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Adrianópolis terá um futuro concreto

Fernandelli voltou a Adrianópolis para assumir a gerência da mina da Supremo. Abaixo, a torre da fábrica que destoa na paisagem bucólica da cidade e as máquinas já em operação | Aniele Nascimento/Gazeta do Povo
Fernandelli voltou a Adrianópolis para assumir a gerência da mina da Supremo. Abaixo, a torre da fábrica que destoa na paisagem bucólica da cidade e as máquinas já em operação (Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo)
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Na última curva da BR-476 antes de chegar a Adria­nópolis, mesmo por detrás dos morros já dá para avistar um gigante de concreto que furou o horizonte: uma torre de 120 metros de altura, equivalente a um edifício de 40 andares, se ergue na cidade que não tem nenhum prédio. A estrutura é a parte mais vistosa da fábrica da Supremo Cimentos, que está em fase final de construção. Mas a mudança não é apenas na paisagem.

Encravada na região mais pobre do Paraná – o Vale do Ribeira – e marcada pelo histórico de contaminação por chumbo, Adrianópolis experimenta uma nova fase. Há a perspectiva de outras quatro fábricas de cimento se instalarem na cidade, tornando-a um polo industrial, mas também deixando mais expostos os problemas sociais e ambientais. "Não sei se vai ser bom morar aqui, mas para ganhar dinheiro vai ser bom", resume, em tom de brincadeira, o prefeito João Manoel Pampanini (PT).

Escaldada com problemas do passado, Adrianópolis está tentando não repetir os erros. Quando viveu o auge do desenvolvimento, nas décadas de 1980 e 90, chegou a ter 15 mil moradores. A economia girava em torno da Plumbum, empresa que explorava chumbo e empregava diretamente cerca de mil pessoas. Mas o fechamento da empresa, associado a um desastre ambiental deixou novamente a cidade estagnada. Mesmo integrante da Região Metropolitana de Curitiba, Adrianópolis estava isolada. A 120 quilômetros de distância da capital por uma tortuosa estrada de chão – asfaltada desde 2005, depois de 50 anos de luta –, a cidade sentiu os efeitos da falta de opções de saúde, educação e emprego.

Há dois anos, Adrianópolis tinha 5 mil moradores. A estimativa atual, com a chegada de apenas uma das cinco cimenteiras previstas, é de 9,5 mil pessoas estejam na cidade, com previsão de voltar a ter 15 mil habitantes até 2020. Esse crescimento acelerado exige ações para estruturar Adrianópolis. Por recomendação do Ministério Público, o governo estadual está realizando um estudo para avaliar os impactos financeiros, sociais e ambientais da instalação das cimenteiras e tentar planejar ações que possam evitar o caos futuro. A Gazeta do Povo esteve na cidade e relata os dois lados do progresso.

Caminhões vão saturar o único acesso à cidade

Em breve, não apenas as curvas da rodovia BR-476, concluída há menos de 10 anos, serão um problema para quem for a Adrianópolis. A estimativa é de que 500 caminhões carregados com insumos industriais ou cimento circulem diariamente pela pista. Esse é o fluxo previsto quando a Supremo Cimentos estiver no auge da produção. O aumento da frota circulando não inclui a movimentação que vem agregada à nova fase econômica. Como há a previsão de que novas fábricas se instalem no local, logo a capacidade da estrada estará saturada.

O maior problema de Adrianópolis, na opinião do prefeito João Manoel, é a falta de atendimento médico de emergência. Se um acidente acontecer ou alguém tiver um problema grave repentino de saúde, o jeito é enfrentar a estrada e rumar para os hospitais da região de Curitiba. João Manoel assegura que a oferta de médicos aumentou de 2 disponíveis para 10, mas eles ainda atuam apenas em prevenção e tratamento. Para urgência, não há estrutura ou pessoal.

Os dilemas ambientais também saltam aos olhos. Além da contaminação por chumbo, a cidade foi erguida dentro da área que deveria ser de mata ciliar, à margem do Rio Ribeira. Nem todas as casas têm água tratada e energia elétrica e a cidade não tem nem um metro de rede de esgoto. Apesar de um salto considerável nos últimos anos, Adrianópolis ainda amarga baixos índices de desenvolvimento humano.

Está ficando cada vez mais caro morar na cidade. Terrenos que estavam sendo negociados a R$ 6 mil, antes da instalação da fábrica, agora estão sendo ofertados por R$ 150 mil. O aluguel disparou e é difícil encontrar casa vaga – até residências em cidades vizinhas, a 40 quilômetros de distância, estão sendo requisitadas. Além da vila operária que foi erguida, a empresa chega a pagar adiantado um ano de locação para que pessoas construam ou reformem imóveis a serem alugados. A disparada dos preços prejudica principalmente as pessoas que ainda não tiveram as finanças positivamente impactadas pela movimentação econômica recente.

Descrentes de que as opor­tunidades de emprego vi­riam, os primeiros cur­sos ofertados na cidade tiveram baixa procura. Ho­je, os candidatos conseguem vaga antes de concluírem o estudo. Mesmo assim, foi necessário "importar" mão de obra. A maior parte dos operários da obra não é de Adrianópolis.

Oportunidade

Há pouco tempo, quem estivesse em Adrianópolis precisava atravessar a ponte e ir a Ribeira (SP) para achar um restaurante. Agora já são três na cidade. Vindo de Telêmaco Borba, onde mantinha uma cozinha industrial, Rafael Quadros se mudou para Adrianópolis quando a cunhada contou que uma grande empresa se instalaria na cidade. Montou um restaurante quando a terraplanagem da cimenteira estava sendo feita. Hoje, a fábrica responde por 90% do movimento. Rafael tem oito funcionários e pretende contratar mais. Começou preparando 30 refeições por dia e hoje já são mais de 100, além de 40 marmitas.

Mineradora deixou lastro de contaminação

Cerca de 700 moradores das localidades de Vila Mota e Capelinha, em Adrianópolis, devem passar por uma avaliação que dirá se estão contaminadas por chumbo. As localidades ficam nas imediações de uma mineradora que foi desativada na década de 90, mas que ficou ativa por mais de 50 anos trabalhando no refino e beneficiamento de chumbo. Em 2003, um estudo da Universidade de Campinas mostrou que centenas de crianças da cidade estavam contaminadas.

Há trabalhadores das minas que nunca mais conseguiram emprego com carteira assinada por causa do receio de se contratar gente "doente". A população continua exposta aos efeitos nocivos do chumbo, conforme relatório do Ministério da Saúde e da Secretaria de Estado da Saúde divulgado neste ano. O ambiente em um raio de cinco quilômetros está contaminado, incluindo solo, alimentos, animais e até a poeira domiciliar.

A Mineradora Plumbum esteve na cidade durante 65 anos, de 1930 a 1995. Na década de 1950 a empresa foi comprada por uma multinacional francesa. O grupo Trevo, do Rio Grande do Sul, comprou o terreno após a falência. Queria continuar a exploração, mas descobriu que já não era mais viável. Ficou com a missão de aterrar o local e cuidar do passivo ambiental deixado pelos antigos donos: 300 mil toneladas de resíduos de chumbo a céu aberto.

O terreno apresenta níveis de chumbo da ordem de 20.000 mg/kg de solo, 22 vezes maior do que o admissível pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental de São Paulo. Ficou espalhado em 50 hectares. Só as pilhas de rejeitos às margens do Rio Ribeira foram aterradas. Em apenas um hectare foram tomadas medidas para remover os rejeitos. A mineradora depositou os resíduos sólidos em vales entre as montanhas e dentro de túneis desativados.

Nos primeiros anos de atividade, a Plumbum jogou os rejeitos da mineração diretamente nas águas do Rio Ribeira. Quando a fiscalização ambiental apareceu, ao invés de jogar as sobras no rio passou a transportá-las para áreas de menor acesso no alto dos morros. Ao mesmo tempo, passou a deixar os rejeitos também às margens do rio. Há dois anos um aterro foi feito para abrigar o resíduo que estava na beira do rio. Mas o que ficou espalhado nunca foi contabilizado. Calcula-se que represente no mínimo 90% do total de rejeitos deixados pela Plumbum.

A mineradora teria extraído 210 mil toneladas de chumbo e 240 toneladas de prata. As áreas mais contaminadas, onde o chumbo está mais presente, não são aquelas onde ainda há rejeitos sólidos, mas no solo das imediações das antigas chaminés. A fumaça resultante do processo de fundição impregnou o solo com chumbo particulado, deixando ali maiores índices de contaminação. Nesses pontos também estão as maiores contaminações de formigas, minhocas, pequenos invertebrados e os vegetais. Isso leva a um ciclo de exposição ao chumbo que passa pelo gado, leite, queijo, até chegar ao homem.

Em 2002, a Unicamp já havia mostrado que na Vila Mota e Capelinha 59,6% das crianças apresentavam índices de chumbo no sangue acima do normal, que é de 10 miligramas da substância por decilitro de sangue, segundo o Center of Disease Control and Prevention (CDC). Outros 10% apresentaram índices de nível III, o mais perigoso para a saúde humana. O índice chegou a quatro vezes maior que o tolerável. Outro trabalho coordenado pela Secretaria de Saúde mostrou alterações laboratoriais em metade dos 866 exames realizados.

A primeira é que a água das nascentes e dos pequenos córregos dentro da área de mineração atende aos parâmetros nacionais de qualidade. A natureza providenciou a "depuração" das águas. Mas para se ter a sanidade definitiva da área é necessária a remediação dos solos contaminados e a remoção dos rejeitos sólidos.

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