Os coquetéis à base de medicamentos antirretrovirais transformaram a aids em uma doença crônica, com a qual os portadores podem conviver mantendo uma boa qualidade de vida. Ser soropositivo deixou de ser uma sentença de morte, e a silhueta cadavérica dos aidéticos de antigamente deu lugar a uma aparência saudável. Já que o velho bicho papão não assusta mais tanto assim, as gerações mais jovens se esquecem da prevenção contra o contágio do HIV. Embora o número de adolescentes brasileiros infectados a cada ano venha se mantendo estável na última década 648 novos casos a cada ano, em média , o sexo seguro ainda está longe de ser regra.Segundo as estatísticas do Ministério da Saúde, as garotas são as mais descuidadas: apenas 34% das adolescentes com vida sexual ativa usam preservativo nas relações casuais. Entre os garotos, 57% não abrem mão da camisinha. O resultado aparece nos dados sobre a transmissão do vírus por gênero: de janeiro de 2000 a junho do ano passado, 3.713 meninas (60%) e 2.448 meninos (40%) com idades entre 13 e 19 anos contraíram a doença em todo o país.
Uma das explicações para esse aparente contrassenso é que grande parte dos jovens tem iniciação sexual com parceiras ou parceiros mais velhos, acima de 25 anos e, nesta faixa etária, os homens predominam entre os infectados, com 174.070 casos (60% do total) no mesmo período. Já no grupo de 20 a 24 anos, há um equilíbrio, com 13.083 casos entre elas e 13.252 entre eles. Além disso, entre os meninos há mais casos de aids transmitida por relações homossexuais (39,2%) do que heterossexuais (22,2%). A tendência se inverte quando se consideram todos os casos de aids entre a população masculina, com 27,4% de transmissão por contato homossexual e 45,1% pela via heterossexual.
No Paraná, os dados apresentam uma realidade parecida: nos 10.637 casos de aids registrados entre 1984 e 2009, na faixa dos 20 aos 34 anos, 63% dos infectados são homens. Já entre os 13 e 19 anos, 285 meninas (58%) contraíram a doença, contra 209 meninos.
Riscos
Para o presidente da organização não-governamental Rede Nacional de Pessoas Vivendo com Aids de Curitiba e Região Metropolitana (RNP+ Curitiba), João Maria de Castro, os jovens deveriam pensar mais na consequência de seus atos. "O HIV já não mata, mas os remédios podem causar efeitos colaterais indesejáveis, como vômitos, diarreia e perda da massa muscular", alerta. "Os pacientes até podem levar uma vida normal, porém têm de evitar os excessos."
João Maria fala por experiência própria. Ele contraiu a doença depois dos 40 anos, em uma relação com uma jovem, que engravidou. Quando a filha desse relacionamento teve um problema de saúde, aos 3 anos de idade, os exames mostraram que a criança, hoje com 12 anos, é soropositiva. João e a parceira fizeram os testes e descobriram ser portadores do vírus. "Se tivéssemos descoberto ainda na gestação, poderíamos ter evitado a transmissão do vírus para a criança", lamenta.
Frequentadora da RNP+, Isabelle (nome fictício), de 18 anos, descobriu há três anos que é portadora do vírus. Filha de pais soropositivos, ela fora submetida na infância a exames que deram resultado negativo para a presença do HIV. Mesmo assim, diz ter recebido a notícia com tranquilidade. "Minha mãe é que ficou nervosa", afirma. "Eu já sabia um pouco sobre a doença, pois vinha aos eventos da ONG."
Isabelle, que faz supletivo à noite e trabalha em um estabelecimento comercial na região central de Curitiba, ainda não toma antirretrovirais, pois seu sistema imunológico ainda não foi afetado, mas está consciente da necessidade de prevenir a transmissão do vírus. "Nem todos os jovens têm essa consciência", admite. "Na rua onde moro, há meninas de 15, 14 e mesmo de 13 anos grávidas, o que mostra que elas fizeram sexo sem proteção."
Serviço
RNP+ Curitiba Fundada em 2004, a ONG presta serviços de orientação, apoio e assistência jurídica e psicológica aos portadores do HIV. Endereço: Rua Cruz Machado, 353, apartamento 02, Centro, Curitiba, CEP 80410-170. Telefones: (41) 3233-2473 e (41) 9173-8498
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Interatividade
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