Advogados criticam decisões do ministro do STF e presidente do TSE, Alexandre de Moraes.| Foto: Secom/TSE
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As recentes decisões do ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de derrubar os perfis nas redes sociais dos deputados federais Bia Kicis (PL-DF) e Cabo Junio Amaral (PL-MG), e manter o bloqueio das redes sociais de Carla Zambelli (PL/DF) estão sendo criticadas no meio jurídico, por parte de advogados que consideram inconstitucionais as decisões.

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Sem notificação ou justificava do bloqueio de suas redes sociais, os parlamentares só foram informados pelas plataformas que a determinação foi feita pelo ministro Moraes. E na decisão que manteve o bloqueio das redes de Zambelli, o ministro mandou ainda remover mais de 40 perfis que reproduziram vídeos da deputada e incluiu a parlamentar no inquérito das fake news (Inq 4.781), considerado inconstitucional por juristas. O entendimento de Moraes, além disso, fere a imunidade parlamentar (leia mais abaixo), prevista na Constituição.

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Na avaliação do advogado Paulo Papini, professor de Direito e mestre em Processo Civil, as decisões do ministro são "teratológicas", ou seja, são frontalmente conflitantes com o princípio da razoabilidade. "Quando a decisão é absurda a gente fala no Direito que é teratológica. Chegamos a um ponto que já ultrapassou o ativismo judicial e a inconstitucionalidade, chamo isso hoje de aberrações inconstitucionais, que não têm base legal e doutrinária nenhuma", disse.

Papini lembra que o ministro tem criado crimes que não se encontram na Constituição Federal, como "apologia ao crime contra a Democracia". "O ministro fala no despacho de ataques à democracia e isso não existe na lei, o crime de fala ou opinião existe apenas quando ataca a honra, os crimes de calúnia, injúria e difamação, que nunca são de uma forma genérica. Quem é democracia, existe um CPF da democracia?", declarou.

O advogado criminalista Márcio Engelberg avalia a decisão de Moraes como um "desrespeito aos direitos fundamentais" e como um "ato antidemocrático, porque ultrapassou todos os limites impostos por nossas leis"'. Segundo o advogado, Moraes usurpa a função do Poder Legislativo ao tomar uma decisão judicial, com base em na resolução 23.714/2022 do TSE, criada por ele próprio, que deu poder de polícia ao tribunal para remover da internet, sem provocação de qualquer parte ou do Ministério Público, conteúdos que questionam a credibilidade do processo eleitoral.

"Ao tomar conhecimento de uma notícia de que existe fraude nas eleições, ele deveria proceder a investigação na fraude e não no noticiante da fraude. Porém, para calar e impedir as pessoas de falar sobre o processo eleitoral, ele censura todas as pessoas", criticou Engelberg.

Imunidade parlamentar

Ambos advogados ressaltaram que a suspensão de perfis de parlamentares fere o artigo 53 da Constituição Federal, o qual prevê que "os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos". Sendo assim, os congressistas dispõem de uma imunidade parlamentar assegurando que eles tenham liberdade e independência em suas manifestações e votos. E essa imunidade, segundo os juristas, abrange não apenas as falas dos parlamentares no Congresso Nacional, mas também as manifestações em entrevistas jornalísticas; pronunciamentos para a imprensa; e nos meios de comunicação social, incluindo a internet.

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"No momento em que ele censura uma parlamentar por estar falando, se expressando e clamando para que o processo eleitoral seja investigado, você está afrontando todas as barreiras que a nossa lei tem. Então, ele ultrapassa todos os limites e é uma decisão totalmente inconstitucional", disse Engelberg.

Na decisão contra Zambelli, Moraes relativizou a imunidade parlamentar, repetindo entendimento utilizado contra o deputado Daniel Silveira. Para ele, haveria "manifestações revestidas de ilicitude" que não estariam inseridas no âmbito da imunidade parlamentar. Segundo os advogados, no entanto, a lei é clara. "A Constituição diz que o parlamentar é imune por quaisquer palavras, e o termo quaisquer não admite exceção, por mais absurda que sejam as declarações", disse Papini.

"Qualquer um pode falar o que bem quiser, mais ainda o parlamentar, porque ele tem expressamente ao seu favor uma previsão legal de imunidade em razão de suas falas; o que eventualmente pode acontecer é se ele caluniar ou ofender e, nesses casos, pode responder a uma ação, e caso fale alguma barbaridade ele responde junto a seus pares na comissão de ética da respectiva casa", explicou.

Multa diária de R$20 mil

Na nova decisão contra Zambelli, o ministro Alexandre de Moraes fixou ainda multa de R$ 20 mil no caso de reincidência da deputada "na publicação de mensagens atentatórias à Justiça Eleitoral e ao Estado Democrático de Direito". Segundo Moraes, o valor deverá ser descontado dos vencimentos da parlamentar - medida não prevista na legislação brasileira.

"A multa de 20 mil é inexequível, [se ela publicar um vídeo por dia] isso dá 600 mil por mês. Ele está impondo a um parlamentar uma multa que não se dá a uma empresa que fatura R$1 trilhão por ano. Não tem base legal e está obviamente exagerada", disse o advogado Papini.

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Engelberg também vê a multa como algo totalmente desproporcional, tanto pelo valor como o fato de não ter previsão no ordenamento jurídico. "É uma multa altíssima que ultrapassa todos os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Não há fundamento legal para essa multa; na própria decisão ele não cita nenhum dispositivo", explica.