A estratégia varia: para os idosos, eles perguntam se a aposentadoria já saiu; aos mais jovens, questionam se já trabalharam com carteira assinada, se querem solicitar seguro desemprego ou se o acerto da última demissão foi pago certinho. Quem passa em frente à Superintendência do Trabalho e Emprego no Paraná (SRTE/PR), em Curitiba. é logo abordado por atravessadores de escritórios de advocacia. Muitas vezes trajando terno e gravata, eles ficam na porta do local e interpelam os pedestres com as frases “Orientação trabalhista?” ou “Advogado trabalhista?”.
Em frente à SRTE/PR, na Travessa da Lapa, a prática é contínua e ocorre durante todo o dia, conforme constatou a reportagem da Tribuna do Paraná, que já havia abordado o tema no ano passado. Mas o problema continua.
Como a maioria das pessoas se esquiva das abordagens, os atravessadores costumam dizer que a senha para atendimento acabou. Assim que o indivíduo para, frustrado, é bombardeado por perguntas. A intenção dos engravatados é cavar informações até descobrir se a pessoa “tem potencial” para entrar como parte em uma ação trabalhista.
Serviço grátis cobrado
Em contato telefônico com um dos escritórios que fazem uso do serviço dos atravessadores e se localiza na José Loureiro, a Tribuna do Paraná foi informada de que os advogados cobram 30% do valor resultante. “Já é o mínimo da tabela da OAB, e nós arcamos com o risco de o cliente perder a ação”, disse o atendente.
Muitos serviços oferecidos pelos atravessadores em frente aos órgãos públicos, como solicitação de aposentadoria, seguro desemprego, seguro DPVAT e rescisão trabalhista, não necessitam de intermediadores nem de um advogado. O profissional do Direito só é necessário se o solicitante tiver o pedido negado ou quiser entrar com ação trabalhista.
Em seguida, caso o abordado “valha a pena”, os atravessadores se oferecem para levá-lo a escritórios de advocacia próximos, dizendo que a consulta jurídica é gratuita. “É um assédio, são situações realmente nojentas”, diz o chefe da Seção de Inspeção de Trabalho da SRTE/PR, Elias Martins. “Já cheguei a flagrar um deles pegando a carteira de trabalho de uma pessoa e colocando no bolso, e o obriguei a devolver. É uma arapuca, os advogados botam os engravatados para passar uma espécie de confiança às pessoas, que acabam ludibriadas. É uma situação horrível”.
Segundo Martins, alguns são tão ousados que chegam a entrar no órgão para oferecer o atendimento. “Na emoção e na necessidade, as pessoas acreditam em falsas promessas. Existem casos em que o escritório ganha a ação e não repassa o dinheiro ao trabalhador. Temos o caso de uma senhora que quis romper o contrato e foi informada que teria de pagar dois mil e quinhentos reais”, conta.
De acordo com ele, cerca de 40 atravessadores atuam na frente do SRTE/PR. “São empregados dos escritórios que trabalham sem registro, sem direitos trabalhistas. Eles próprios estão sendo explorados”, ressalta.
Fiscalização
O SRTE/PR informou que está estudando maneiras de combater o problema de forma conjunta com a Ordem dos Advogados do Brasil seção Paraná (OAB/PR). “É problemático fiscalizar escritórios de advocacia porque em regra eles se escudam na privacidade, e podem alegar invasão. Por isso a OAB tem que estar junto”. De acordo com Martins, o SRTE/PR já reuniu panfletos, cartões e fotografias que comprovam a prática.
De acordo com o Código de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), não é permitido captar clientes nem distribuir panfletos, o que configura publicidade irregular. “A princípio é uma tentativa de angariação de clientes, isso configura infração ética ao estatuto. A Ordem tem repreendido muito isso, mas, como a prática se multiplica quase que diariamente, estamos preparando batidas para tentar coibi-la”, afirma o coordenador das Comissões de Fiscalização de Exercício Profissional da OAB-PR, Daniel Hachem.
Ele afirma que o próprio interessado, ou seja, o cliente em potencial, não tem segurança jurídica, pois não sabe se são advogados devidamente registrados, com competência para defender seus direitos.Apesar de oferecerem “consulta jurídica gratuita”, os escritórios podem cobrar honorários abusivos.
Ainda segundo Hachem, a tabela da OAB sugere de 10% a 20% do resultado econômico da ação. “A princípio, o valor que superar a sugestão da Ordem é abusivo, mas cada caso é um caso, não cabe generalizar. Quando se tratar de honorários e o advogado apresentar um valor, entre em contato com a Ordem pra ver se o valor é abusivo ou não”, orienta.
Penalidades
Caso um advogado seja pego fazendo publicidade irregular, como entrega de panfletos e angariação de clientes, é instaurado um processo administrativo para apurar a situação, em que o acusado tem direito a defesa. A pena para quem comete a infração pela primeira vez é a censura (advertência). Se for reincidente, o advogado pode ter seu direito de exercer a profissão suspenso de 30 dias a 12 meses. E caso reincida novamente, pode chegar a ser excluído do quadro da Ordem.
Em 2016, 60 penalidades relativas a publicidade irregular foram aplicadas pela OAB, sendo 53 censuras e sete suspensões. Também neste ano, 26 novas denúncias dessa infração foram admitidas pela Ordem.
Para denúncias, os contatos da Ouvidoria da OAB-PR são: admin.oabpr.org.br/ouvidoria, (41) 3250-5736 ou ouvidoria@oabpr.org.br.
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