Buenos Aires A presidente eleita da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner, desembarca hoje em Brasília para se reunir com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Esta será a primeira viagem que Cristina depois de eleita nas urnas no dia 28 de outubro realizará especificamente para reunir-se com um presidente (ela esteve há uma semana em Santiago do Chile, mas para participar da cúpula ibero-americana). Além disso, será a segunda reunião entre ela e Lula em menos de 50 dias. O objetivo desta viagem, que dá início à agenda internacional de trabalho da presidente eleita é o de reforçar a aliança estratégica da Argentina com o Brasil.
Na capital argentina, a decisão de reunir-se pela segunda vez com Lula em tão breve período está sendo interpretada como a confirmação de que o eixo Buenos Aires-Brasília é consideravelmente mais importante do que o eixo Buenos Aires-Caracas. Segundo o tradicional jornal "La Nación", a agenda exterior de Cristina "responde à simples equação de primeiro o Brasil, depois o mundo".
O encontro terá agenda aberta. Mas, segundo informações extra-oficiais, um dos pontos desta viagem é discutir a integração energética. Este ponto é de especial interesse para a Argentina, já que a crise energética paira sobre o país desde 2004. Entre maio e agosto deste ano, a crise obrigou o governo do marido de Cristina, o presidente Néstor Kirchner, a reduzir o abastecimento de gás e energia elétrica às indústrias.
Em diversas ocasiões, ao longo da campanha eleitoral e desde sua vitória nas urnas, Cristina citou o Brasil como modelo a seguir. Ela declarou-se admiradora da Embraer, empresa que mencionou como modelo de negócios no discurso de lançamento de sua candidatura (a única empresa que ilustrou seu discurso). Coincidentemente, desde meados deste ano, especula-se que a empresa brasileira poderia ficar com as instalações da fábrica aeronáutica da província de Córdoba, que atualmente são ocupadas pela Lockheed (mas cujo contrato de concessão está a ponto de terminar e dificilmente será renovado).
Outra empresa que gera admiração mas também irritação é a Petrobras. Os Kirchners sonham em ter uma estatal energética tal como a brasileira (a Argentina teve, no passado, a YPF, mas foi privatizada nos anos 1990 e vendida à espanhola Repsol na virada do século). Em 2004, Kirchner criou uma miniestatal, a Enarsa, que praticamente não saiu do papel. Para ter "corpo", a Enarsa precisaria da associação com uma empresa forte. Uma das alternativas especuladas nos últimos anos era realizar uma associação com a estatal venezuelana PDVSA, a menina dos olhos do presidente Hugo Chávez.
A Petrobras, nesse ínterim, foi encarada como a rival que poderia cobiçar os ativos de empresas de combustível que abandonassem o país. Por esse motivo, em meados deste ano, surgiram atritos entre Kirchner e a Petrobras, supostamente interessada nos ativos que a Esso venderá na Argentina. Esses planos colidiam com as ambições de Kirchner de conseguir os ativos para a Enarsa e algum grupo argentino privado.
Mas a complicada imagem de Chávez no resto do mundo, somada à recente descoberta da megajazida no Brasil (e as chances de que essas reservas se prolonguem Atlântico abaixo, até a costa argentina) e à ausência de tecnologia argentina para plataformas marítimas, revitalizam as chances de a Petrobras ampliar seus negócios na Argentina. Informações extra-oficiais indicam que Cristina está interessada em aumentar os investimentos da Petrobras no país.
Em alta
Cristina começará seu governo no dia 10 de dezembro com elevada popularidade e altas expectativas, segundo uma pesquisa da consultoria OPSM, que indicou que 69% dos entrevistados apostam que o governo da sucessora de Kirchner será "bom" ou "muito bom". Somente 9% consideram que será "ruim" ou "muito ruim".