A prática do teleaborto para mulheres vítimas de estupro continua sendo endossada pelo Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) – instituição que elaborou um manual defendendo o uso da telemedicina para promover abortos durante a pandemia da Covid-19. No entanto, a lei que autoriza e regulamenta a telessaúde não estabelece o aborto como uma das modalidades de atendimento que podem ser praticadas a distância. O Ministério da Saúde também publicou, em 2021, uma nota afirmando que o procedimento não pode ser feito por telemedicina.
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Órgãos públicos também mudaram o posicionamento sobre o assunto. À época da publicação da cartilha do teleaborto, o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) pediram providências contra o documento que incentiva o aborto em casa, sem a presença de um médico. Apesar da mudança de entendimento de alguns órgãos públicos, o teleaborto não deixou de ser perigoso. Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo afirmam que há riscos à saúde da gestante e possíveis complicações no procedimento realizado em casa.
A própria nota do Ministério da Saúde afirmava que o “abortamento é um plexo de ações de várias especialidades, contendo, inclusive, um procedimento clínico que não está autorizado para ser realizado por Telemedicina e que deve – obrigatoriamente – ser acompanhado presencialmente por um médico no ambiente hospitalar”. Isso porque o hospital terá aparelhos e recursos para salvaguardar a mulher de eventuais intercorrências, “as quais, aliás – e, infelizmente – são muito comuns nestes casos”.
O doutor pela USP Hélio Angotti Neto, médico e autor de diversos livros na área de filosofia da medicina e bioética, aponta que como toda tecnologia, a telemedicina pode ser utilizada para o bem ou para o mal. “Não é algo viável [o teleaborto], mas estão acontecendo diversas transformações e pressões ideológicas”, comenta.
Ele explica que a lei de telessaúde pode abrir brechas para facilitar o aborto a distância, ainda mais com o atual cenário político e com a regressão de pautas pró-vida. Recentemente, Lula anunciou que o Brasil não integra mais o acordo internacional do Consenso de Genebra, em defesa da vida desde a concepção, e a ministra da Saúde, Nísia Trindade, revogou a portaria que previa que os médicos avisassem autoridades policiais nos casos de aborto decorrente de estupro.
O procedimento de teleaborto é realizado com o misoprostol, medicamento usado em hospitais para provocar a morte ou expulsão do feto. Apesar de os defensores do aborto alegarem que seu uso é simples e sem riscos, a substância é perigosa e agressiva. A gestante que utiliza esse medicamento em casa, sem observação da equipe de saúde, pode ter complicações, como infecções, hemorragias, ruptura uterina, trombose, infarto, convulsões, distúrbios hepáticos e choque séptico ou hipovolêmico.
Há casos, ainda, em que o aborto não se concretiza mesmo após o uso do medicamento. Nessas situações, o bebê pode nascer com malformações ortopédicas, segundo o médico obstetra Jacyr Leal. “Os trabalhos científicos mostram uma malformação que se convencionou ser chamada de Síndrome de Moebius”, diz.
Incoerência do movimento pró-aborto
A professora aposentada do Instituto de Biologia da Universidade de Brasília (UnB) e presidente do Movimento Nacional da Cidadania pela Vida Brasil Sem Aborto, Lenise Garcia, destaca a incoerência do movimento pró-aborto, que ao mesmo tempo em que defende a legalização do procedimento sob a justificativa do aumento da segurança para as mulheres também milita em prol do teleaborto.
“Em alguns países, facilitaram o acesso ao misoprostol, mas os próprios fabricantes indicam que essa droga só deve ser usada na presença do médico e com possibilidade de recursos médicos, caso haja sangramento. É um risco muito grande a realização do aborto sem estar em um local que tenha um atendimento caso necessário”, afirma.
Na bula oficial do misoprostol há diversas contraindicações, como a ocorrência anterior de cesárea; doença vascular cerebral; doença coronariana e cicatriz uterina. Para Lenise, caso futuramente seja liberado o teleaborto serão abertas brechas para que o procedimento seja realizado em outros casos que, atualmente, são puníveis. Hoje, o aborto não é punido em três casos: estupro, anencefalia e risco de vida para a gestante. “É evidente que se for liberado o teleaborto fica difícil discernir os casos em que a legislação pune ou não pune”.
Na visão de Angotti Neto, a telessaúde deve ser uma pauta conduzida com responsabilidade, fundamentação científica e ética. Caso contrário, poderá haver complicações para outros procedimentos além do aborto. “A tecnologia usada com responsabilidade intensifica o acompanhamento médico. Mas se não for usada com responsabilidade, pode promover o acompanhamento inadequado”.
Outro lado
Questionado sobre seu posicionamento em relação ao fato de o procedimento do aborto não ser uma modalidade estabelecida pela lei da telemedicina, o Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia não respondeu até o momento. O Conselho Federal de Medicina também não retornou a Gazeta do Povo.
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