O mapa da letalidade da Polícia Militar de São Paulo mostra que nove dos dez batalhões territoriais que lideram a lista dos que mais mataram suspeitos de crimes no estado ficam na Grande São Paulo. Desses, três estão na capital, incluindo o primeiro e o segundo do ranking. Três pertencem a cidades do ABC paulista. A única exceção do interior na lista dos “batalhões da bala” é o 35º Batalhão (35º BPM/I), com sede em Campinas e quarto colocado no ranking.
Para conhecer a lista dos batalhões mais letais, o jornal O Estado de S. Paulo usou dados obtidos com a Ouvidoria da Polícia do Estado - foram consultados os registros de 745 casos com 923 mortes ocorridos de 1º de janeiro de 2014 a 28 de fevereiro de 2015. Nesse total, estão incluídos casos envolvendo a Polícia Civil e os batalhões especiais da PM, como as Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota). A última, aliás, é o batalhão que lidera o ranking geral como a unidade mais letal das polícias paulista, o que não surpreendeu o ouvidor da Polícia, Julio Cesar Neves.
A análise dos números permitiu ainda estabelecer pela primeira vez o mapa da letalidade dos batalhões responsáveis pelo patrulhamento de bairros e de cidades. Essa lista que é liderada pelo o 16º Batalhão (16º BPM/M), cuja sede fica na Avenida Corifeu de Azevedo Marques, no Rio Pequeno, zona oeste de São Paulo. Os PMs desse batalhão mataram no período 26 pessoas em 20 ações.
O segundo batalhão do ranking é o 39º BPM/M, responsável pelo patrulhamento de parte da região de Itaquera, na zona leste. Ao todo, 21 pessoas morreram em supostos tiroteios com os homens dessa unidade. O terceiro colocado na lista é o Batalhão de Carapicuíba (19 mortes em 14 casos).
Dados da Secretaria da Segurança Pública mostram que o uso da força letal pela PM cresceu 77% em 2014, em comparação com 2013. A tendência de aumento permanece neste ano - só nos primeiros 70 dias de 2015 os homens da Rota, por exemplo, mataram 21 acusados de crimes, número superior a todo o ano de 2013, quando 19 pessoas morreram em casos de confrontos com a unidade.
Para o ouvidor, o aumento da letalidade policial nos últimos anos também estaria relacionado à impunidade. “Quando o policial vê que ninguém é punido, fica mais fácil apertar o gatilho. A impunidade não é só para a bandidagem, é dos dois lados”, disse. “Na maioria dos casos, o arquivamento é requerido pelo Ministério Público e a Justiça aceita. Não chegam sequer a serem denunciados.”
O jornal O Estado de S. Paulo procurou o comandante-geral da PM, coronel Ricardo Gabaroni, e o secretário da Segurança Pública, Alexandre de Moraes, mas eles não se manifestaram até a noite de quinta-feira. Na terça-feira, a Secretário Estadual da Segurança Pública de São Paulo anunciou que vai alterar o procedimento de investigação para casos que envolvam agentes de segurança pública.
Na prática, a medida tornará obrigatória a presença da Polícia Civil, da Polícia Militar e das Corregedorias nas cenas de homicídios que envolvam agentes, sejam eles autores ou vítimas. Nesses casos, o Ministério Público também deve ser comunicado imediatamente, mas vai ficar a critério do órgão decidir se é necessário enviar um promotor de Justiça ao local.
A resolução deve valer para ocorrências que estejam relacionadas a policiais militares, policiais civis, policiais federais, agentes penitenciários, membros da Fundação Casa e guardas-civis.
Na quarta-feira, o ouvidor enviou um ofício à secretaria sugerindo que também fosse convocado um defensor público ao local de mortes em decorrência da atividade policial.
Segundo Neves, essa medida seria mais eficiente para impedir que a cena do crime seja mudada antes da perícia.
PMs da região do Butantã e de Itaquera causaram mais mortes
De todos os batalhões territoriais da PM, o 16º BPM/M é o mais letal. Dados da Ouvidoria apontam que, desde janeiro de 2014, foram 26 mortes de suspeitos em supostos confrontos com oficiais do grupamento, que faz rondas ostensivas nas zonas oeste (regiões do Butantã, Jaguaré e Rio Pequeno) e sul (Morumbi). Nove delas aconteceram só nos dois primeiros meses deste ano.
Nas imediações da sede do batalhão, no Rio Pequeno, é perceptível o medo de falar sobre o trabalho da polícia na região. Quem se pronuncia, fala bem. Os que preferem se calar são maioria. Em comum entre os dois grupos a resposta para a pergunta “você se sente seguro aqui?” feita pela reportagem a todos os entrevistados: “100% seguro a gente nunca está”.
Os moradores afirmam que o número de viaturas nas ruas aumentou neste ano. Consequentemente, tem sido cada vez mais comum avistar policiais trabalhando. “Eles estão em cima o tempo todo. Antes não era tão agitado”, afirma um mecânico, morador do Rio Pequeno há 46 anos. Sobre a letalidade policial, o tom é de resignação. “Se eles não matarem, morrem.”
Comando
O 16º BPM/M é interinamente comandado pelo major Ezequiel Morato. Ele assumiu o posto em fevereiro, quando o ex-comandante foi promovido. A promoção coincidiu exatamente com o período em que o batalhão passou a matar mais. Foram sete casos em janeiro e mais dois no mês seguinte. No ano passado, a média era de 1,5 morte por mês. O major foi procurado por telefone e no batalhão, mas não se pronunciou. A PM também não comentou.
A maior parte das mortes relacionadas a policiais aconteceu nas zonas em que o batalhão atua, mas também há casos em cidades da Grande São Paulo, como Osasco, Embu-Guaçu e Cotia. Na última, cinco oficiais perseguiram um Chevrolet Corsa após informações que o veículo havia sido roubado. Os policiais conseguiram encurralar o carro. Segundo os policiais, os suspeitos atiraram primeiro. Os quatro ocupantes do carro morreram.
Itaquera
Quando a reportagem chegou à sede do 39º Batalhão de Policiamento Militar Metropolitano, em Itaquera, na zona leste, o segundo que mais matou em São Paulo, um soldado da PM indagou qual era o intuito da reportagem. Ao ser informado sobre as 20 mortes registradas no ano passado e a letalidade da PM do batalhão, o policial franziu a testa. “Se o assunto é esse você veio trazer problema. Se tem um assunto que me incomoda é esse”, disse. Apesar de o tenente-coronel Marcelo Jorge Franciscon, comandante do 39º BPM/M, estar na frente do batalhão, ele não quis falar sobre os motivos para que seus subordinados tenham matado 21 pessoas.
A região de Itaquera tem cerca de 524 mil habitantes, segundo dados da Secretaria de Coordenação das Subprefeituras. A opinião dos moradores que precisam dos policiais do batalhão é dividida. “Para mim eles mataram pouco. Bandido bom é bandido morto. Tinha de ter pena de morte neste País”, afirmou o comerciante Antonio de Souza, de 54 anos.
Já nos prédios da Companhia Metropolitana de Habitação (Cohab), os moradores têm medo. Um ex-presidiário de 40 anos que já cumpriu pena por furto receia a presença da PM na frente do seu prédio. “Hoje o PM que me prendeu passou aqui em frente, ficou me olhando. Quando eu saí da cadeia, ele veio me intimidar, perguntar se eu continuava roubando. Medo de que ele me mate eu não tenho, mas acho que é uma forma de intimidar, mostrar que quem manda é ele.”
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