Eles estão por toda parte. Concentrados no Centro, reunidos especialmente nas praças e terminais; espalhados pelos bairros; confortavelmente recolhidos nas reentrâncias da arquitetura histórica de Curitiba; sempre à espreita, atentos ao próximo grão de pipoca a escapulir da mão dos mais distraídos. Os pombos são parte do cenário urbano da capital paranaense e não há nada que você possa fazer quanto a isso.
Quinze minutos observando a movimentação na Praça Rui Barbosa, aparentemente o lugar mais visado pelos pombos curitibanos, e é possível identificar as mais variadas formas de interação com as aves. Há quem desvie de absolutamente todas que apareçam pela frente, em um zigue-zague incansável; alguns encolhem os ombros e enterram a cabeça diante dos voos rasantes que o bicho, ousado, empreende; e há os destemidos, geralmente crianças ou cachorros, que correm diretamente em direção ao perigo, provocando revoadas indesejáveis.
A estudante Mariana Balan é adepta do zigue-zague, isso quando não altera rotas inteiras para não cruzar com os arrulhadores. A má vontade é antiga, de quando um inconveniente exemplar verde e gordo cravou as patinhas nos cabelos da menina. “Desde então não posso ver essas criaturas por perto.”
Mas nem todo mundo sente pavor ou “nojinho” do pombo. A veterinária Iolanda Sartori conta que teve de ceder seu quarto, cujas janelas davam para a copa de uma árvore, para um casal de pombos chocar os ovos em um ninho improvisado em cima da televisão (quando os aparelhos ainda eram de tubo e permitiam esses abusos). Durante um mês, dormiu no chão, do lado de fora. “Não tive coragem de expulsar os pombos com o ninho”, justifica.
A relação entre pombos e a cidade já foi objeto de pesquisas acadêmicas. Um estudo desenvolvido no mestrado em Geografia da UFPR aborda a questão do ponto de vista cultural e concluí que o pombo urbano fez da cidade seu habitat e, porque vivem em todas as regiões do globo, são animais legítimos da paisagem urbana e não invasores. Ainda assim, a reação dos humanos é diversa – em Veneza, aponta a pesquisa, os pombos são parte decisiva da paisagem; em outros locais, são considerados ameaça.
Por aqui, o incômodo provocado pelas aves há muito foi institucionalizado. Nos últimos dez anos, a Câmara de Vereadores recebeu pelo menos 16 propostas de projetos de lei cujo objetivo principal era reduzir a presença das aves na cidade. Se pensou em coisa de todo tipo, desde capturá-las, tratá-las com medicamentos para inibir a postura de ovos e soltá-las em local afastado até implantar repelentes eletromagnéticos para impedir que entrassem em determinados lugares. Em nome de uma Curitiba livre de pombos, quase sobrou para o cidadão: chegou-se a cogitar multar o sujeito que, comovido, alimentasse as aves deliberadamente. Nenhuma proposta vingou.
Todos os pombos serão perdoados
Se os pombos não são particularmente bons para a cidade, a cidade tampouco é boa para os pombos. As aves que vivem no Centro, explica Claudia Staudacher, chefe da Fauna Sinantrópica da Unidade de Vigilância de Zoonoses da prefeitura de Curitiba, são maltratadas e muitas, subnutridas e mutiladas. Portanto, nada de chutá-las, ludibriá-las com alimentos recheados de chumbinho ou acertá-las com pedras.
“Calma com essa história de pombo. Não precisa ter medo, ele não é agressivo, não ataca e não transmite doenças só por passar ao lado das pessoas. Se não querem pombos nas cidades, tirem sua comida e abrigo. Eles são nômades, vão embora”, argumenta Claudia, acrescentando, preocupada, que a oferta de comida deve ser reduzida aos poucos porque, habituados ao trato humano, os animais podem encontrar dificuldades para se alimentar de imediato. Acreditem: pombos também desenvolvem apego a... humanos.