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O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, mudou de postura sobre uma decisão anterior que havia autorizado especialistas em tecnologia a inspecionar o código-fonte do sistema de distribuição de processos judiciais aos ministros da Corte.
A mudança de postura do ministro foi noticiada nesta terça-feira (24) pelo portal UOL, que em março recebeu de Barroso a autorização para analisar o sistema responsável por sortear o magistrado que vai cuidar de cada processo.
As primeiras dúvidas sobre o sistema surgiram em 2017, quando o ministro Edson Fachin foi sorteado para herdar a relatoria de ações da extinta Operação Lava Jato após o acidente aéreo que matou o ex-ministro Teori Zavascki.
Novas dúvidas sobre o sistema voltaram a circular recentemente, quando o ministro Alexandre de Moraes foi sorteado para relatar quase a totalidade dos processos ligados ao 8 de janeiro.
Barroso mudou de opinião menos de 72 horas antes da auditoria
O UOL recebeu autorização do STF para realizar a auditoria após quatro anos do pedido via Lei de Acesso à Informação (LAI).
De acordo com o jornal, “além de permitir a inspeção, o Tribunal deu aval para fazer análise dos registros do programa”.
A visita chegou a ser agendada e combinada com funcionários do STF para ocorrer nos dias 9 e 10 de setembro, mas Barroso vetou o acesso menos de 72 horas antes do primeiro dia da auditoria.
De acordo com o UOL, o jornal se comunicou com funcionários do STF durante quatro meses informando que levaria especialistas que residem em São Paulo e na Dinamarca.
STF confirmou a visita dos técnicos em duas ocasiões
Em 5 de julho, segundo aponta o UOL, o STF confirmou as datas das auditorias com a equipe de quatro pessoas, com a ressalva de que não seria possível entrar com computadores portáteis. O Tribunal autorizou apenas a utilização dos equipamentos do próprio STF.
Nos dias 5 e 6 de setembro, funcionários do STF voltaram a confirmar a visita, ressaltando que o trabalho seria acompanhado por três funcionários do Tribunal, nos dias 9 e 10 de setembro, na sala de audiências.
Também no dia 6 de setembro, a Presidência do STF pediu os nomes dos técnicos e os documentos de identidades deles.
Horas depois, uma servidora do STF informou ao UOL que a auditoria não poderia ser realizada.
Equipe
Entre os técnicos que integram a equipe montada pelo UOL estão o professor de Direito e ex-coordenador do projeto Supremo em Números, Ivar Hartmann; e o professor de ciência da computação, Diego Aranha, da Universidade de Aarhus, na Dinamarca.
Os dois especialistas têm histórico de trabalhos voltados à busca de transparência e eficiência do judiciário.
O projeto “Supremo em Números”, do professor Hartmann, analisava estatisticamente o STF, que não é fiscalizado por nenhum outro órgão.
Já o professor Diego Aranha ganhou notoriedade pela atuação com segurança nas eleições.
Aranha defende a aplicação de uma camada extra de segurança na urna eletrônica, com um módulo impressor de votos ao lado de cada equipamento e também propõe a conferência do resultado das eleições através de uma amostra relevante dos votos depositados.
O especialista não tem ligação partidária e nunca chegou a apontar indício de fraude em qualquer pleito.
Os dois especialistas criticaram a mudança na decisão do presidente do STF.
O que diz o STF
Procurado pela Gazeta do Povo, o STF compartilhou com o jornal a decisão do presidente do STF.
Em um documento datado do dia 12 de setembro, o ministro Luís Roberto Barroso diz ter recebido da Secretaria de Tecnologia e Inovação (STI) a informação de que o Tribunal havia sofrido “dois grandes ataques cibernéticos” nos dias 24 de agosto e 4 de setembro.
De acordo com o documento, o coordenador de Segurança Cibernética teria alertado que dar conhecimento público sobre a estrutura dos dados de processos judiciais poderia “facilitar gravemente os ataques hacker, num momento delicado em que os Tribunais Superiores, especialmente o Supremo Tribunal Federal (STF), têm sofrido diversas investidas”.
“Diante do exposto, deixo de autorizar o acesso requerido, por impossibilidade técnica”, disse Barroso no despacho.
Sem definir data, o ministro ainda informou que será aberto um edital para a “realização de um novo exame cujo resultado será público”, uma vez que a última auditoria do sistema de distribuição de processos foi em 2018.
Na primeira decisão, em março deste ano, Barroso destacou o "interesse público" e o "dever da transparência" ao permitir o acesso dos técnicos do UOL ao código-fonte.