Os primeiros minutos da madrugada deste domingo foram chocantes: uma ligação da diretora de Redação da Gazeta do Povo, jornalista Sandra Gonçalves, transmitia-me a notícia da morte súbita de Belmiro Valverde Jobim Castor ocorrida pouco antes.
Tomado por emoção que poucas vezes senti, confesso minha incapacidade de cumprir a contento a missão de escrever algumas linhas sobre ele, um ser humano raro que me deu o privilégio de considerar-me entre seus amigos e de dar-me a oportunidade de com ele trabalhar e, sobretudo, de aprender.
Sinto-me tentado a aproveitar-me do título de um dos seus livros, O Brasil não É para Amadores indispensável hoje nas bibliotecas mais referenciais do mundo para dizer que Belmiro também não era para amadores.
Sua inteligência desconcertante, seu humor refinado, a abrangência sideral de seus conhecimentos, sua firmeza de caráter, sua incrível capacidade para compreender o mundo e a alma humana, o estadista que unia à competência incomum um inabalável senso ético, o homem que alimentava sua fé católica com obras de desprendimento em favor dos mais pobres, o doutor em planejamento público que definiu rumos para o Paraná moderno... de fato, todas estas qualidades e outras tantas não citadas tornavam Belmiro incompreensível para amadores, incapazes que somos de entender como seria possível vê-las reunidas numa só pessoa.
Conheci Belmiro no comecinho dos anos 70 numa sala do 4.º andar do Palácio Iguaçu. Ele, com seus 30 e poucos anos, dedicava-se então à missão que lhe dera o governador da época, o professor Parigot de Souza, de formular a reforma administrativa do estado uma estrutura enxuta e funcional implantada poucos anos depois, sob sua coordenação, já então nomeado pela primeira vez secretário do Planejamento pelo governador Jayme Canet Jr.
E foi ocupando este cargo que Belmiro se pôs também a dar forma e a garimpar recursos para o grande plano de obras estruturantes que fez do governo Canet (1975-79) um dos mais eficientes da história do Paraná. Interrompida esta etapa como administrador público para se dedicar ao doutorado que obteve nos Estados Unidos, Belmiro foi recrutado outras duas vezes para o secretariado no governo de Alvaro Dias na Educação, e no de José Richa, outra vez no Planejamento. Em ambas as ocasiões, Belmiro acabou vencido pelos que não suportavam a resistência ética com que respondia à sanha da corrupção e da política de varejo.
A partir de então dedicou-se a fazer o que mais gostava transmitir aos mais jovens, como professor nas universidades Federal e Católica, um pouco da vastidão do conhecimento e da experiência que acumulou e que transformou no ouro da sabedoria que esbanjava também compartilhada com os leitores da coluna dominical que publicava na Gazeta do Povo desde 2002.
Nos últimos anos, Belmiro deu seu coração para construir, juntamente com sua inseparável Elizabeth, o Centro Educacional Papa João Paulo II uma obra social que garante ensino e assistência de primeiro mundo a crianças de Laranjeiras, na zona rural de Piraquara. Nos últimos dias, preparava com alegria uma peregrinação a Roma para assistir à canonização do patrono da instituição que criou, o papa a ser declarado santo em 27 de abril.
Último dos grandes pensadores paranaenses, Belmiro deixa um vazio impossível de ser preenchido neste deserto de inteligência, de ética, de criatividade e de compromisso com o interesse público em que hoje vivemos. Sua luz fará muita falta a todos nós, que não passamos de amadores.