Cuidado e respeito com aquele ou aquela que acaba de morrer são atitudes tomadas em todas as religiões. Mas os rituais pós-morte em algumas delas elevam o zelo com o falecido e preservam tradições distintas e até curiosas. É o caso do Judaísmo e suas leis mosaicas, que conservam, há milênios, os mesmos procedimentos no momento da despedida.
Anunciada a morte de um judeu, a primeira providência da família é comunicar o Chevra Kadisha – grupo de voluntários que orienta e realiza todos os procedimentos funerários. “É considerado um grupo santo, pois a tarefa realizada se relaciona diretamente com a santidade”, explica o rabino Pablo Berman, da Comunidade Israelita do Paraná, .
A preparação do corpo é conhecida como Tahara – o momento de purificação. Um banho cuidadoso com água pura é feito cuidadosamente pelo grupo, enquanto preces são recitadas pedindo perdão – em nome do falecido –pelos possíveis pecados cometidos em vida. Tudo é realizado no próprio cemitério israelita, em um local reservado.
A tradição segue o que diz o Livro de Eclesiastes: “assim como veio, assim irá”. Para os judeus, a passagem designa tratamento semelhante ao dado aos recém-nascidos, que são imediatamente lavados quando saem do útero para que fiquem fisicamente limpo e espiritualmente puro. Para os judeus, o mesmo deve ser feito no momento da partida.
Para o rabino, essa é uma das maiores ações de amor ao próximo no Judaísmo. “Tudo é feito de maneira voluntária. Acreditamos que a alma ainda está próxima à pessoa nesse momento”. Ao fim do banho ritual, o falecido é vestido com o Tachrichim, um conjunto de roupas brancas, com camisa, calça e luvas, que representam a neutralidade com que a alma irá se encontrar com o Criador, segundo a tradição judaica.
Os olhos recebem uma pedra cada um. Também é repousada uma terceira pedra na boca. A religião ensina que isso impede o questionamento da própria morte ou ainda que o falecido se encontre com Deus antes do Juízo Final. Depois disso, o caixão é fechado ou o corpo enrolado em um pano branco e ocorre um breve velório. Orações fúnebres são recitadas em hebraico. Em seguida, sete parentes enlutados rasgam um pedaço da própria roupa em alusão ao coração dilacerado pela perda.
Sepultamento
Pela lei judaica, o corpo deve ser sepultado o mais breve possível, de preferência no mesmo dia da morte. A explicação é de a alma não consegue descansar até ser sepuldada. A única exceção à regra é em caso de mortes violentas, em que decisões judiciais podem atrasar a cerimônia.
O corpo deve ser sepultado em um caixão simples, sem ornamentos -- apenas uma Estrela de Davi na parte superior, que leva também as iniciais do morto. Segundo a Associação Religiosa Israelita Chevra Kadisha, do Rio de Janeiro, a tradição frisa “a igualdade de todos os seres humanos em sua morada final. Na morte, rico e pobre se encontram, pois ambos foram criados por Deus” (Provérbios 22:2)”. O sepultamento deve ser feito em um cemitério israelita, denominado por eles como “casa do mundo” ou “casa da eternidade”, em um jazigo único, aceitando-se somente um parente a mais em cada túmulo.
O caixão é colocado na cova em contato com a terra, enquanto um membro da família é responsável por jogar as primeiras pás de terra que começam a cobrir a madeira. Uma lápide é colocada com escritos hebraicos informando nome, data de nascimento e morte, além de citações bíblicas.
Em geral, depois de um ano, pedras são colocadas sobre o sepulcro, baseando-se na tradição bíblica, quando Jacó colocou pedras para sua esposa Raquel, em sinal de homenagem. Esse gesto, explica a Associação Israelita carioca, assegura que os mortos não serão esquecidos e a sepultura não será profanada. “Uma das funções básicas da pedra tumular é manter viva a memória do falecido. E, de acordo com o Talmud [livro sagrado], a memória dos mortos torna-se menos intensa após 12 meses.”
Judaísmo não permite a cremação
A cremação não é permitida em nenhuma circunstância no Judaísmo . A religião entende que o ato era originalmente um ritual pagão e a lei judaica proíbe a mutilação do corpo. O rabino Pablo Berman, explica que, segundo a crença, é levado um tempo até que a alma seja desabrigada por completo da carne e o processo deve seguir a decomposição natural do corpo. A cremação, por sua vez, separaria, de maneira brusca e dolorosa, os elementos carnais e espirituais.