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Julgamento simbólico

Acusadores pedem “condenação” de Bolsonaro por genocídio no Tribunal dos Povos

Tribunal Permanente dos Povos tem júri com representantes de esquerda e progressistas para julgar Bolsonaro por "crimes contra a humanidade". (Foto: Reprodução / YouTube)

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O presidente Jair Bolsonaro (PL) agiu deliberadamente para promover o genocídio de parte da população brasileira, de acordo com a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns (Comissão Arns), a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Coalizão Negra por Direitos e a Internacional de Serviços Públicos (ISP). A acusação foi levada ao Tribunal Permanente dos Povos (TPP), uma organização criada em 1979. O TTP está instalado em Roma e, no início do ano, acatou a denúncia de crime de genocídio contra o presidente brasileiro. O julgamento simbólico ocorreu na terça-feira (24) e na quarta-feira (25), mas o resultado final deve ser divulgado apenas em julho.

Durante oito horas, disponíveis no YouTube neste e neste link, porta-vozes progressistas realizaram uma série de discursos contra o presidente e eles foram transmitidos a partir do auditório da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

De acordo com os argumentos dos acusadores contra o governo federal, mulheres, profissionais de saúde, negros e, especialmente, indígenas teriam sido dizimados ao longo dos últimos três anos e meio, de forma proposital, utilizando, inclusive, a pandemia como arma.

Momentos de contestação

Gianni Tognoni, secretário-geral do TPP, afirmou que o governo brasileiro foi convidado a apresentar uma defesa. “A acusação foi recebida no gabinete do senhor Jair Bolsonaro, em 6 de maio. O governo não se manifestou, como esperávamos”.

De fato, o Itamaraty se manifestou para a imprensa e ressaltou que o tribunal não tem atividade reconhecida pela Convenção de Genebra. Nestes casos, o TPP coleta documentos oficiais para utilizar como fontes primárias e, assim, averiguar a veracidade das acusações.

Apesar do constante clima de hostilidade ao governo, da parte dos acusadores, o embaixador Rubens Ricupero, que participou da sessão, questionou: “Não ficou claro se a extinção de povos ocorreu em função de eventos recentes como a pandemia, ou do ingresso de garimpeiros e madeireiros ilegais, ou das ações do governo”. Ao longo do evento, os jurados, que acompanharam as falas de São Paulo a partir de Roma, apresentaram questões semelhantes.

Sobre a falta de máscaras nos hospitais, apontada como um suposto indício de tentativa de genocídio contra os profissionais de saúde, uma jurada apontou: “A máscara é um produto de baixo nível tecnológico, muitos países compram da China e a cadeia logística foi rompida. Existem questões que não são atribuíveis a Bolsonaro, é algo que aconteceu em outros países também”.

O júri também pediu, sem sucesso, números e nomes de tribos indígenas supostamente massacrados, de forma proposital, a mando do governo. O resultado do julgamento deverá ser publicado no final de julho.

Discursos longos

“Milhares morreram em consequência da necropolítica desse sujeito que se chama Jair Messias Bolsonaro, obcecado por temas como voto impresso, excludente de licitude, posse de armas e exploração das Amazônia. As populações indígenas, quilombolas e ribeirinhas sofrem com o governo que despreza suas necessidades”, argumentou, por exemplo, o advogado José Carlos Dias, que durante a ditadura militar defendeu presos políticos.

“Jair Bolsonaro impõe a todos e todas um governo de destruição. E encontrou na pandemia uma oportunidade de avançar sua agenda antidemocrática. A intencional propagação da pandemia significou a inação frente a medidas que permitiriam que as pessoas ficassem em casa”, assegurou, de seu lado, a advogada especializada em direitos humanos Eloísa Machado, integrante Comissão Arns.

“Ele promoveu, através de seu desgoverno, várias ações e omissões que vieram a agravar os problemas dos povos indígenas. Tivemos, nestes três anos e meio, um cenário comparável pela ditadura militar”, comentou, de sua parte, Dinaman Tuxá, coordenador executivo da Apib. Ele foi uma das várias lideranças indígenas convocadas para falar, todas contrárias ao governo, a maioria ligada, de uma forma ou outra, à associação.

Maurício Terena, advogado e assessor jurídico da Apib, citou o passado: “Genocídio de povos isolados, ataques de pistoleiros. Estamos sendo mortos no campo desde que esse país de Pindorama passou a se chamar Brasil”. Mas também culpou o atual governo: “Bolsonaro sempre representou um atraso ético, civilizacional e democrático”. A liderança indígena Auricélia Fonseca também misturou o passado com o presente: “Quantos povos indígenas já foram dizimados em pandemias anteriores! Também fomos dizimados nessa pandemia, e isso é responsabilidade desse governo”.

Humberto Costa, senador por Pernambuco desde 2011 e membro do Partido dos Trabalhadores (PT), também se manifestou. Mas a organização omitiu sua relação com o PT, partido ao qual é filiado desde 1980 e pelo qual foi ministro da saúde do governo Luís Inácio Lula da Silva. Por sua vez, a professora aposentada da USP Maria Victoria Benevides, fundadora da fundação Arns, declarou, ecoando um mote de Lula que ele citou ao se tornar presidente em 2002: “Esse já foi o país da esperança”.

Tribunal Permanente dos Povos

O Tribunal Permanente dos Povos surgiu em 1979 e foi inspirado pelo Tribunal Internacional de Crimes de Guerra, criado em 1967 pelos filósofos Bertrand Russell e Jean-Paul Sartre. O objetivo era julgar as ações do exército dos Estados Unidos no Vietnã. Entre os jurados estavam o político e jornalista socialista italiano Lelio Basso, o ativista marxista americano Ralph Schoenman e o escritor argentino Julio Cortázar.

Desde o final da década de 1970, o TPP se dedicou a julgar ditaduras militares, exclusivamente de direita, e foi presidido por comunistas famosos, como o advogado Lelio Basso, senador eleito pelo Partido Comunista Italiano (PCI). Desde então, o tribunal se manteve ativo, ainda que seus julgamentos tenham valor apenas simbólico.

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