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O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, rebateu críticas e defendeu a competência da Corte para definir critérios sobre o porte de maconha para uso pessoal. O ministro concedeu entrevista na tarde desta quarta-feira (26) após a conclusão do julgamento.
Barroso afirmou que o STF não poderia se furtar à discussão, pois a legislação não estabelece critérios para diferenciar usuários de maconha de traficantes.
“O Supremo não está legalizando o consumo de maconha. O Supremo, pelo contrário, está estabelecendo regras para enfrentarmos da melhor maneira possível o fenômeno que é as drogas. A guerra às drogas não tem funcionado, o tráfico tem aumentado seu poder, a quantidade de usuários tem aumentado. O que vínhamos fazendo não está funcionando”, disse o ministro.
"Não legalizamos nada. Apenas estamos enfrentando uma discriminação perversa que havia na sociedade brasileira e que é indefensável", reforçou. Barroso frisou que o questionamento sobre o porte de drogas para consumo pessoal chegou à Corte por meio de um recurso extraordinário, pois não havia na legislação uma regra clara para diferenciar o usuário do traficante.
“É o STF que julga recursos e habeas corpus de pessoas que são presas por porte de drogas. É preciso ter algum tipo de critério para distinguir o que deve ser tratado como porte para consumo pessoal e o que deve ser tratado como tráfico. Portanto, não é o Supremo que escolhe decidir essa matéria. Os recursos chegam aqui, as pessoas são presas e entram com habeas corpus aqui. De modo que o Supremo não tinha como se furtar a essa discussão”, ressaltou.
O ministro voltou a dizer, assim como fez durante o julgamento, que a Corte considera o porte de drogas ilícito. “O Supremo considera que o porte de drogas, mesmo para consumo pessoal, é um ato ilícito. Apenas o Supremo, na linha do que o Congresso já havia feito, entende que não cabe pena de prisão, neste caso, e que também não cabe uma outra medida penal de prestação de serviços à comunidade”, afirmou.
Barroso disse ainda que a “consequência prática” da decisão da Corte é que usuários não poderão prestar serviços à comunidade, mas seguirão sujeitos a tratamento médico, a advertência, como já prevê a legislação. Para o ministro, a decisão pode “acabar com discriminação” nas abordagens policiais e “valerá para pobres e ricos”.
Barroso comentou as críticas de Lula e de Pacheco sobre a decisão do STF
Nesta manhã, o presidente Lula (PT) afirmou que a “Suprema Corte não tem que se meter em tudo” ao comentar o julgamento. Questionado sobre a crítica do chefe do Executivo, Barroso defendeu que o STF não pode rejeitar a análise de temas que competem ao Judiciário, como recursos e habeas corpus.
Ele apontou que, na falta de definição de critérios pelos demais Poderes e por órgãos reguladores, os ministros devem estabelecer parâmetros para poder analisar os questionamentos feitos a Corte.
“Não sou censor de ninguém, menos ainda do presidente da República. Apenas um esclarecimento a ser prestado é que os recursos chegam aqui, os habeas corpus chegam aqui e o Supremo não pode dizer: ‘Esse caso é muito difícil, é complicado, tem repercussão ruim’. Temos que julgar e para julgar temos que ter critérios. E estabelecemos um critério [no julgamento sobre o porte de maconha]. Portanto, não foi o Supremo que se mobilizou para ter uma ingerência em um tema que não é da sua alçada”, disse o ministro.
Barroso também comentou sobre a reação do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), à decisão dos ministros. O senador apontou que o Supremo estaria invadindo a competência do Legislativo e de órgãos reguladores.
“O presidente Pacheco tem todo direito de ter a opinião que lhe pareça bem acerca desse tema. Nós entendemos que não é invasão de competência. Julgar habeas corpus e julgar recurso extraordinário é competência do Supremo, o Congresso não tem esse papel. E para julgar adequadamente esses habeas corpus e recursos, precisamos estabelecer critérios", ressaltou.
"Como a lei não estabelece critério que distingue tráfico de porte para consumo pessoal, nós tivemos que estabelecer um critério. Se, quando o Congresso atuar, se atuar de maneira compatível com a Constituição, é a vontade do Congresso que vai prevalecer”, afirmou o presidente do STF.