Indiciado por duplo homicídio, o ex-deputado estadual Fernando Ribas Carli Filho compareceu perante o juízo pela primeira vez ontem, um ano e três meses após o acidente de trânsito que causou as mortes de Gilmar Rafael Yared, 26 anos, e Carlos Murilo de Almeida, 20 anos. Carli Filho foi interrogado pelo juiz Daniel Ribeiro Surdi de Avelar na 2.ª Vara do Tribunal do Júri, em Curitiba.
Apesar do interrogatório, o juiz ainda não decidiu se o ex-deputado irá a júri popular, acusado de duplo homicídio com dolo eventual (quando assume o risco de causar mortes), ou se será julgado na Vara de Trânsito, pelo crime de homicídio culposo (sem intenção de matar). A definição não ocorreu em razão da falta do depoimento de duas testemunhas de defesa do ex-parlamentar. Hoje, uma delas deve ser ouvida, por meio de carta precatória, em São Paulo. A outra, que mora em Blumenau (SC), ainda não foi localizada e não há data para ser ouvida. O processo já tem nove volumes com mais de 200 páginas cada.
Somente quando as cartas precatórias chegarem ao juiz, o Ministério Público (MP), a assistência de acusação e a defesa poderão fazer as alegações finais. Os advogados das famílias das vítimas esperam que ao menos o testemunho de São Paulo chegue em três dias.
Cumprida essa etapa, cada parte terá cinco dias para fazer as últimas alegações. O juiz, então, terá dez dias para pronunciar sua decisão se o caso vai a júri popular ou não (veja gráfico ao lado). Apesar de todo o trâmite judicial, Avelar analisa de forma positiva o caso.
Depoimento
O interrogatório de Carli Filho ocorreu de forma tranquila. O ex-deputado chegou por volta das 13 horas no Tribunal do Júri. Sem chamar atenção, entrou na sala de audiência acompanhado de seu advogado, Roberto Brzezinski.
Segundo o juiz Avelar, o ex-parlamentar respondeu a todas as perguntas com calma, sem fugir das respostas. O assistente do MP, advogado Elias Mattar Assad, afirmou que Carli Filho admitiu que ingeriu bebida alcoólica no dia do acidente. No entanto, o réu reafirmou que não se lembra do acidente, assim como fez no inquérito policial.
De acordo com Brzezinski, o choque entre os veículos causou um traumatismo craniano no ex-deputado que o fez esquecer do acidente. Ele conta ter laudos médicos que comprovam o lapso de memória de Carli Filho.
Sobre a ingestão de bebida alcoólica, a defesa de Carli Filho lembra que o próprio juiz desconsiderou o laudo que apontava teor de álcool no sangue do ex-parlamentar em razão do exame ter sido realizado enquanto ele estava inconsciente.
No entanto, o MP recorreu no Tribunal de Justiça. Ainda não há uma decisão sobre a validade do laudo. Questionado sobre as multas em nome do ex-parlamentar, Brzezinski ressaltou que o veículo do acusado era utilizado por outras pessoas do gabinete. Ele diz ainda que seu cliente não tinha conhecimento das multas. O advogado enfatiza que Carli Filho estava na preferencial pela Rua Ivo Zanlorenzi, enquanto as vítimas estavam na Rua Paulo Gorski.
Protestos
Dezenas de familiares e amigos das vítimas aguardaram o fim do interrogatório, que durou cerca de 50 minutos. A mãe de Carlos e a irmã mais velha de Rafael foram as únicas parentes a acompanharem o depoimento dentro da sala de audiência. "Nós merecemos uma resposta. Passou do limite a falta de punição. Merecemos uma resposta", afirmou a mãe de Rafael, Cristiane Yared.
Quando o procedimento terminou, Carli Filho saiu pela porta da frente do Tribunal do Júri. Na rua, foi recebido por dezenas de manifestantes que gritavam a palavra "assassino". Um deles atingiu com um pontapé o veículo do ex-deputado.
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Correção
Diferentemente do que foi publicado ontem, na reportagem "Juiz decide hoje se Carli Filho vai a júri popular", na Gazeta do Povo, o ex-deputado estadual Fernando Ribas Carli não está sendo processado por homicídio doloso duplamente qualificado. Ele responde apenas por duplo homicídio com dolo eventual (quando o motorista assume o risco de causar mortes).