Os estudantes de pós-graduação que recebem bolsa e têm uma atividade remunerada correm o risco de ficar sem o benefício. Uma portaria divulgada em julho do ano passado pelas duas maiores financiadoras do país dava a entender que o estudante que trabalha também poderia concorrer às bolsas, o que não é permitido. Isso levou a um erro de interpretação por parte das universidades.
Segundo Jorge Almeida Guimarães, presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (Capes), responsável pela portaria junto com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o que estava escrito era que os bolsistas poderiam receber complementação financeira. "O aluno que já recebe o auxílio pode trabalhar sem perder o benefício. Isso não quer dizer que outro aluno com uma atividade remunerada pudesse concorrer à bolsa". Com a portaria, a ideia era que o bolsista não perdesse oportunidades na área da sua pesquisa.
O problema é que muitas instituições deram bolsas para pessoas com vínculo empregatício. No dia 2 de maio, Capes e CNPq cancelaram as bolsas por meio de um ofício enviado às universidades, mas 15 dias depois ele foi anulado. Cada caso será analisado pela instituição e pelas financiadoras.
A Capes não informou a quantidade de alunos que se enquadram no caso, alegando que um número certo de bolsas é passado a cada universidade e que cabe à instituição fazer a seleção. Dos 995 bolsistas beneficiados neste ano na Universidade Federal do Paraná (UFPR), 77 trabalham. "A portaria estava confusa e os coordenadores de curso entenderam errado. Mas para nós tanto faz o aluno trabalhar antes ou depois", diz o pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação, Sérgio Scheer.
Do total de 2,1 mil bolsistas da Universidade de Campinas (Unicamp), cerca de 100 terão as bolsas avaliadas. Segundo o pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação, Euclides de Mesquita Neto, sem bolsas para quem trabalha fica difícil atrair alunos para áreas como engenharia, que paga bem e tem levado os estudantes a optar por trabalhar.
Nem todas as universidades que oferecem bolsas têm esse problema. Com uma pequena quantidade de bolsas, a Universidade Estadual de Maringá (UEM) e a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) optaram por quem não trabalhava. "Como nossos programas de pós-graduação são recentes, temos pouca oferta de bolsas. Nada mais natural que privilegiar quem ficará apenas estudando", afirma o pró-reitor de pesquisa e pós-graduação da UTFPR, Luiz Nakamura Júnior.
Exceção
Só professores de Educação Básica da rede pública podem concorrer e ganhar uma bolsa. Para outros servidores, mesmo funcionários ou professores da própria instituição onde fazem mestrado ou doutorado, vale a regra geral.
Na UFPR, o Departamento de Educação é o curso com a maior quantidade de casos a serem analisados: são 11 dos 77. Muitos bolsistas também são professores de Educação Básica. O edital prevê que os professores da rede pública continuem com as bolsas. Alguns, no entanto, aguardam a análise. É o caso de um doutorando, que não quis se identificar, que no terceiro ano do curso passou em um concurso para o Instituto Federal Tecnológico (IFT). Embora cumpra alguns requisitos da portaria, ele ainda não sabe se terá o benefício mantido. "Meu trabalho está relacionado ao meu objeto de pesquisa, que é o Ensino Médio. Eu me enquadro em tudo que é pedido. Agora é só esperar".
Cassius Marcelus Cruz, 35 anos, faz mestrado em Educação na UFPR e é representante discente da pós-graduação. No primeiro ano do curso, em 2010, não conseguiu bolsa porque trabalhava como professor na rede pública. Quando a portaria entrou em vigor, se inscreveu foi contemplado com o benefício. "Quando me inscrevi, o presidente da Capes ressaltou que poderia ter vínculo empregatício. Não teve explicação clara da ordem, de que primeiro era necessário ter a bolsa para depois trabalhar, como agora".
Na Universidade Estadual de Londrina (UEL) a maioria das bolsas a serem revistas também são de professores. "São substitutos que trabalham na universidade. Não deveria ser enquadrado como vínculo empregatício, já que dura no máximo dois anos", diz o pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação, Mário Sérgio Mantovani.