela é uma pessoa digna de direitos. E isso é importante porque, se nós apenas revertermos o Roe x Wade, o assunto volta para os estados. E então os estados vão decidir se eles querem legalizar o aborto. Mas se a Suprema Corte reverter o Roe x Wade e estabelecer que está fazendo isso porque se trata de um ser humano, isso sim protegerá as crianças.
Hoje, qual é o principal público da Live Action?
A Live Action atua principalmente online. Nós temos o maior número de seguidores do movimento pró-vida. Olhando para todas as plataformas, temos 4,7 milhões de pessoas nos seguindo. Nós alcançamos milhões de pessoas toda semana com nossos vídeos e nosso site de notícias. Estamos nos conectando com os jovens entre 18 e 35 anos, e isto é importante porque estas são as pessoas que estão, em suas próprias vidas, tomando decisões sobre fazer ou não um aborto, encorajar ou não seus amigos a escolher a vida. Essa também é uma geração que está começando a votar e que vai liderar nesse tema e influenciar em suas comunidades localmente, no nível estadual e no nível federal. Então, ao atingir esse grupo demográfico que tem tanta paixão e desejo de estar envolvido, vemos essa nova geração começando a compreender o que está em jogo, e começando a defender a vida. Eu realmente acredito que isto está pavimentando o futuro para uma cultura de vida, porque eles estão crescendo para ser os futuros pais e líderes da nossa nação.
Como o Brasil, que ainda tem leis bastante conservadoras sobre o aborto e uma maioria declarada de pessoas pró-vida, pode se prevenir para que a legalização não aconteça, como aconteceu nos Estados Unidos?
Eu diria em primeiro lugar: não dê por garantido que, só porque vocês têm leis que protegem o nascituro, esse ainda vai ser o caso daqui seis meses ou dois anos. A realidade é que os que apoiam o aborto estão sempre, e sem trégua, pressionando pela legalização do aborto onde quer que ele ainda não seja legal. Há um interesse financeiro nisso. Além disso, baseiem-se na ciência. Baseiem-se no fato de que existe ciência para demonstrar o que está acontecendo no útero. Mostrem a ciência, falando sobre o que acontece na fertilização, quando o sexo do bebê é determinado e um DNA único é criado. Mostrem que aos 22 dias vemos o coração bater, e que na quarta ou quinta semana o bebê tem olhos, pulmões. Além disso, contem histórias que mostrem o valor da vida. Histórias de mulheres que escolheram a vida mesmo quando elas tinham um diagnóstico terminal para suas crianças, mesmo quando suas vidas estavam em perigo, mesmo quando as circunstâncias pareciam menos do que ideais para trazerem uma criança ao mundo, e elas escolheram a vida e a criança provou ser um grande presente e uma bênção. E não desistam de prestar atenção ao que acontece politicamente, estejam atentos para votar em pessoas que continuam defendendo a vida. É preciso ser consistente no apoio a candidatos que são claramente pró-vida, e não se esquecer de educar a nova geração, e então a seguinte. Toda geração tem a responsabilidade de formar a próxima geração após ela para continuar defendendo a vida.
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