Quem já teve um familiar ou amigo usuário de drogas sabe da dificuldade na hora de procurar terapias de recuperação. Uma das dúvidas mais frequentes é sobre a que tipo de tratamento recorrer o internamento para desintoxicação ou as terapias conhecidas como "casas-dia", em que o dependente volta para seu endereço nos finais de tarde, de modo a enfrentar os motivos da drogadição. O método é tido como menos artificial, pois não tira o usuário de sua realidade.
O dilema não pertence apenas às famílias: o próprio poder público está dividido sobre o assunto. A política de governo em vigor é a dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs), que rejeitam as práticas de hospitalização tradicionais. Mas em Curitiba, a Secretaria Municipal Antidrogas vai adotar, em paralelo aos CAPs, uma outra orientação. Apenas em 2010, o órgão municipal vai investir mais de R$ 1 milhão em comunidades terapêuticas, um meio termo entre a internação e as terapias indicadas pelo Ministério da Saúde.
O ministério reforça o modelo dos CAPs e lembra que nasceu da luta antimanicomial movimento nacional, desencadeado na década de 1980, de combate aos traumáticos hospitais psiquiátricos, nos quais dependentes químicos não só conviviam com doentes mentais como eram sujeitos a tratamentos inadequados. As terapias, contudo, podem ser complementares, não havendo necessidade de expor usuários e familiares a tantas dúvidas.
Os CAPs são hoje o carro-chefe do governo federal no atendimento aos usuários de drogas. Os centros estão voltados para a chamada "redução de danos", que, entre outras táticas, entende a recaída como parte do processo de recuperação. De acordo com o Ministério da Saúde, a cobertura de CAPs passou de 21%, em 2002, para 57%, ao final do primeiro semestre de 2009. O usuário tem um atendimento personalizado, com uma equipe multidisciplinar, como psiquiatras e terapeutas ocupacionais, e frequenta o local durante a manhã e a tarde, retornando para casa no final do dia.
A crítica ao sistema incentivado pelo governo federal é que, mesmo com a ampliação da cobertura, boa parte dos municípios brasileiros não possui um CAPs. Além disso, este equipamento público não funciona 24 horas. Se um dependente químico precisar de ajuda aos fins de semana, por exemplo, terá poucas alternativas além de procurar uma unidade básica de saúde, inadequada para esses casos.
Outro ponto levantado por especialistas é que o uso de drogas é individual. Depende de fatores como contexto social e familiar, tempo e tipo de substâncias utilizadas. Portanto, o tratamento também deve ser individual e ainda que a atenção à saúde seja primordial, como o atendimento feito nos CAPS, alternativas como as comunidades terapêuticas nome dado às chácaras e centros de isolamento e desintoxicação são bem-vindas.
Em famílias cujo membro não se adapta ao atendimento nos CAPs resta buscar um auxílio nã governamental. Nem sempre é possível. Clínicas particulares cobram em média R$ 4 mil por mês pelo tratamento. É nesta lacuna que as comunidades terapêuticas se tornam a única alternativa para familiares que não sabem o que fazer.
O principal problema é que a grande maioria das comunidades terapêuticas não se adequa às normas da Vigilância Sanitária, pois não tem equipe, proposta de recuperação e infraestrutura adequadas. Um levantamento realizado pela própria Secretaria Municipal Antidrogas mostra que das 49 comunidades existentes em Curitiba e região, apenas 4 estão de acordo com as exigências. Outro ponto criticado é que 90% desses locais têm cunho religioso e pautam suas ações apenas na crença e não em programas de recuperação efetivos.
A questão acaba virando uma bola de neve. O CAPs não dá conta de todo o atendimento, seja por falta de cobertura ou por inadequação do usuário. Mas é a única política incentivada pelo Ministério da Saúde. As famílias que não têm acesso aos CAPs ficam sem alternativa. Ou buscam a unidade básica de saúde que não dá conta do problema e nem foi criada para este fim ou uma comunidade terapêutica. Estas, por sua vez, não recebem qualquer repasse do Ministério da Saúde e não se estruturam. Os municípios, principalmente os menores, não têm verba suficiente para investir nessa área. O resultado é que o usuário de drogas que busca um tratamento acaba sendo vitimizado duplamente.
Operação em rede
Em 2010, a Secretaria Antidrogas de Curitiba teve o maior porcentual de aumento no orçamento municipal. A verba passou de R$ 4,5 milhões para R$ 6,3 milhões, um acréscimo de 40%. A maior parte deste valor é destinado às ações de prevenção e cerca de R$ 1 milhão ajudará na criação da Rede de Comunidades Terapêuticas. Um edital será lançado em parceria com a Fundação de Ação Social e Secretaria Municipal de Saúde para convocar as comunidades interessadas em participar.
As entidades passarão por um curso com duração de dois meses, no qual serão abordadas normas sanitárias e programas de tratamento. Os grupos passarão a contar com uma assessoria para atender à legislação e se regularizar na Anvisa e prefeitura. As nove comunidades que cumprirem as exigências de maneira mais eficaz assinarão um contrato de cooperação com o município. Haverá uma ONG por regional, com cerca de 20 vagas cada. A estimativa é que estejam disponíveis 180 vagas por mês. E que o curso comece ainda este semestre. "Nosso objetivo é capacitar e fiscalizar. Infelizmente, a maior parte dos municípios não tem essa alternativa e precisa de auxílio estadual e federal", diz o ex-secretário da pasta Fernando Francischini, idealizador da iniciativa.
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Interatividade
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