O Paraná tem o equivalente a 83 mil campos de futebol para ser explorado através da servidão florestal, mecanismo pelo qual o proprietário rural que não atende aos limites mínimos de reserva legal pode compensar esse déficit em terras de outros proprietários. O levantamento é da ONG The Nature Conservancy (TNC), que desde 2006 vem tralhando para viabilizar essa ferramenta de adequação ambiental de propriedades rurais prevista em lei. A TNC já identificou 270 mil hectares de florestas em propriedades rurais no estado, dos quais 90 mil hectares estão disponíveis para formar um banco de florestas.Em meio aos debates sobre a alteração do Código Florestal, a servidão florestal aparece como uma alternativa equilibrada entre a obrigatoriedade de regularização fundiária das propriedades rurais e a necessidade de preservação ambiental. O mecanismo apresenta-se como um dos principais exemplos do conceito de pagamento por serviços ambientais, que ganha cada vez mais força entre ambientalistas e governantes (nacionais e internacionais), preocupados em encontrar uma saída sustentável para manter as florestas do planeta.
Vantagens
Embora prevista no Código Florestal, a modalidade precisa de regulamentação estadual. O Paraná foi o primeiro a regulamentar, seguido por Mato Grosso do Sul, São Paulo e Minas Gerais. "A servidão florestal tem dupla vantagem: regulariza o agricultor que tem passivo ambiental e beneficia aquele que tem floresta em pé", explica Fernando Veiga, coordenador de Serviços Ambientais do Programa de Conservação Floresta Atlântica da ONG The Nature Conservancy (TNC).
No estado, a TNC e o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) trabalham em parceria na tentativa de proteger áreas estratégicas para conservação dos remanescentes da vegetação nativa, que atualmente não passa de 12%. A parceria garantiu a publicação de resolução estadual que estabelece e define o mapeamento das Áreas Estratégicas para a Conservação e a Recuperação da Biodiversidade. O trabalho conjunto também envolveu a modernização do sistema de cadastro e a manutenção da reserva legal do estado, para dar agilidade aos processos de adequação ambiental.
De acordo com o IAP, pelo menos 82 mil registros têm em vista a compensação ambiental. Depois da averbação da servidão, a área entra para o Sistema de Manutenção, Recuperação e Proteção da Reserva Florestal Legal e Áreas de Preservação Permanente (Sisleg), que responde pelo monitoramento destas áreas no Paraná. O primeiro contrato firmado no estado e no país foi entre um agricultor de Pinhão, na Região Centro-Sul. Quem aplicou o conceito foi o produtor rural Marcos Thamm, por meio da Cooperativa Agrária Agroindustrial e da TNC.
A ideia geral é criar valor para a floresta em pé. Para o produtor, a modalidade é uma forma de ele não ter de converter parte da área produtiva em reserva legal, o que implicaria em perda de rentabilidade. Por outro lado, aquele agricultor que tem mais do que os 20% exigidos por lei (no caso da Mata Atlântica) poderá ter um ganho econômico. Pela servidão florestal, a pessoa compra um direito sobre o imóvel de um terceiro. O valor pela venda vai depender se a servidão for temporária ou permanente. No Paraná, o preço pela servidão permanente pode variar entre R$ 2 mil e R$ 30 mil por hectare.
Ajustes
Apesar do mecanismo de servidão florestal estar sendo visto com bons olhos por ambientalistas e governantes, o setor produtivo reivindica alguns ajustes na legislação. Os agricultores querem que não haja a exigência de compensação dentro da mesma bacia hidrográfica e do agrupamento de municípios determinado por lei estadual. Para eles, o ideal é que a única exigência fosse a compensação dentro do mesmo bioma ou pagamento em dinheiro do passivo ambiental para um Fundo Federal de Recomposição Florestal, destinado ao pagamento de indenizações.
A questão será debatida pelo governo durante o processo de construção de uma nova proposta de alteração do Código Florestal, segundo o secretário de Biodiversidade e Floresta do Ministério do Meio Ambiente, Bráulio Dias. O especialista em Servidão Florestal da TNC, Cláudio Klems, considera que a popularização do mecanismo ainda não avançou porque os produtores estão relutantes com a indefinição da legislação.
Para o professor de Conservação do Solo e Planejamento do Uso da Terra Gerd Sparovek, a ressalva em relação ao mecanismo é que ele pode reduzir a necessidade de restauração da vegetação natural onde ela falta. "Como a reserva legal foi compensada, não precisa ser restaurada, e é esta a questão principal que deve ser levantada contra esta medida no contexto da conservação", considera.