O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso foi contestado por membros da plateia durante uma palestra para brasileiros na Universidade de Oxford, na Inglaterra, neste sábado (25). O bate-boca envolveu uma declaração de Barroso sobre a adoção do comprovante impresso do voto, o que ele chamou de “abominável retrocesso”. O ministro do STF participou da abertura do Brazil Forum UK, evento realizado por estudantes brasileiros no Reino Unido desde 2016.
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Como costuma fazer em suas palestras, Barroso iniciou afirmando que não é um ativista, e sim um representante do Judiciário: “Não sou um ator político, eu sou um ator institucional”, disse ele. Entretanto, em sua fala de meia hora, ele distribuiu suas opiniões sobre temas que fogem à responsabilidade do STF.
Dentre outros assuntos, Barroso criticou a proposta que criaria um comprovante impresso para o voto eletrônico. “Durante a minha gestão na presidência no TSE, eu precisei lidar com a pandemia, precisei oferecer resistência aos ataques à democracia e impedir esse abominável retrocesso que seria a volta do voto impresso com contagem pública manual, que sempre foi o caminho da fraude no Brasil", disse ele.
Neste momento, o ministro foi interrompido por uma mulher que, da plateia, respondeu: “Isso é mentira”. Ela disse que “ninguém falou na contagem manual”. Também foi possível ouvir um homem afirmando: “Como a gente vai confiar nas urnas se o cara que vai presidir foi o cara que liberou o maior ladrão (inaudível)?”. Barroso insistiu que tanto o presidente Bolsonaro quanto a autora do projeto (a deputada Bia Kicis) falaram em “voto impresso com contagem pública manual”. Ele também demonstrou incômodo com a manifestação vinda da plateia. "Esse é um dos problemas que nós estamos enfrentando no Brasil: um déficit imenso de civilidade", queixou-se o ministro.
Barroso deixou de mencionar que a proposta do voto impresso não abolia as urnas eletrônicas: apenas adicionava o comprovante impresso como uma segurança adicional que permitisse uma recontagem dos votos físicos caso necessário.
Após o fim da palestra, Barroso continuou a trocar palavras com a mulher sobre o tema, mas a transmissão foi interrompida em seguida.
O voto impresso não foi o único tema abordado por Barroso. Em sua fala no evento, o ministro do STF afirmou que “o grande papel do Estado e da sociedade é gerar riquezas e distribuí-las de uma forma justa”. Disse que, ao redor do mundo, a democracia está sob “ataque cerrado” do “populismo autoritário”. Lamentou a perda do “espaço público compartilhado” criado pela imprensa tradicional e desfeito, segundo ele, com a emergência das redes sociais.
O ministro também defendeu a adoção de cotas para mulheres em cargos eletivos. Declarou apoio à adoção do voto distrital misto para o Legislativo. Atacou o modelo de combate às drogas do país, que segundo ele “não serve para nada” e gera um “imenso encarceramento inútil de jovens primários, com bons antecedentes”.
Além disso, afirmou que o “pensamento conservador” foi “capturado pela grosseria, pela ofensa, pelo ataque, pela falta de respeito.”
Críticas ao governo
Na abertura do evento, um dos responsáveis pelo fórum, o estudante de mestrado João Arthur Reis fez pouca questão de esconder o perfil anti-governo do evento. Para ele, as “instituições democráticas sob ameaça e sob ataque” por causa de “uma agenda fascista de desmanche sistemático de políticas consolidadas”. Também segundo ele, a lógica de segurança pública no Brasil é “estruturalmente racista”.
Sem se referir explicitamente ao governo federal, Reis disse ainda que a organização do evento não convidou “pessoas que não possuem compromisso com o estado democrático de governo e com o processo democrático”. Nenhum membro do Executivo federal participa do evento, que tem dentre os palestrantes o ex-governador João Doria e o pré-candidato à Presidência Ciro Gomes. Os painéis do Brazil Forum UK incluem um debate sobre a desmilitarização da polícia.
Pouco sutil em sua postura contrária ao governo atual, o fórum tem como tema “Amanhã vai ser outro dia”. O vídeo de apresentação traz um trecho da canção “Apesar de Você”, de Chico Buarque — um símbolo da oposição ao regime militar — e inclui os versos “Hoje você é quem manda falou tá falado não tem discussão / A minha gente hoje anda falando de lado e olhando pro chão”.
Os ingressos para um dia do evento (que vai até este domingo) custam pouco menos de R$ 200. Dentre os patrocinadores e apoiadores do evento, estão a Natura, a Fundação Lemann e a Haddad Foundation, uma organização sediada no Reino Unido que tem um histórico de colaboração com entidades de esquerda.
O STF informou à Gazeta do Povo que a viagem de Barroso não gerou custos para a Corte.
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