Uma nova estrela deve surgir na galáxia por volta de 2022, anunciaram astrônomos americanos nesta sexta-feira (6). Conhecida atualmente pela pouca atraente designação KIC 9832227, a nova estrela na verdade é um sistema binário: duas estrelas que orbitam em torno de um centro de gravidade comum, com um brilho hoje muito tênue para ser vista a olho nu. Apesar disso, a previsão é de que a nova estrela se torne um dos objetos mais brilhantes da galáxia.
No caso da KIC 9832227, no entanto, os passos desta dança cósmica estão rápidos e apertados. Chamadas binárias de contato, nestes sistemas as estrelas estão tão próximas uma da outra que dividem uma mesma atmosfera, como dois amendoins na mesma casca, e eventualmente podem se fundir e explodir. E é justamente isto que os astrônomos esperam que aconteça entre 2021 e 2023, mas mais provavelmente no começo de 2022, aumentando seu brilho em cerca de 10 mil vezes e tornado-a, ainda que temporariamente, uma das estrelas mais brilhantes do céu, visível na constelação de Cygnus (Cisne).
“É uma chance de uma em um milhão poder prever uma explosão assim. Isto nunca foi feito antes”. diz Larry Molnar, professor do Calvin College, no estado americano de Michigan, e líder da equipe responsável pela ousada previsão, apresentada durante a 229ª Reunião da Sociedade Astronômica Americana (AAS), que começou na última terça e vai até sábado (7) na cidade texana de Grapevine.
A história da descoberta do provável destino explosivo da KIC 9832227 começa em 2013, quando, durante uma conferência astronômica, Molnar assistia a uma palestra da colega Karen Kinemuchi, do Observatório de Apache Point, Novo México, sobre um estudo das variações detectadas no brilho da estrela. Na oportunidade, ela encerrou com uma questão: será a KIC 9832227 uma estrela pulsante ou um sistema binário? Também presente na palestra estava Daniel Van Noord, aluno e assistente de pesquisas de Molnar. Van Noord tomou a pergunta de Karen como um desafio e começou a fazer observações da estrela com os telescópios do observatório do Calvin College.
“Ele observou como a cor da estrela se correlacionava com seu brilho e determinou definitivamente que ela era um sistema binário”, lembra Molnar. “Daí, Van Noord calculou seu período orbital preciso a partir dos dados do (observatório espacial) Kepler usados por Kinemuchi, de pouco menos de 11 horas, e se surpreendeu aos descobrir que o período que calculou era um pouco mais curto do que o período que mostravam dados mais antigos”, explica.
O resultado obtido por Van Noord lembrou a Molnar trabalho anterior publicado pelo astrônomo polonês Romuald Tylenda em que ele analisou os arquivos de observações do comportamento de outra estrela, designada V1309 Scorpii, antes de explodir de forma inesperada em 2008, produzindo um fenômeno chamado “nova vermelha”, um tipo de explosão estelar apenas recentemente reconhecido como distinto de outras explosões cósmicas. Os arquivos pré-explosão da V1309 Scorpii mostraram que ela era uma binária de contato com um período orbital que diminuía a um ritmo acelerado. Para Molnar, este padrão de mudanças na órbita da V1309 Scorpii visto por Tylenda poderia servir como um “Pedra de Roseta” para interpretar o comportamento observado na KIC 9832227.
Assim, após observar que as alterações no período orbital da KIC 9832227 continuaram durante todos os anos de 2013 e 2014, Molnar apresentou cálculos para sua variação ao longo de 15 anos durante a reunião de janeiro de 2015 da AAS, prevendo que a estrela seguiria os passos da V1309 Scorpii. Antes de levar esta catastrófica e ousada hipótese a sério, no entanto, ele ainda queria descartar outras possíveis, e mais mundanas, interpretações para as mudanças no período orbital.
Desta forma, nos dois anos seguintes à sua primeira apresentação na reunião da AAS, Molnar e equipe realizaram dois testes observacionais de interpretações alternativas à fusão e explosão da KIC 9832227. No primeiro, observações espectroscópicas descartaram a presença de uma estrela companheira ao sistema com um período orbital maior que 15 anos que poderia explicar sua variação de brilho. E, em segundo, o ritmo de decréscimo no período orbital nestes últimos dois anos seguiu a previsão feita em 2015, agora superando o visto em outras binárias de contato.
“No fim de tudo, agora realmente pensamos que nossa hipótese de fusão estelar deve ser levada a sério e devemos usar os próximos anos para estudá-la intensamente, de forma que, se de fato ela explodir, saibamos o que levou à sua explosão”, defende Molnar.
Observação
Para isso, Molnar e equipe continuarão a observar a KIC 9832227 ao longo do próximo ano em toda uma nova gama de comprimentos de onda. Usando o VLA (sigla em inglês para “rede muito grande”, um dos maiores e mais sensíveis radiotelescópios do mundo, instalado no Novo México), o Infrared Telescope Facility (“instalação de telescópio infravermelho”, mantida e operada para a Nasa pela Universidade do Havaí no alto da montanha havaiana de Mauna Kea) e o observatório espacial XMM-Newton, da Agência Espacial Europeia (ESA), eles vão estudar as emissões de rádio, infravermelhas e de raios X da estrela.
“Se a previsão de Molnar estiver correta, seu projeto vai demonstrar pela primeira vez que astrônomos podem flagrar certas estrelas binárias no momento de sua morte, e que eles também podem acompanhar os últimos poucos anos de sua mortal espiral até o ponto final de uma dramática explosão”, destaca Matt Walhout, reitor de pesquisas e bolsas de estudo do Calvin College.
“Este projeto é significativo não só pelos seus resultados científicos, mas também por seu potencial de capturar a imaginação das pessoas comuns. Se a previsão estiver certa, então pela primeira vez na história pais e mães poderão apontar um ponto escuro no céu para seus filhos e dizer: ‘vejam, crianças, tem uma estrela escondida ali, mas em breve ela vai se acender’”.
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