De abstinência sexual ao descarte de métodos contraceptivos como o preservativo e o dispositivo intrauterino (DIU). Essas são algumas das narrativas que circundam o debate sobre a nova campanha de prevenção à gravidez precoce, "Tudo tem seu tempo: adolescência primeiro, gravidez depois", lançada pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) em parceria com o Ministério da Saúde.
Apresentada na última segunda-feira (3), a proposta, na verdade, não prega a abstinência sexual ou descarta métodos contraceptivos. Tampouco é voltada para adultos. Rebatendo críticas, a ministra Damares Alves defendeu que a proposta não tem teor moral e o objetivo é apenas induzir adolescentes à reflexão sobre os perigos da gravidez precoce.
Confira, abaixo, os 5 mitos mais difundidos sobre a campanha:
Mito 1: A abstinência sexual será imposta pelo governo
A proposta não recomenda, explicitamente, a abstinência sexual aos adolescentes, como vinha sendo polemizado. As duas pastas, que, em esforço conjunto, comandam a ação, afirmaram que se trata de uma campanha com o objetivo de reduzir os altos índices de gravidez precoce no país.
Em nenhum momento da apresentação ou nos conteúdos publicitários, usou-se o termo "abstinência sexual", embora Damares tenha dado indícios de que, em um futuro breve, poderão ser elaboradas outras ações para que o jovem não se sinta obrigado a fazer sexo por pressão social. "Nós vamos falar sobre retardar o início da relação sexual. Trazer todo o bojo de métodos preventivos que já existem e também o 'reflita, pense duas vezes'", disse ela.
Questionado, o titular da pasta de Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou que, embora o estímulo ao adiamento do início da atividade sexual entre adolescentes não seja o foco da campanha, indiretamente ela poderá incentivar "comportamentos mais responsáveis".
"Acho que ela vai motivar. Quando fala 'adolescência primeiro, gravidez depois', e fala das consequências, ela vai motivar uma série de debates. Um dos debates que vai ter é, sim, 'eu me reservo o direito de ter atividade no momento em que achar melhor'", disse. "Se você quiser entender isso como abstinência, eu não entendo como abstinência. Eu entendo como comportamento mais responsável".
Mito 2: A campanha é para adultos
A campanha do governo não pretende sensibilizar adultos a respeito do momento apropriado para o início da atividade sexual ou para uma gravidez. O público-alvo da campanha são, exclusivamente, os adolescentes e seus pais ou responsáveis.
"Quando a gente fala de gravidez de adolescente, todo mundo tá pensando na menina de 15 anos [...], eu quero dizer para vocês que eu não estou trabalhando com a idade de 15, 17, eu quero falar da menina de 10 anos", disse a ministra Damares. "O Congresso estabeleceu, no ano passado, que é proibido casar com menos de 16 anos no Brasil. Nós temos uma lei impondo uma regra. E também temos o Código Penal dizendo que sexo com menor de 14 anos é estupro".
Mito 3: Não há comprovação científica de que falar de abstinência sexual dê resultados no combate à gravidez precoce
Nos Estados Unidos, onde as escolas de 34 dos 50 estados incluíram no currículo de educação para a saúde, o tema da abstinência sexual, houve redução o número de adolescentes grávidas. O estado de Ohio, por exemplo, que disponibiliza cartilhas sobre abstinência sexual para os alunos viu o número de adolescentes grávidas cair 64% em 25 anos (entre 1991 e 2016).
Documento científico divulgado em janeiro pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) cita o exemplo americano: "O que ensina a experiência americana? Estudos publicados a respeito da eficácia de programas de educação sexual naquele país demonstraram que estratégias combinadas são mais efetivas do que aquelas isoladas. Ou seja, os resultados evidenciam efeitos favoráveis das abordagens abrangentes com redução do risco em todos os indicadores."
A SPB reconhece, portanto, que a abordagem ideal inclui orientação para abstinência associada à educação e ao acesso ao uso de contraceptivos, exatamente o que propõe o governo.
A entidade representativa dos médicos pediatras brasileiros erra, no entanto, ao afirmar que a proposta da ministra Damares Alves, indica a "abstinência como método eletivo". - O governo enfatiza que a campanha não é pela abstinência, mas sim pela reflexão sobre o melhor momento de iniciar a vida sexual, junto com a já tradicional distribuição de preservativos.
Mito 4: O governo vai descartar outros métodos contraceptivos
Simultaneamente à campanha, o Sistema Único de Saúde (SUS) continuará ofertando métodos que contribuem com a prevenção da gravidez precoce, como preservativos femininos e masculinos, pílulas, DIU, diafragma e anticoncepcionais injetáveis.
Ao longo do ano de 2020, por exemplo, o Ministério da Saúde pretende distribuir cerca de 570 milhões de preservativos em todo o país. Além disso, as Unidades Básicas de Saúde oferecem atendimento individualizado a adolescentes sobre planejamento familiar, vida sexual e saúde reprodutiva.
Damares, no entanto, cita preocupação sobre o uso de pílulas no país e diz ser preciso "conversar" sobre o assunto. "Estamos vendo um uso exagerado desse método. Daqui a 20 anos, quantas mulheres poderemos ter no Brasil com câncer de mama ou outras doenças geradas pelo uso exagerado da pílula do dia seguinte?", disse. "Precisamos conversar com essas meninas".
Mito 5: O tema "abstinência sexual" vai ser discutido nas escolas
Embora destinada a adolescentes, a campanha não será adotada por escolas públicas. Também não está previsto que o tema "abstinência sexual" entre no currículo das aulas de educação sexual, a princípio.
Segundo Damares, o Ministério da Educação (MEC) não participa da ação por uma questão de calendário escolar. A lei determina que a Semana de Prevenção à Gravidez na Adolescência, à qual é associada a campanha lançada na segunda-feira, aconteça na primeira semana de fevereiro. As escolas, em sua maioria, voltam às atividades no fim do mês.
Os ministros, no entanto, deram indícios de que as pastas planejam, sim, levar a ação para dentro das escolas. Eles citaram, por exemplo, a possibilidade de elaborar cartilhas sobre o tema. E querem propor que novas músicas não exaltem, apenas, o sexo entre adolescentes. "Teremos rodas de conversas, teremos arte, em vez de a música cantar só sobre sexo com as novinhas, por que não fazer diferente?", disse Damares.
*Colaborou: Cristina Graeml.
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