Repercussão
Para sindicatos, ação foi legal
Para sindicatos que representam policiais civis, a operação que terminou com a identificação da mansão no Parolin foi normal e legal. Apesar disso, tanto o Sindicato dos Investigadores de Polícia do Paraná (Sipol) quanto o Sindicato das Classes Policiais Civis do Paraná (Sinclapol), afirmaram que não tinham conhecimento prévio da ação. "Havia uma ilegalidade e os policiais a combateram. Eles cumpriram seu dever", disse o presidente do Sipol, Roberto Ramires.
Apesar da legalidade, o presidente do Sinclapol, André Gutierrez, lembrou que a operação ocorreu de forma desarticulada. "Não seguiram um procedimento padrão. Houve apenas uma falta de prudência", afirma.
Os dois sindicatos negaram o viés político da operação. Para o Sipol, não há nenhum movimento de bastidores da categoria. Já o Sinclapol defende que seja mantido o diálogo amistoso com o governo estadual a fim de se obter melhorias para a corporação. "Há motivos para protestar se o governo já declarou que vai implantar o subsídio? Se não houvesse diálogo, tudo bem. Não é o momento de protestar contra nada", explica.
Choque moral
"Vamos atacar santuários invioláveis do PR", diz agente
Um investigador da Polícia Civil que participou da operação disse, em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, que a abordagem à mansão faz parte de uma "operação-padrão", como forma de pressionar a Secretaria de Segurança Pública por reformas no estatuto da corporação e de protestar contra a "crise de moralidade" que a instituição estaria enfrentando.
"Vamos derrubar esses santuários invioláveis, em que hoje policiais e fiscais não podem mexer, porque há acordos entre deputados, senadores e empresários com a cúpula [da segurança pública]", disse. Esses "santuários" acobertariam crimes cujas investigações seriam "barradas" por superiores hierárquicos.
A primeira ação ocorreu na tarde de terça-feira, quando policiais fizeram uma operação em shoppings populares do Centro de Curitiba, apreendendo uma grande quantidade de material pirateado. Após essa ação, três policiais civis teriam sido transferidos, em uma suposta retaliação. Os "dissidentes" contra-atacaram e decidiram apressar outras ações planejadas. "Nós cobrimos o rosto por causa das represálias. Apesar dos turbantes, nós nos identificamos às pessoas [que estavam na mansão], mostramos nossa carteira funcional e tratamos todos como cidadãos", disse o policial.
Para ele, a "operação-padrão" tem o objetivo de resgatar a moralidade da Polícia Civil. Ele menciona a falta de condições de trabalho, o baixo índice de credibilidade da instituição e a falta de transparência na definição das políticas de segurança. "Não temos uma polícia de Estado. Temos uma polícia de governo, que, como tal, faz a vontade do soberano", avaliou.
Uma operação policial, feita entre a noite de quinta-feira e a madrugada de ontem, tornou público um racha interno na Polícia Civil. Um grupo de policiais identificou e abordou uma mansão no bairro Parolin, em Curitiba, onde funcionava um cassino clandestino. Há suspeita de que o local também servisse como casa de prostituição. Os agentes agiram "por conta própria", sem comunicar a ação aos superiores.
O resultado da operação foi uma crise institucional: o delegado-chefe da Polícia Civil, Marcus Vinicíus Michelotto, classificou os agentes envolvidos na ação de "milicianos"; já os policiais cravaram que a corporação passa por uma "crise de moralidade".
Com três andares, a casa de alto padrão foi abordada por volta das 23 horas, por dezenas de policiais civis, lotados em unidades policiais distintas. Todos estavam com o rosto coberto por máscaras, capuzes ou turbantes e desencadearam a operação sem comunicá-la a um delegado. De acordo com um policial, estavam na mansão cerca de 40 pessoas, que jogavam em caça-níqueis ou bebiam em um bar. Três supostos funcionários do cassino foram encaminhados à delegacia, mas acabaram liberados. Quarenta caça-níqueis, dois gabinetes de computador e uma máquina de cartão de crédito foram apreendidos.
Nos andares superiores da mansão, havia diversos quartos, que, segundo as denúncias, eram usados para prostituição. Os cômodos eram decorados luxuosamente e tinham banheiros com peças de mármore e banheiras de hidromassagem.
De acordo com os agentes, um álbum com fotos de políticos do alto escalão e de empresários paranaenses foi encontrado em uma gaveta. Ninguém soube informar a quem pertence a mansão, mas, segundo vizinhos, o local funciona há bastante tempo.
Por volta da meia-noite, os policiais consideraram a ação finalizada e começaram a pedir a presença de um delegado para encaminhar o material apreendido e conduzir os responsáveis a um distrito policial. Mas, segundo os agentes, o delegado do Centro Integrado de Atendimento ao Cidadão (Ciac), que faz o plantão policial, teria se negado a assumir o flagrante. Eles também teriam feito contato com o Centro de Operações Policiais Especiais (Cope), que também teria se recusado a prestar apoio.
Gaeco
O impasse atravessou a madrugada e chegou ao Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas e de Investigações Criminais (Gaeco), do Ministério Público. O promotor Leonir Battisti, coordenador do grupo, foi acordado por volta das 6h40 por policiais que pediam orientação. "Quanto à apreensão, os policiais estavam acobertados pela legalidade, logo não precisavam da presença de um delegado. Agora, quanto à deflagração da operação, é uma questão interna da Polícia Civil", disse Battisti.
Pouco a pouco, os policiais foram deixando o imóvel. Apenas oito permaneceram até as 9 horas, quando um delegado do 2.º Distrito Policial chegou à mansão para providenciar a apreensão dos caça-níqueis. Segundo o comando da Polícia Civil, oito policiais que participaram da operação foram identificados.
A Corregedoria da corporação vai apurar eventuais transgressões dos agentes envolvidos na abordagem à mansão. Imagens gravadas por veículos de comunicação serão solicitadas para auxiliar nas apurações. As investigações sobre o funcionamento do cassino clandestino também devem continuar.
"Agiram como milicianos", diz delegado
O chefe da Polícia Civil do Paraná, o delegado-geral Marcus Vinícius Michelotto, criticou a maneira como a operação foi deflagrada: sem que um delegado ou o comando da instituição tivessem sido avisados e com os agentes atuando com rosto encoberto. "Os policiais que participaram [da ação] se comportaram como milicianos, escondendo o rosto e não respeitaram os padrões de hierarquia e disciplina da corporação", criticou.
Para Michelotto, a operação teve cunho político. "Foi uma balbúrdia para desgastar o departamento [chefia da Polícia Civil] e as negociações que o governo tem mantido com os policiais", afirmou. Apesar disso, o delegado-geral minimizou a "manifestação". Segundo ele, de um efetivo de mais de 4 mil policiais, um número considerado pequeno estaria vinculado a essa dissidência. "Identificamos cerca que 20 agentes. São atrelados a sindicatos ou a partidos com interesse de desestabilizar", disse.
O delegado-geral garante que a Polícia Civil não tinha informação anterior sobre a mansão. "Nós combatemos por igual todos os tipos de crimes, de contravenções. Desde o início do ano passado, mais de mil caça-níqueis foram apreendidos. Não acobertamos essa prática nem nenhuma outra", assegurou. Mas, de acordo com informações do 2.º DP, há cerca de dois meses foi feita uma abordagem no local. Na ocasião, nada foi encontrado, apesar de denúncias sobre o funcionamento de um bordel.
PM também vive turbulência
Além da Polícia Civil, a Polícia Militar também enfrenta momentos de turbulência. Desde o início da semana passada, praças (soldados, cabos e sargentos) protestam internamente pela regulamentação da Emenda 29 à Constituição do Paraná. O dispositivo prevê a incorporação de gratificações ao soldo policial. A frequência do sistema de comunicação da PM foi invadida por diversas vezes e passou a ser usada para fazer apologia a uma paralisação. O Comando da PM negou a possibilidade de greve, o que agravou os ânimos dos policiais, que fizeram um protesto na Boca Maldita.
Em novembro passado, o ex-comandante da PM, Marcos Scheremetta assumiu ter relacionamento com operadores do jogo do bicho e caça-níqueis. Também no fim do ano, o delegado-geral da Polícia Civil, Marcus Vinicíus Michelotto, assumiu ter retaliado delegados com transferências por eles terem integrado chapas a eleição de sindicatos não apoiadas pelo governo.
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