A América Latina se mantém como a região mais desigual do mundo, pois dez dos 15 países com maior disparidade do planeta ficam nesta região, segundo um relatório apresentado nesta sexta-feira (23) na Costa Rica pelas Nações Unidas, que atribui o fenômeno à "herança geracional" e ao maus desempenhos das políticas públicas.
O Brasil, apesar dos progressos recentes, segue um dos países mais desiguais, segundo o relatório.
Para Isidro Solaga, coordenador do relatório regional sobre Desenvolvimento Humano, apresentado em San José, o fenômeno da desigualdade na América Latina é complexo, mas obedece em boa parte a uma "herança geracional" e ao mau desenho de políticas públicas, que na maioria dos casos se limitam ao combate à pobreza.
O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) ressalta que a situação do continente é delicada, pois até nos países com melhores resultados, a desigualdade é persistente e elevada.
Para Solaga, "o sistema político da região reforça a reprodução da desigualdade", pois na maioria dos países, por exemplo, os sistemas fiscais são "assimétricos", ou seja, tem uma forte carga no consumo, em lugar de taxar os lucros.
O relatório afirma que a América Latina é um mosaico de realidades políticas e sociais diferentes, mas compartilha o desafio da desigualdade.
A Bolívia, por exemplo, é o país mais díspar do continente. Tem o mesmo nível de desigualdade que Camarões e Madagascar e com um índice de Gini de 60 (em uma escala de 0 a 100, onde 100 é o máximo de desigualdade), fica entre os três países mais desiguais do mundo.
No continente americano ela é seguida pelo Haiti, que mantém uma situação de desigualdade comparável com a da África do Sul e Tailândia, todos com 59 pontos no coeficiente de Gini.
O Brasil e o Equador (índice 56), superam nações como Uganda (índice 55), que têm o mesmo nível de disparidade nas condições de vida de sua população que Honduras, Panamá, Paraguai, Chile, Colômbia e Guatemala, superando Botsuana, Etiópia e Nepal.
Inclusive os países menos desiguais da América Latina - Uruguai, Costa Rica, Venezuela e Argentina -, mantêm níveis de disparidade muito elevados (mais de 45) se comparados com os coeficientes da Europa oriental (entre 24 e 43 pontos), e mesmo com os países desenvolvidos, cujo pico está em Portugal, com um índice Gini de 41.
A herança das condições de vida de uma geração a outra é palpável e preocupante no continente, e demonstra que muitas das políticas para favorecer a mobilidade social foram ineficazes.
Dados do relatório assinalam que, por exemplo, só 3,1% dos jovens cujos pais têm a educação primária incompleta concluem seus estudos universitários.
A desigualdade é clara em quase todos os níveis. A diferença no acesso à água entre a população de maior e menor renda no Peru é de 57%, seguida pela Nicarágua (52%) e El Salvador (45%), enquanto no Uruguai é de apenas 2% e na Costa Rica e Argentina de 4%.
Na Bolívia, os grupos mais ricos têm um acesso 64% maior à eletricidade que os mais pobres. Em Honduras a diferença é de 58% e no Peru chega aos 55%, mas no Chile e Venezuela os dois grupos têm praticamente o mesmo acesso.
Se dividirmos à América Latina por subrregiões não há grandes diferenças, embora o Cone sul seja a região com menos desigualdades e a região andina a de mais disparidades sociais.
Outro elemento comum em toda América Latina é que as maiores vítimas da desigualdade são as mulheres, assim como os indígenas e os afrodescendentes.
As mulheres também são maioria entre os trabalhadores informais, além de receber um salário menor e trabalhar mais horas.
O Pnud enfatizou que os atuais processos de tomada de decisões na região não favorecem a redução da desigualdade, pois é preciso lutar contra a corrupção e desenvolver políticas que vão além do combate à pobreza.
A pesquisa usa dados de 2005 a 2008. No Brasil, os dados são de 2008. Ela leva em conta rendimento, educação e saúde.
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